Processo penal - Leonardo Barreto Moreira Alves Flashcards
(329 cards)
Qual é o objeto do processo penal segundo a visão clássica?
[…] Em face desse conceito clássico, estabelece-se como objeto principal da disciplina a regulação da aplicação jurisdicional do Direito Penal. Em outros termos, praticado um fato definido como crime, surge para o Estado o direit de punir (jus puniendi), que se exercita por meio justamento do Direito Processual Penal. Assim, pode-se afirmar que o Processo penal é instrumental à aplicação do direito penal - daí o brocardo nulla poena sine judicio; nulla poena sine judicie (nenhuma pena pode ser imposta sem processo; nenhum pena pode ser imposta senão pelo juiz).
Aliás, vale a pena ressaltar que, muito mais que um direito, há para o Estado um verdadeiro dever de punir (poder-dever de punir), pois, a partir do momento em que ele assume para si a aplicação do Direito, mediante a jurisdição, afastando-se a tutela privada, deve determinar a aplicação das sanções penais aos responsáveis por infrações penais, sob pena de se colocar em risco a convivência social.
[…]
Do conceito clássico do Direito Processual anteriormente transcrito ainda podem ser extraídos outros dois objetos secundários da disciplina. O primeiro deles diz respeito ao estudo da ação penal em pé de igualdade com o estudo das atividades investigatórias - atividade geralmente praticadas pela Polícia Judiciária em sede de inquérito policial -, já que estas são necessárias para embasar o oferecimento daquela. […]
Nesse contexto, convém relembrar que toda a atividade que o Estado exerce em busca da aplicação da sanção penal - desde as investigações policiais até a sentença penal - é chamada de persecução criminal (persecutio criminis). Nessa atividade, portanto, são identificados dois momentos distintos: o da investigação (atividade preparatória da ação penal) e o da ação penal (tem como objeto o pedido de julgamento da pretensão punitiva).
O segundo objeto secundário da matéria consiste no fato de que ele também regular a Organização Judiciária, pois dispõe sobre normas que regulamentam a atuação dos órgãos estatais nas fases policial e judiciária […]
Quais elementos a visão moderna trouxe ao conceito de processo penal?
Visão constitucional-garantista do processo (Processo Penal Constitucional)
Segundo essa visão, inaugurada pela Constituição Federal de 1988, o processo deve ser entendido não só como meio de aplicação do Direito Penal no caso concreto, mas também como uma forma de proteção dos direitos fundamentais do indivíduo contra a força impingida pelo Estado na persecução penal, afinal de contas há uma franca desigualdade material entre eles, já que o Estado investiga (Polícia judiciária), acusa (Ministério Público) e julga (juiz), enquanto o réu apenas se defende, buscando a sua liberdade.
Isso provoca, portanto, um abrupto rompimento do conceito clássifco do Processo Penal. Nesse sentido, pertinentes as palavras de Eugênio Pacelli de Oliveira: “A nova ordem passou a exigir que o processo não fosse mais conduzido, prioritariamente, como mero veículo de aplicação da lei penal, mas, além e mais que isso, que se transformasse em um instrumento de garantia do indivíduo em face do Estado”.
Fala-se então em um Processo Penal justo, no qual deve haver a observância dos direitos fundamentais e dos princípios constitucionais atinentes à matéria, ganhando destaque a presunção de inocência, o sistema acusatório, o convencimento motivado, a proibição de provas ilícitas, o fortalecimento do Ministério Público etc.
Quais são as finalidade imediatas e mediatas do processo penal?
a) finalidade imediata ou direta: Em uma visão clássica, implica na necessidade de que o Processo Penal, na prática, faça valer o direito de punir do Estado (jus puniendi). Todavia, como visto no item anterior, a essa finalidade clássica deve ser acrescida a função de tutela dos direito fundamentais do cidadão contra a força - muitas vezes opressora - do Estado impingida na persecução criminal.
b) Finalidade mediata ou indireta: Confunde-se com a própria finalidade do Direito Penal, que é a “proteção da sociedade, a paz social, a defesa dos interesses jurídicos, a convivência harmônica das pessas no território da nação” (Mirabete).
Quais são as fontes materiais e as fontes formais do Direito Processual Penal?
a) Fonte de produção ou material: Refere-se ao ente federativo responsável pela elaboração da norma. Nesses termos, o Direito Processual Penal é matéria que deve ser legislada privativamente pela União, nos termos do art. 22, inciso I, da CF. […]
b) Fonte formal ou de cognição: Refere-se ao meio pelo qual uma norma jurídica é revelada no ordenamento jurídico. Essa fonte é subdividade em fontes primária ou imediatas ou diretas e em fontes secundárias ou mediatas ou indiretas ou supletivas.
1) Fontes primária ou imediatas ou direta: São aquelas aplicadas imediatamente. Consideram-se fontes primária do Processo Penal: a lei (art. 22, I, da CF), entendida em sentido amplo, para incluir a própria CF, os tratados, convenção e regras de Direito Internacional […]
2) Fontes secundárias ou mediatas ou indiretas ou supletivas: São aquelas aplicadas na ausênciadas fontes primária, nos termos do art. 4 da LINDB. Consideram-se fontes secundárias do Processo Penal: cosumes; princípios gerais do direito; analogia.
O que é analogia legis e analogia juris? Admite-se analogia in malam partem no processo penal?
A analogia subdivide-se em: analogia juris (apela-se a uma situação prevista ela lei); analogia iuris (apela-se a uma situação prevista pelos princípios jurídico extraídos das normas particulares).
A analogias poser feita in bonam partem ou em in malm partem. No Direito Penal, somente é admitida a analogia in bonam partem, sendo vedada, portanto, a analogia in malan partem. No entanto, no Processo Penal, a analogia pode ser feita livremente, sem restrições, ou seja, in bonam parte ou in malam partem, pois ela não envolverá uma norma penal incriminadora.
Qual é a difrenteça entre analogia e interpretação analógica?
Analogia x Interpretação analógica
- Analogia: é forma de autointegração da norma processual penal.
- Interpretação analógica: é forma de interpretação da normal processual penal.
- Analogia: Aplica-se o regramento jurídico de uma dada situação semelhante a outra, na qual não já solução aparente - há verdadeira criação de uma norma.
- Interpretação analógica: A própria lei autoriza o seu complemento, já prevendo hipóteses de preenchimento, geralmente por meio de uma expressão genérica, que resume situações casuísticas precedentes.
- Analogia: Pode ser feita in malam partem no Processo Penal (não no Direito Penal)
- Interpretação analógica: Pode ser feita in malam partem no Processo Penal e no Direito Penal.
Quais são as consequências do princípio da presunção de inocência?
1 - Ônus da prova, em regra, cabe à acusação.
2 - Excepcionalidade das prisões cautelares.
3- Toda medida constritiva de direito individuais, na verdade, só pode ser decretada excepcionalmente: […] Além das medidas cautelares estampadas no art. 319 do CPP, são também exemplos de medidas constritivas de direito individuais as quebras do sigilo fiscal, bancário e telefônico (mitigam o direito constitucional à intimidade); violação de domicílio em razão de cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar (mitiga o direito constitucional à inviolabilidade de domicílio).
O direito de autodefesa autoriza que o acusado minta no interrogatório judicial?
A autodefesa é a defesa promovida pessoalmente pelo próprio réu, sem assistência de procurador, geralmente durante o seu interrogatório judicial, sendo ela disponível, afinal de contas o acusado pode se calar ou até mesmo mentir, em conformidade com outro princípio constitucional expresso, o direito ao silêncio (art. 5, inciso LXIII, CF [o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado]).
Entretanto, ressalte-se que a disponibilidade da autodefesa não autoriza que o réu minta ou se cale na primeira parte do interrogatório judicial (art. 187, pár. 1, do CPP), referente às perguntas sobre a sua qualificação pessoal, o que é apenas permitido na segunda parte deste ato processual (art. 187, pár. 2, do CPP), no momento das perguntas sobre os fatos delitivos. Em se recusando a fornecer sua qualificação, o agente poderá praticar a contravenção penal no art. 68 da Lei de Contravenções Penais (recusa de dados sobre própria identidade ou qualificação). De outro lado, se o réu atribui a si mesmo outra identidade, pode restar configurado o crime definido no art. 307 do CP (falsa identidade). Ademais, também não se permite que o réu, na segunda parte do interrogatório, formule iputação falsa a terceiros ou mesmo autoimputação falsa, sob pena inclusive de responsabilidade penal por seu ato, caracterizando-se o crime de denunciação caluniosa (art. 339 do CP) ou até de auto-acusação falsa (art. 341 do CP).
Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.
§ 1o Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.
§ 2o Na segunda parte será perguntado sobre:
I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita;
II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;
III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;
IV - as provas já apuradas;
V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;
VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;
VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;
VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa.
De que forma o direito de autodefesa se manifesta no processo, além da possibilidade de apresentar defesa no interrogatório judicial (direito de postular pessoalmente)? Qual é a consequência de sua inobservância nesses casos?
A autodefesa distingue-se ainda em direito de audiência (direito de o réu ser ouvido no processo, o que ocorre geralmente durante o interrogatório judicial) e direito de presença (direito de o réu estar presente aos atos processuais, geralmente audiências seja de forma direta, seja de forma indireta, o que ocorre por meio da videoconferência).
Nesse contexto, porém, é de se registrar que o STJ entende que a ausência do réu à audiência de oitiva de testemunhas não gera nulidade do feito se o seu defensor estava presente ao ato processual e não restou demonstrado qualquer prejuízo para ele (info 426). Nesse trilhar, o STF já teve oportunidade de decidir que inexiste nulidade pela ausência do réu preso em audiência de oitiva de testemunha por meio de carta precatória se ele não manifestou expressamente intenção de participar da audiência (RE 602543).
5. É pacífico nesta Corte Superior que a presença do réu na audiência de instrução, embora conveniente, não é indispensável para a validade do ato, consubstanciando em nulidade relativa a sua ausência, a qual necessita para a sua decretação da comprovação de efetivo prejuízo para a defesa e arguição em momento oportuno.<br></br>6. A Lei Processual Penal em vigor adota, nas nulidades processuais, o princípio da pas de nullité sans grief, segundo o qual somente há de se declarar a nulidade se, alegada em tempo oportuno, houver demonstração ou comprovação de efetivo prejuízo para a parte, o que, conforme as premissas delineadas no acórdão, não ocorreu, na espécie.<br></br>(AgRg no HC 555.960/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 16/06/2020, DJe 23/06/2020)
Quais são as consequência do princípio da ampla de defesa?
1) Apenas o réu tem direito à revisão criminal: A revisão criminal é sempre pro reo, nunca pro societate.
2) O juiz deve sempre fiscalizar a eficiência da defesa do réu: Por conta desse dever, o juiz poderá declarar o réu indefeso, fazendo-o constituir outro defensor ou, se o acusado assim não proceder, nomear-lhe-á um defensor dativo. A esse respeito, vale a pena registrar que o STF, na Súmula 523, agasalha o entendimento de que “No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”.
Quais são as consequência da plenitude de defesa?
1) A atenção do juiz com a efetividade da defesa do réu é ainda maior: Prova disso é que, se o juiz declarar o réu indefeso, nomeará ou permitirá a constituição de novo defensor, podendo dissolver o Conselho de Sentença e redesignar a sessão de julgamento (art. 497, V, do CPP).
2) É possível a defesa apresentar nov tese na tréplica.
3) Caso o réu precise de mais tempo nos debates, poderá pedi-lo sem que isso gere necessariamente igual direito ao Ministério Público.
Em que consiste o princípio do favor rei? Qual é o seu fundamento e quais são suas consequências?
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Princípio da prevalência do interesse do réu ou favor rei, favor libertatis, in dubio pro reo, favor inocente.
Havendo dúvida entre admitir-se o direito de punir do Estado ou reconhecer-se o direito de liberdade do réu, deve-se privilegiar a situação deste último, por ser ele a parte hipossuficiente da relação jurídica estabelecida no Processo Penal. É princípio que decorre ontologicamente do princípio da presunção de inocência, daí porque é possível afirmar que ele também se encontra previsto no art. 5, inciso LVII, da CF.
Ademais, há clara aplicação deste princípio no art. 386 do CPP, ´com redação dada pela Lei n. 11.690\08m segundo o qual será possível a absolvição do réu nas hipóteses de existência de exclusdentes de ilicitude ou culpabilidade, mesmo se aenas houver fundada dúvida sobre sua existência - não se exige mais certeza sobre sua existência (inciso VI), bem como se não houver prova suficiente para a sua condenação (inciso VII).
Contudo, de acordo com entendimento majoritário do STJ, esse princípio não tem aplicação nas fases de oferecimento da denúncia e na prolação da decisão de pronúncia do Tribunal do Juri, nas quais prevalece o princípio do in dubio pro societate, embora o próprio STF, em outras oportunidade, tenha afirmado que tal vrocardo não é acolhido no ordenamento jurídico brasileiro, em respeito justamente ao princípio da presunção da inocência (RHC 40904).
Consequência direta deste princípio consiste no fato de que, em havendo dúvida na interpretação de um determinado artigo de lei processual penal, deve-se privilegiar a interpretação que beneficie a situação do réu.
Por que a redistribuição de processo em razão da criação de vara não configura violação ao princípio do juiz natural?
Porque, nessa hipótese, a medida é válida para toda a coletividade, não atingindo um réu em específico. A garantia constitucional do juiz natural permite posteriores alterações de competência.
No que toca ao princípio da publicidade, o que é a publicidade geral e a publicidade específica?
Publicidade geral: Regra geral, permitindo o acesso público irrestrito aos atos e autos processuais.
Publicidade específica: Se a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem, apenas o juiz, o Ministério Público, o assistente de acusação e o defensor têma cesso aos atos e autor processuais.
A permanência de prova ilícia no processo, após o reconhecimento dessa qualidade, implica nulidade do processo?
O CPP, com advento da Lei n. 11.690\2008, passou a disciplinar com pormenores a matéria. Assim, inicialmente, repetiu omandamento constitucional no art. 157, caput, estatuindo que são inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas. Complementando esta ideia, o art. 157, pár. 3, CPP, determina que preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente. Registre-se, porém, que, se a prova permanecer nos autos, mas ela não for utilizada pelo magistrado, de nenhum forma, para prolação da sentença, não haverá qualquer nulidade nesta decisão. Não obstante, caso o juiz venha a se utilizar de uma prova ilícia para proferir a sentençça, esta será nula (nulidade absoluta).
Parágrafo 5 acrescentado ao art. 157 do CPP pelo pacote anticrime:
§ 5º O juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Qual é a diferença entre prova ilícita e prova ilegítima?
[…] a doutrina considera a existência do gênero prova proibida ou vedade ou inadmissível, tendo como espécie a prova ilícita, violadora de regra de direito material (exemplo: confissão obtida mediante tortura; intercepção telefônica realizada sem autorização judicial), e a prova ilegítima, aquela obtida mediante violação de regra de direito processual (exemplo: laudo pericial confeccionado por apenas um perito não oficial). O CPP (e a própria Constituição Federal), porém, não acolher essa distinção, tratando uma prova que viole norma constitucional ou legal sempre como prova ilícita.
Indique algumas consequências do princípio da duração razoável do processo.
São consequências destes princípios (economia processual, celeridade processual e durança razoável do processo).
1) As prisões cautelares somente devem persistir por tempo razoável, enquanto presente a necessidade das mesmas (princípio da duranção razoável das prisões cautelares).
2) Possibilidade de utilização da carta precatória itinerante (art. 355, pár. 1, do CPP).
3) A suspensão do processo, havendo questão prejudicial, somente deve ser feita quando há caso de difícil solução, para que não se procrastine inutilmente o término da instrução (art. 93 do CPP).
Art. 355. A precatória será devolvida ao juiz deprecante, independentemente de traslado, depois de lançado o “cumpra-se” e de feita a citação por mandado do juiz deprecado.
§ 1o Verificado que o réu se encontra em território sujeito à jurisdição de outro juiz, a este remeterá o juiz deprecado os autos para efetivação da diligência, desde que haja tempo para fazer-se a citação.
Qual é o fundamento legal do princípio de que ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo?
Princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se detegere).
Trata-se de princípio constitucional implícito que decorre dos seguintes princípio constitucionais expressos: presunção de inocência (art. 5, LVII, CF); ampla defesa (art. 5, LV, CF); direito ao silêncio (art. 5, LXIII, CF). Não obstante, é princípio que se encontra expressamente previsto no art. 8 da Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto n. 678, de 6 de novembro de 1992, e que tem status supralegal, conforme entendimento do STF exarado nos jugalmento do RE n. 466.343\SP e HC 87.585\TO.
Considera-se que o Estado é infinitamente superior ao réu no processo penal, não necessitando, portanto, de sua ajuda na atividade persecutória, sob pena de se decretar a falência de seus órgãos.
Quais princípios constitucionais fundamentam o princípio da demanda e o princípio consequente da correlação entre acusação e defesa?
Trata-se de princípio extraído do sistema acusatório, que vige no Brasil e pode ser depurado dos artigos 129, inciso I (repetido pelo art. 257, inciso I, do CPP), e 5, inciso LIX, da CF, os quais garantem, respectivamente, a titularidade da ação penal pública por parte do Ministério Público e a possibilidade de oferecimento da ação penal privada subsidiária da pública, se a ação penal pública não for intentada pelo Parquet no prazo legal.
Nesses termos, entende-se que o princípio veda que o juiz deflagre a ação penal de ofício, exigindo-se para tanto a iniciativa do titular da ação. Por força do princípio em comento é que não se admite mais o processo judicialiforme […]
Conquequência direta deste princípio é o surgimento de outro princípio, o da correlação (ou congruência ou relatividade ou reflexão) entre a acusão e a sentença, o qual implica na exigência de que o fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, guarde “perfeita correspondência com o fato reconhecido pelo juiz, na sentença, sob pena de grave violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa consequentemente, ao devido processo legal”.
Cite três exceções ao princípio da inércia da jurisdição.
1) Decisões referentes ao estado de liberdade do indivíduo, tais como a expedição de ordem de habeas corpus (art. 654, pár. 2, do CPP), o relaxamento da prisão em flagrante (art. 5, LXV, CF), a revogação da prisão preventiva (Art. 316 do CPP) e a concessão da liberdade provisória (Art. 5, LXVI, CF). Contudo, a prisão temporária é modalidade de prisão cautelar que não pode ser decretada de ofício pelo juiz, dependendo sempre de representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público (art. 2, caput, da Lei 7.960\89).
2) Procedimento da execução penal (art. 195 d LEP).
Art. 195. O procedimento judicial iniciar-se-á de ofício, a requerimento do Ministério Público, do interessado, de quem o represente, de seu cônjuge, parente ou descendente, mediante proposta do Conselho Penitenciário, ou, ainda, da autoridade administrativa.
Qual é o fundamento constitucional do promotor natural?
Trata-se de princípio constitucional implícito que decorre dos seguintes princípios constitucionais expressos:
- Princípio da inamovibilidade funcional dos membros do MP (art. 128, pár. 5, I, b, CF).
- Princípio da independência funcional dos membros do MP (art. 127, pár. 1, CF).
- Princípio do juiz natual (art. 5, LIII, CF) - por analogia.
Por força deste princípio, entende-se que o agente delitivo deve ser acusado por órgão imparcial do Estado, previamente designado por lei, vedada a indicação de acusador para atuar em casos específicos. Conforme decidido pelo STF, o postulado do promotor natural tem como escopo impedir que chefias institucionais do Ministério Público determinem designações casuísticas e injustificadas, de modo a instituir a reprovável figura do “acusador de exceção” (Info 644).
Em respeito a este princípio, o Procurador-Geral de Justiça apenas pode designar Promotores de Justiça para determinados casos concretos se houver prévia e expressa previsão em lei nesse sentido. Tais hipóteses de designação atualmente estão estipuladas no art. 10, IX, da Lei n. 8.625\93 (LOMPE).
Art. 10. Compete ao Procurador-Geral de Justiça:
IX - designar membros do Ministério Público para:
a) exercer as atribuições de dirigente dos Centros de Apoio Operacional;
b) ocupar cargo de confiança junto aos órgãos da Administração Superior;
c) integrar organismos estatais afetos a sua área de atuação;
d) oferecer denúncia ou propor ação civil pública nas hipóteses de não confirmação de arquivamento de inquérito policial ou civil, bem como de quaisquer peças de informações;
e) acompanhar inquérito policial ou diligência investigatória, devendo recair a escolha sobre o membro do Ministério Público com atribuição para, em tese, oficiar no feito, segundo as regras ordinárias de distribuição de serviços;
f) assegurar a continuidade dos serviços, em caso de vacância, afastamento temporário, ausência, impedimento ou suspeição de titular de cargo, ou com consentimento deste;
g) por ato excepcional e fundamentado, exercer as funções processuais afetas a outro membro da instituição, submetendo sua decisão previamente ao Conselho Superior do Ministério Público;
h) oficiar perante a Justiça Eleitoral de primeira instância, ou junto ao Procurador-Regional Eleitoral, quando por este solicitado;
O MP estadual pode atuar no STJ?
CONJUR (2017):
O Ministério Público dos estados e do Distrito Federal tem a legitimidade para levar casos ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, independentemente do Ministério Público Federal. A única condição para isso é que o fato em discussão, na origem, esteja na esfera de competência do MP estadual.
Assim entendeu o Supremo, por maioria, em votação no Plenário Virtual, ao julgar o Recurso Extraordinário 985.392. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio. O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, propôs a reafirmação da jurisprudência do Supremo sobre o tema com a seguinte tese: “Os ministérios públicos dos estados e do Distrito Federal têm legitimidade para propor e atuar em recursos e meios de impugnação de decisões judiciais em trâmite no STF e no STJ, oriundos de processos de sua atribuição, sem prejuízo da atuação do Ministério Público Federal.”
O RE, que teve repercussão geral reconhecida, foi apresentado depois que o STJ negou a legitimidade do Ministério Público do Rio Grande do Sul para oferecer razões em Habeas Corpus contra ato do Tribunal de Justiça estadual. Também foi negada a legitimidade do MP-RS para interpor embargos de declaração.
No recurso ao STF, o MP gaúcho questionou acórdão do STJ argumentando que a decisão interpretou de forma errada a disposição constitucional sobre a unidade do Ministério Público (artigo 127, parágrafo 1º, Constituição Federal) contraposta à autonomia de seus ramos (artigo 128). Disse ainda que o STJ negou ao MP gaúcho o direito ao contraditório (artigo 5º, XXXV, CF).
Para Gilmar Mendes, os dispositivos constitucionais citados pelo MP-RS foram violados, pois não há razão para negar a legitimidade frente o STF e o STJ. “Ambos são tribunais nacionais, que julgam causas com origem em feitos de interesse dos Ministérios Públicos estaduais”, ressaltou.
Segundo o ministro, deve ser assentada a legitimidade ampla dos Ministérios Públicos estaduais e do Distrito Federal para atuar em recursos, ações de impugnação e incidentes oriundos de processos de sua competência em trâmite no STF e no STJ, podendo, para tanto, propor os meios de impugnação, oferecer razões e interpor recursos.
Essa legitimidade, continuou o relator, alcança a interposição de recursos internos, agravos, embargos de declaração, embargos de divergência, recurso ordinário, recurso extraordinário e o respectivo agravo e propositura dos meios de impugnação de decisões judiciais em geral reclamação, mandado de segurança, habeas corpus, incidente de resolução de demandas repetitivas, ação rescisória, conflito de competência. Também alcança a prerrogativa de produzir razões nos recursos e meios de impugnação em curso. “Tudo isso sem prejuízo da atuação da Procuradoria Geral da República perante os Tribunais Superiores”, destacou.
O ministro explicou que o Ministério Público é único e indivisível (artigo 127, parágrafo 1º), mas, por estruturação, é ramificado (artigo 128). “Tenho que, para o exercício de suas funções institucionais, mostra-se imprescindível o reconhecimento da autonomia do Ministério Público local perante as Cortes Superiores, porquanto, na maioria das vezes, as pretensões se consubstanciam de maneira independente e estão intimamente ligadas às situações e razões trazidas das instâncias precedentes”, destacou.
Tirar a legitimidade processual do MP estadual nas instâncias superiores e exigir a atuação do procurador-geral da República é criar uma obrigação vinculada, uma vez que a demanda jurídica nos estados pode ser contrária ao entendimento do PGR.
Assim, o ministro Gilmar Mendes deu provimento ao RE para cassar a decisão questionada, determinando o retorno dos autos ao STJ para que prossiga no julgamento do Habeas Corpus, considerando as razões do MP-RS.
O princípio da obrigatoriedade da ação penal pública decorre de que dispositivos constitucionais? Em que dispositivos do CPP é concretizado?
O princípio da obrigatoriedade da ação penal pública consiste no dever imposto à Polícia Judiciária e ao Ministério Público de, respectivamente, investigar e processar crimes desta espécie de ação penal. Para estes crimes, portanto, não há que se falar em princípio da oportunidade da atuação dos referidos órgão estatais - tal princípio somente tem aplicação nos crimes d eação penal privada. […]
O princípio da obrigatoriedade da ação penal p[ublica é um princípio constitucional implícito que decorre dos seguintes princípios:
1) Legalidade penal (art. 5, XXXIX, CF): não há crime sem prévia lei que o definam nem pena sem prévia cominação legal; logo, se há tipicidade penal, há obrigatoriedade da aplicação da sanção penal.
2) Titularidade da ação penal pública exclusivamente pelo Ministério Público (Art. 129, I, CF e art. 257, I, CPP) e, em caráter excepcional, pelo ofendido (art. 5, LIX, CF).
Art. 257. Ao Ministério Público cabe:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma estabelecida neste Código; e
II - fiscalizar a execução da lei.
I - "A Lei n.º 11.340/2006, denominada Lei Maria da Penha, em seu art. 5.º, inc. III, caracteriza como violência doméstica aquela em que o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação" (CC n. 100.654/MG, Terceira Seção, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 13/5/2009).
II - No que se refere à nulidade da citação, o juízo de origem reconheceu o equívoco em relação à realização da citação por hora certa, anulando o ato e determinando a citação por edital, não se constatando prejuízo para a defesa.
III - Ao juiz é dado decretar a prisão preventiva, inclusive de ofício, quando no curso do processo, consoante se depreende da leitura do art. 311, do Código de Processo Penal, não havendo que se falar em ofensa ao devido processo legal pela ausência de intimação da defesa.
IV - Quanto à nulidade do laudo pericial, realizado com base em exame particular, não houve pronunciamento sobre o tema por parte do eg. Tribunal a quo, de modo que não é possível ao Superior Tribunal de Justiça conhecer pela vez primeira de matéria não debatida nas instâncias ordinárias, sob pena de indevida supressão de instância.
Recurso ordinário desprovido.
(RHC 51.303/BA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 09/12/2014, DJe 18/12/2014) "Ainda que não seja o modelo ideal - no qual deve ser a questão cautelar decidida em audiência de custódia, com a presença do Ministério Público e da defesa do autuado - eventual não realização, por motivo justificado, dessa audiência no prazo legal não desautoriza a excepcional conversão da prisão em flagrante, sem prévia manifestação do órgão ministerial ou da autoridade policial, em prisão preventiva, dando-se oportunidade, em momento imediatamente posterior, ao exercício do contraditório diferido, com possível revisão do ato judicial" (HC n. 583.995/MG, relator Ministro NEFI CORDEIRO, relator p/ acórdão Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/9/2020, DJe 7/10/2020). PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TENTATIVA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. MEDIDA DECRETADA EM AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA SEM A PRESENÇA DA DEFESA. INOCORRÊNCIA. PRESCINDIBILIDADE. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MODUS OPERANDI. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO.
I - A segregação cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do art. 312 do CPP.
II A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que "não é causa de nulidade do decreto de prisão preventiva a ausência do defensor na audiência de custódia, sobretudo porque realizada ainda durante a fase embrionária da investigação policial, antes, portanto, da fase processual, que é orientada pelos princípios do contraditório e ampla defesa, onde a ausência de defesa técnica é, sim, causa de nulidade (Súmula 523/STF). Precedentes do STJ" (RHC n. 111.891/MT, Quinta Turma, Rel.
Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, DJe de 01/07/2019, grifei).
III - Na hipótese, o decreto prisional encontra-se devidamente fundamentado em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam de maneira inconteste a necessidade da prisão para garantia da ordem pública, em razão da forma pela qual o delito foi em tese praticado, consistente em tentativa de homicídio qualificado cometido com emprego de arma de fogo e recurso que dificultou a defesa da vítima, bem como em concurso de agentes, só não logrando êxito no seus intentos homicidas por razões alheias às suas vontades, o que revela a gravidade concreta da conduta e a periculosidade do recorrente, justificando, assim, a imposição da medida extrema, na hipótese.
Precedentes.
IV - Não é cabível a aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão, in casu, haja vista estarem presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva, consoante determina o art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal.
Recurso ordinário desprovido.
(RHC 121.048/MG, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 05/12/2019, DJe 13/12/2019)