Hepatites virais Flashcards
(73 cards)
Qual é a unidade funcional do fígado e como esta é organizada:
Lóbulos hepáticos
- Polígonos microscópicos constituídos por hepatócitos que se organizam em placas formadas pela superposição de camadas de células. Essas placas vão se entrelaçando da periferia para o centro do lóbulo. Os espaços laterais entre essas placas são preenchidos pelos sinusoides hepáticos (capilares bastante fenestrados).
- Em cada cando da periferia do polígono, temos um espaço-porta, constituído por um ramo da veia porta, um ramo da artéria hepática, um ducto biliar e vasos linfáticos
- No centro de cada lóbulo encontra-se a veia centrolobular, que recebe o sangue oriundo dos sinusoides hepáticos
Como é a circulação hepática?
O fígado possui duas aferências: a. hepática (trás sangue arterial e é responsável por 30% do fluxo sanguíneo hepático) e v. porta (trás sangue venoso oriundo do mesentério, rico em substâncias intestinais recém-absorvidas; responsável por 70% do fluxo sanguíneo hepático).
O parênquima hepático é nutrido por sangue arterial e venoso, que se misturam nos sinusoides hepáticos
-As vênulas centrolobulares são os ramos iniciais da veia hepática
Como se organiza o sistema biliar?
- O espaço tubular formado pela união longitudinal de vários hepatócitos é o canalículo biliar. Eles formam extensas redes que se dirigem do centro do lóbulo para a periferia (fluxo retrógrado)
- Os hepatócitos secretam a bile nos canalículos biliares que, por sua vez, desembocam nos ductos biliares (nos espaços-porta). Os ductos biliares vão se unindo até formarem os ductos hepáticos (esquerdo e direito)»_space; ducto hepático comum»_space; se une com o ducto cístico e forma o colédoco
Metabolismo da bilirrubina:
- Formação e transporte: a hemoglobina é captada por macrófagos esplênicos e de outros órgãos (sistema reticuloendotelial) e é convertida em heme + globina. O heme é degradado em ferro (que é transportado ligado à transferrina ou armazenado na forma de ferritina) e protoporfirina. Esta, por sua vez é convertida em biliverdina que logo é reduzida à bilirrubina indireta (não conjugada). A BI é insolúvel e se liga à albummina para ser transportada na corrente sanguínea.
- Metabolismo hepático: a BI é captada pelos hepatócitos, conjugada com o glucuronídeo (por ação da enzima glucoronil-transferase), formando a bilirrubina direta (conjugada). Em seguida, a BD é excretada pelos hepatócitos para os canalículos biliares. A fase de excreção é a etapa limitante no metabolismo da bilirrubina e é a primeira a ser afetada quando há um distúrbio do hepatócito
- Fase intestinal: no intestino grosso, cerca de 50% da BD é convertida em urobilinogênio por bactérias intestinais. Parte é eliminada nas fezes, parte retorna ao figado e parde vai pra circulação e é excretada pelos rins.
Icterícia:
-Pigmentação amarelada da pele, esclerótica e frênulo da língua pela bilirrubina, quando esta encontra-se em níveis elevados na circulação.
Valores normais:
-BI: até 08 mg/dL
-BD: até 0,2 mg/dL
-BT: até 1 mg/dL
Obs.: deve ser diferenciada de hipercarotenemia (pigmentação amarelada da pela, mas não da esclerótica, pelo acúmulo de pigmentos carotenoides)
Mecanismos de icterícia:
- Superprodução (acúmulo de BI)
- Diminuição da captação (acúmulo de BI)
- Diminuição da conjugação (acúmulo de BI)
- Alteração da excreção (acúmulo de BD)
- Obstrução biliar (acúmulo de BD)
Obs.: na doença hepatocelular (hepatite, hepatotoxicidade) á prejuízo da captação, conjugação e excreção, porém a excreção é a fase que limita a velocidade do processo e é o principal distúrbio. Por isso, a icterícia nesses casos é mista mas predominantemente as custas de BD
Classificação simplificada das icterícias:
- Hemolítica: predomínio de BI
- Hepatocelular: mista com predomínio de BD
- Obstrutiva (colestática): mista com predomínio de BD
Síndrome de Gilbert:
Distúrbio hereditário do metabolismo da bilirrubina mais comum (7% dos caucasianos); mais comum em homens (3:1)
- Deficiência hereditária leve da glucuronil-transferase»_space; hiperbilirrubinemia indireta leve e persistente
- A icterícia costuma ser leve e o paciente só percebe após exames de rotina. BT raramente ultrapassa 5 mg/dL
- Segunda principal causa de hiperbilirrubinemia indireta (só perde pra hemólise)
Fatores que podem agravar a icterícia na Sd. de Gilbert:
Jejum prolongado, exercício físico, alcool e ácido nicotínico
Diagnóstico da Sd. de Gilbert:
Diagnóstico de exclusão: paciente com hiperbilirrubinemia indireta persistente sem outros sinais/sintomas sistêmicos; sem hemólise (reticulócitos normais); provas de função hepática normais.
TTO da Sd. de Gilbert:
Não necessita de tratamento específico. Pode-se reduzir a intensidade da icterícia com fenobarbital (aumenta a atividade da glucoronil-transferase)
Síndrome de Crigler-Najjar tipo I:
- Deficiência completa da Glucoronil-transferase
- Hiperbilirrubinemia indireta acentuada em recém-nascidos (pode chegar até 45 mg/dL) com BD ausente
- Em geral, as crianças morrem antes do primeiro ano de vida por conta de Kernicterus (A BI atravessa facilmente a BHE provocando efeitos tóxicos no SNC)
- Provas de função hepática e histologia hepática normais
- TTO: plasmaferese; fototerapia; inibidores da heme-oxigenase; transplante hepático (única opção definitiva de cura)
Síndrome de Crigler-Najjar tipo II:
- Deficiência parcial (moderada a grave) da glucoronil-transferase
- Níveis séricos de BI em torno de 6-20 mg/dL
- Icterícia pode não aparecer até a adolescência; complicações neurológicas são raras
- TTO: fenobarbital
Síndrome de Dubin-Johnson
-Icterícia crônica idiopática
-Defeito no gene MRP2»_space; defeito na fase de excreção da BD para a bile
-Típica de Judeus Sefarditas (do Irã/Iraque)
-Níveis de bilirrubina entre 2-5 mg/dL
-Costuma ser assintomática
-Diagnóstico: dosagem de coproporfirina urinária (normais porém com predomínio da fração I ao invés da III)
-Acúmulo de pigmento da região centrolobular dos lóbulos hepáticos é característico (a biópsia hepática não é necessária). Macroscopicamente o fígado fica com aspecto enegrecido
TTO: não é necessário
Síndrome de Rotor:
Distúrbio no armazenamento da BD que acaba retornando ao sangue antes de ser excretada na bile
-Semelhante a Dubin-Jhonson, porém com coproporfirina urinária aumentada (3-5 vezes) e sem pigmentação característica do fígado
Colestase:
-Acúmulo de BD e outros componentes da bile por um problema na drenagem biliar intra/extra-hepática
Obs.: lesão hepatocelular pode provocar colestase intra-hepática por um bloqueio na excreção de BD pelos hepatócitos.
-Acúmulo de pigmento biliar nos hepatócitos e células de Kupfer; dilatação dos canalículos biliares, etc.
Clínica da colestase:
Icterícia (forte predomínio de BD), colúria, acolia fecal e prurido.
Obs.: o prurido parece ser causado por aumento do tônus opioidoérgico (melhora com uso de antagonista dos receptores opioides - naloxone)
Laboratória da colestase:
Aumento de FA, GGT e 5-nucleotidase
Causas de colestase intra/extra-hepáticas:
-Intra: hepatites virais (principalmente hep A aguda); hepatites tóxicas e medicamentosas; doenças infiltrativas do fígado e CBP
-Extra: cálculos e neoplasias
Obs.: CEP»_space; doença auto-imune que provoca estenoses mjultiplas no sistema biliar intra/extra-hepático
Abordagem do paciente ictérico:
- Anamnese/exame físico detalhados
- Dosagem sérica de bilirrubinas, hemograma completo e hepatograma (enzimas hepáticas e provas de função hepática)
- Transaminases (AST/TGO e ALT/TGP): grande aumento nas lesões hepatocelulares (ex: hepatite aguda)
- FA e GGT: grande aumento na colestase (ex: coledocolitíase)
- Provas de função hepática: albumina, TAP/INR e amônia sérica
A dosagem de bilirrubina confirma a icterícia e indica qual o tipo predominante
- Aumento de BI: prosseguir investigação de hemólise (reticulócitos, LDH, haptoglobina, esfregaço de sangue periférico)
- Aumento de BD: pode ser lesão hepatocelular ou obstrução de vias biliares
Obs1.: quando AST se eleva mais que ALT (2:1)»_space; suspeitar de hepatite alcoólica
Obs2.: na suspeita de CBP, deve-se solicitar anticorpo antimitocôndria
Outras condições que podem aumentar FA e GGT (além de colestase):
-FA: distúrbios ósseos e gestação
-GGT: álcool
Ou seja, FA e GGT devem ser analisados em conjunto. Um aumento de FA com GGT normal indica que esse aumento de FA provavelmente é por um distúrbio ósseo.
Exames de imagem no paciente com icterícia:
- USG de abdome: exame inicial em um paciente com um quadro clinicolaboratorial de icterícia colestática
- TC helicoidal com contraste endovenoso: para os casos em que o USG não foi elucidativo ou suspeita de patologia na região periampular
- Colangiografia por RMN
- USG endoscópica
- CPRE: permite a visualização direta da árvore biliar e dos ductos pancreáticos. Superior à TC e à USG para detectar obstruções extra-hepáticas e é o procedimento de escolha quando a suspeita é coledocolitíase. Permite intervenção terapêutica.
- CPTH: passagem de agulha até o interior do parênquima hepático em um ducto biliar dilatado. Útil para avaliar obstruções biliares “altas”
- Biópsia hepática: só em casos com dificuldade diagnóstica por métodos menos invasivos e suspeita de etiologia intra-hepática
Hepatites virais agudas:
-Duração < 6 meses
-Apresentação clínica variável (desde assintomáticas até fulminantes com rápida evolução para insuficiÊncia hepática)
Obs.: todas as hepatites virais são de notificação compulsória no Brasil (notificação em até 7 dias).
Curso clínico das hepatites virais:
- Fase prodrômica: duração de dias a semanas; sintomas inespecíficos (mal-estar, astenia, náuseas, vômitos, diarreias, mialgiais, artralgias, tosse, coriza, febre baixa, glomerulonefrite aguda - principalmente hepatite B - ras/urticária…)
- Fase ictérica: surgimento de icterícia, associada ou não com colúria, hipocolia fecal e prurido (síndrome colestática). A fase ictérica pode não acontecer (o paciente pode nunca saber que teve hepatite viral ou só descobrir quando surgirem sinais de cronificação da infecção)
- Fase de convalescência: melhora dos sinais e sintomas. Fim do quadro agudo de hepatite. Ou o paciente está curado ou evoluirá para cronicidade