Ética biomédica Flashcards
(35 cards)
Ética biomédica: 4 grandes áreas
Experimentação no Ser Humano (génese da bioética! NS)
Problemas de início da vida (Diagnóstico Pré-Natal, Aborto)
Problemas de fim de vida (Eutanásia)
Sequenciação e Manipulação do Genoma Humano (e sigilo da informação genética…)
Modelo Principalista
Beuchamp & Childress, 1979
4 Princípios devem reger (simples, direta aplicação):
Princípio da Beneficência
Obrigatoriedade do profissional de saúde promover, primeiramente e sempre, o bem do paciente.
Princípio da Não Maleficência
Obrigatoriedade do profissional de saúde de não promover qualquer mal sobre o paciente.
Princípio da Justiça
Todas as pessoas devem ser tratadas de igual modo, respeitando-se a dignidade de ser pessoa (Kant)
Princípio da Autonomia
(Deriva do Princípio do Respeito pelas Pessoas, deve prevalecer!) Deve ser reconhecida a capacidade comum a todas as pessoas de tomar as suas próprias decisões, e promovidas as condições efectivas para esse exercício.
–> consentimento informado!
[há 3 tipos de limitações a este princípio: exigência por parte do doente de actuação não médica, pedido de tratamento inútil, pedido de tratamento contra a finalidade da medicina (aborto…)]
consentimento informado
(forma de operacionalizar o Princípio da Autonomia)
um doente não deve ser tratado sem o seu consentimento informado ou do(s) seu(s) representantes legais excepto em condições excepcionais bem definidas (mas agora também testamento vital, diretivas antecipadas de ação)
Condições para exercício:
- doente: competente (capaz de compreender as alternativas e as suas consequências, e decidir em conformidade)
-doente: livre de coacção e influências indevidas (problema: hierarquias militares rígidas, estabelecimentos prisionais, internamentos prolongados)
- profissional de saúde: fornecer a informação necessária, de forma compreensível, para a decisão inteligente do doente + assegurar-se que o doente compreendeu a informação fornecida
=> garantir compreensão: diálogo reflexivo com o doente! A comunicação desempenha um papel crucial na ética biomédica.
Modelo libertário
(Engelhardt, 1986)
racionalidade dos argumentos impõe a procurada objectividade, permitindo construir um plano moral consensual alargado e partilhado pelos membros da sociedade! (em sociedades multiculturais não há verdade moral única -> bioética: “diplomacia moral”, usando a razão)
Modelo da Virtude
(Pellegrino & Thomasma, 1988)
modelo fundado na redescoberta da ética da virtude em alternativa à ética do dever
Modelo Casuísta
(Jonsen & Toulmin, 1988)
Preconiza uma análise caso a caso; nega a existência de princípios universais; considera as questões particulares de cada situação.
Modelo do cuidado
(Gillian, 1982)
+ de natureza psicológica que filosófica, assenta na psicologia evolutiva;
reclama-se como actuando a partir de uma perspectiva feminina, enfatizando o cuidado (“care”) em vez da justiça (mais associado à masculinidade);
fundamenta a ética biomédica numa atitude de relação empática com o outro; mais difundido entre os profissionais de enfermagem, ainda maioritariamente mulheres.
Modelo do Direito Natural
(Finnis, 1980)
Assenta em 7 princípios fundamentais, indemonstráveis mas reconhecidos:
1) Vida (biológica, saudável)
2) Conhecimento;
3) Vida lúdica;
4) Vida estética (arte, música)
5) Sociabilidade / amizade;
6) Racionalidade prática;
7) Religião (aspeto identitário, mesmo de que não é religioso)
Modelo Contratualista
(Veatch, 1981)
estabelecimento de parcerias médico / doente (em sentido estrito e amplo) e médico-sociedade; privilegia valores como a confiança e a obrigação, a beneficiência, a verdade e o cumprimento de promessas.
Experimentação no ser humano
Experimentar: submeter a uma experiência para testar uma hipótese - ensaio terapêutico.
Estudos laboratoriais + experimentação em animais (e tecidos, in vitro) = ensaios pré- clínicos.
Ensaios nos seres humanos = ensaios clínicos.
Fase I– Em voluntários sãos; propriedades farmaco-dinâmicas (quanto tempo fica no corpo…)
Fase II - Pequeno grupo de doentes; eficácia terapêutica.
Fase III- Grande grupo de doentes; comparação sistemática com tratamentos alternativos => farmácias!
Fase IV- Todos os doentes; estudos epidemológicos de farmaco- vigilância (para sempre)
Experimentação no ser humano- historial
“Tentativas” empíricas – nascem com a medicina.
“Tentativas” experimentais impõem-se com os métodos científicos.
Séc. XVII –
utilização de remédios “milagrosos” sem comprovação de eficácia;
Séc. XVIII – James Lind (1747) testa 6 remédios propostos contra o escorbuto num grupo de marinheiros, a bordo. Conclui pela eficácia da laranja. Realizou o 1o ensaio controlado!
Séc. XIX -
Emmanuel-Étienne Duvillard (1802) observou milhares de casos –> inoculação com varíola de vacas (vacinação) protege da varíola natural.=> 1ª prova estatística da eficácia de um tratamento não controlado!
Pierre Charles Alexandre Louis (1835): num ensaio controlado, ineficácia da sangria no tratamento da pneumonia.
Aprendizagem da experimentação: plano metodológico (dificuldades estatísticas – recurso a amostras numerosas; codificação de sintomas; padronização de tratamentos; produção de placebos; determinação e fixação do erro admissível) e plano ético.
Sec. XX – Bradford Hill (1948): 1º ensaio clinico metodologicamente correcto! (acção da estreptomicina na tuberculose); esta prática, contudo, continua restrita.
O caso da talidomida (1960) marcou a viragem definitiva=> maior parte dos países: obrigatório o ensaio clínico em seres humanos antes da comercialização de novos fármacos!
Diretrizes internacionais
1947 – Código de Nuremberga (incluído, pelo Tribunal de Nuremberga, no veredicto do Julgamento dos Médicos); constituído por dez pontos (6 sugeridos ao Conselho de Crimes de Guerra pelos médicos Leo Alexander e Andrew Conway, 4 pelo Tribunal) –> condições de legitimação da experimentação médica com seres humanos.
1964 – Declaração de Helsinquia I: adoptada pela 18ª Assembleia Médica Mundial (Finlândia) => integração das ideias contidas no Código de Nuremberga na relação médico- doente.
1975 – Declaração de Helsinquia II: a Assembleia Médica Mundial (Tóquio) => alterações na Declaração anterior (passa a contemplar, entre outros, o impacte nos animais experimentais).
1982 – Directrizes Internacionais para a Investigação Biomédica Envolvendo Seres Humanos: preparadas pelo Conselho para Organizações Internacionais de Ciências Médicas (CIOMS), em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
1993 – Revisão das Directrizes Internacionais para a Investigação Biomédica Envolvendo Seres Humano–> nova versão: necessidade de revisão e aprovação do protocolo de experimental por uma “comissão de revisão ética”.
Os 10 princípios do Código de Nuremberga
- consentimento voluntário (sem força, fraude, coação, astúcia…; com conhecimento e compreensão suficientes do assunto em questão para tomar sua decisão => requer que sejam explicadas: natureza, duração e objectivo da experimentação, métodos que serão utilizados; os inconvenientes e riscos esperados; os eventuais efeitos que o experimentação possa ter sobre a saúde do participante => O dever e a responsabilidade de garantir a qualidade do consentimento recaem sobre o investigador que inicia, dirige ou gere a experimentação! Não podem ser delegados a outrem impunemente
- deve produzir resultados vantajosos para a sociedade, que não possam ser alcançados por outros métodos de estudo (não deve ser feita casuística ou desnecessariamente)
- deve ser baseada em resultados prévios de experimentação animal, no conhecimento da evolução da doença ou outros problemas em estudo, os resultados conhecidos previamente devem justificar a realização das experiências planeadas
- conduzida de maneira a evitar todo o sofrimento e
danos desnecessários, físicos ou mentais - nunca se possível morte ou invalidez permanente; excepto, talvez, no caso de o próprio investigador se submeter às experiências
- grau de risco aceitável deve ser determinado pela importância humanitária do problema
- tomados cuidados especiais para proteger o participante na experiência de qualquer possibilidade, mesmo remota, de dano, invalidez ou morte.
- conduzida apenas por pessoas cientificamente qualificadas. exigido o maior grau possível de cuidado e competência, em todas as fases, daqueles que conduzem e gerem as experiências.
- participante deve ter plena liberdade de se retirar, caso
sinta que há possibilidade de ocorrer algum dano com a sua continuidade. - o investigador deve estar preparado para suspender os procedimentos em qualquer fase, se tiver razoáveis motivos para acreditar que a sua continuação causará provável dano, invalidez ou morte para o participante.
Experimentação no Ser Humano- Problemas Éticos
1: Consentimento
- Livre?
Dependência em relação aos médicos
- voluntários doentes
Vulnerabilidade dos sujeitos
- militares, reclusos, pobres (não podem ser remunerados, mas é-lhes oferecida compensação –> refeições, transporte…atrativa), etc. Tutela
- menores, deficientes, etc.
-Esclarecido?
- Avaliação dos riscos- grave?
- risco mínimo
- risco mais que mínimo - Controlo do sistema
Consulta dos pares
(até 2ª guerra: só intercontrolo da comunidade médica, hoje Comissões de ética!)
avaliação dos protocolos experimentais
Diagnóstico Pré-Natal
Conjunto de técnicas que permite estabelecer um diagnóstico preciso de doença genética grave ou fatal num feto.
–> principais : ecografia, amniocentese (recolha líquido amniótico), biopsia do cório (células da placenta) e colheita de sangue fetal (cada vez mais invasivo)
- muitos relacionam diagnóstico pré-natal com aborto seletivo
- ou: visto como uma forma de preparar os pais atempadamente para o nascimento de um filho deficiente (antecipação de problemas, aumento da qualidade de vida)
anos 30 (surgimento): funções exclusivamente terapêuticas- preparar as transfusões sanguíneas para nascituros com incompatibilidade de Rhésus (mãe Rh-, bebé Rh+ –> se sangue fetal entrar em contacto com sangue mãe… produzidos anticorpos que podem voltar para a placenta e prejudicar desenvolvimento!)
anos 70: amniocentese veio permitir diagnosticar um conjunto alargado de doenças, malformações incuráveis!
anos 80: desenvolvimento de algumas terapias fetais
Diagnóstico Pré-Natal: Problemas Éticos
instrumento ao serviço da qualidade de vida das famílias, ou via aberta para o eugenismo?
ex:
1. Trissomia 21: não é possível detectar o grau de deficiência. Aborta ou não?
- Spina bifida (problema do tubo neuronal–> paralisia, hidrocefalia, dificuldades aprendizagem… 3 graus: myelomeningocele (pior), meningocele, occulta… grávidas devem tomar ácido fólico! Prevenção): predomina em certas populações (Irlanda, Wales, Escócia, longe do leste Europa) onde os programas de saúde propõem a sua eliminação! Eugenia? Sim, mas eticamente reprovável?
- Sexo do bebé: diagnóstico não-terapêutico
Discriminação sexual? (contextos sociais.. China altura política do filho único…)
+ porta aberta para selecção estética? - Diagnóstico de sensibilidade: capacidade de prever a PROBABILIDADE de ocorrência de doenças em fases ulteriores da vida (cancro, psicoses, etc.) –> Abortar? informar? prevenir?
- Beta-talassemia: custos financeiros / sociais do tratamento (anemia… cadeias hemoglobina… 4 genes: 1 normal, 2 transfusões, mas aceitável, 3 deformações faciais, 4 mortal….; razoável qualidade de vida, mas custos muito elevados para sistema de saúde)
Diagnóstico Pré-Natal- Questões chave
- Estatuto do feto e relação com o da mãe;
- Estatuto e qualidade de vida do deficiente;
- Ónus para a família e para a sociedade;
- Sentido da medicina;
- Estabelecimento de níveis de risco;
- Poder decisório
Aborto
Expulsão do feto antes de este estar suficientemente desenvolvido para sobreviver fora do útero.
- espontâneo
- provocado:
- -> terapêutico (para preservar a saúde da mãe)
- -> eugénico (para eliminar um feto deficiente),
- ->não observar nenhuma das condições precedentes.
Aborto- historial
Fenómeno universal, que percorre diversas sociedades.
Na Grécia clássica: era aprovado com fins eugénicos e sobretudo demográficos. O feto só se tornava um ser vivo quando habitado pela alma (animação). Antes, podia ser abortado.
Platão: só os indivíduos saudáveis têm o direito de se reproduzir – homens entre os 30 e 45 anos, mulheres entre os 20 e os 30. Qualquer outra gravidez deveria ser interrompida.
O Juramento de Hipócrates proíbe o uso de abortivos. Hipócrates, contudo, descreve técnicas de aborto.
Preformationism (desenvolver características reformadas–> public embryos) vs. Epigenesis (novo emerge do “sem forma”, biological embryo)
Aristotle was a “spermist” (male semen must be the source of the developmental plan, fertilised egg is like a bed manufactured by the carpenter)
Naive preformationism: embryo is endowed with some form and therefore is not amorphous and homogeneous.–> Nicholaas Hartsoeker’s “homunculus” (1694).
Ovist encapsulation (Albrecht von Haller?)- ovary contains all generations
Na Europa ocidental, o aborto só foi praticado em larga escala com a implantação do proletariado.
As condições técnicas e higiénicas de execução do aborto determinam drásticas variações na variação da mortalidade das mulheres. Em meio hospitalar, o risco de abortar é consideravelmente inferior ao risco do parto.
Actualmente > 50 milhões de abortos anualmente ( frequência de 300 interrupções por mil gravidezes). Morrem nas intervenções 200 mil mulheres.
Aborto- Religião
Antigo Testamento, não é referido. No Talmude, mais recente, é autorizado para salvar a vida da mãe.
O Novo Testamento não refere o aborto, mas vários textos cristãos anteriores condenam-no fortemente. Até ao século XII vários concílios proíbem-no inequivocamente. Santo Agostinho (prevalece até séc XIX): distinção feto inanimado e informe vs feto formado e animado--> nunca podia ser abortado, mas o primeiro poderia para salvar a vida da mulher! A partir de 1869 (Pio IX) a doutrina deixa de distinguir entre feto animado e inanimado, e proíbe o aborto nos termos do homicídio, mesmo quando a vida da mãe está em risco! --> reafirmado por Paulo VI (1968) que considerou admissível o aborto em apenas duas situações: cancro do útero e gravidez extra- uterina.
Pelo contrário, a atitude das igrejas protestantes alterou-se marcadamente durante o séc. XX. Muitas passaram a atribuir aos estados precoces do desenvolvimento do feto um estatuto meramente biológico, e tomaram como principio o primado da pessoa desenvolvida sobre o ser em devir.
A mulher muçulmana está autorizada a abortar por razões de saúde, ou eugénicas, antes de os movimentos fetais se fazerem sentir.
Aborto- Legislação em Portugal
legalizado por referendo em 2007
-permitido até às 10 semanas de gravidez a pedido da mulher (apenas!), independentemente das razões
obrigatório um período mínimo de reflexão de três dias, com disponibilidade de acompanhamento psicológico + acompanhamento por técnico de serviço social
tem de ser informada “das condições de efectuação, no caso concreto, da eventual interrupção voluntária da gravidez + consequências para a saúde da mulher”, “condições de apoio que o Estado pode dar à prossecução da gravidez e à maternidade” + obrigatório providenciar encaminhamento para uma consulta de planeamento familiar.
- permitido até às 16 semanas em caso de violação ou crime sexual (não sendo necessário que haja queixa policial), até às 24 semanas em caso de malformação do feto e em qualquer momento em caso de risco para a grávida (“perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida”) ou no caso de fetos inviáveis.
- O aborto provocado por terceiros sem consentimento da grávida é punível com 2 anos de prisão, e com 3 no caso de consentimento da grávida. Estas penas são aumentadas em caso de “morte ou ofensa à integridade física grave da mulher grávida”, ou no caso de tal prática ser habitual. A própria mulher grávida que faça uma interrupção voluntária da gravidez ilegal pode ser punida com 3 anos de prisão.
- Os médicos podem alegar objecção de consciência, delegando esta tarefa para outros colegas de trabalho.
Aborto- Visões & Problemas Éticos Gerais
Visão absoluta - a vida do feto tem valor absoluto – conduz à interdição total do aborto e termina assim o debate.
“O embrião é uma vida humana que se inicia na concepção; a vida humana merece respeito absoluto; logo a vida do embrião é inviolável”
Visão relativa - a vida do feto tem um valor relativo – exige que se encontrem forma de o comparar com outros valores em causa (a vida da mãe, a estabilidade da sociedade), prolongando o debate em torno dos casos em que o aborto é legítimo.
- Correlação entre o estádio de desenvolvimento do embrião e o estatuto de protecção: Quando começa a aquisição de direitos? Na concepção? Na implantação? (se não ocorrer nidação, não se considera a existência de aborto espontâneo ou provocado)
- Direitos da mulher: é a mulher que se confronta com as dificuldades da gravidez e do parto.
Aborto- Problemas Éticos concretos
Os aspectos demográficos.
O aborto selectivo em gravidezes múltiplas (redução embrionária).
O aborto em função do sexo do feto.
A opção face a probabilidades de deficiência.
Utilização de tecidos embrionários e fetais.
Organism- developmental stages
developmental potency —> prezygotic stage (Aristotle)
genomic potency —> zygote stage
it’s with gastrulation (~day 16) that the foster [danish term “for the developing system] ceases to be a cluster of homogenous cells –> transformed into a single heterogeneous entity! (No longer possibility of twinning…)
possessing all basic human phenotypic characteristics (including face and genitals) —> roughly 10 weeks (Portuguese legislation)
viability —> 24 weeks (e.g., United Kingdom legislation)
sentience —> around day 140
being an organism separated by mother —> birth
being self-aware —> after birth