Títulos de crédito - livro André Flashcards
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A normas do CC relativas aos títulos de crédito são aplicáveis aos títulos previstos em leis especiais?
De fato, o CC afirma, em seu art. 887, que “o título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. E mais: no seu art. 903, reforçando a disposição constante do art. 887, estabelece que “salvo disposição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código”.
Portanto, resta claro que os títulos de crédito só produzirão efeitos se preencherem os requisitos previstos na legislação específica e, não dispondo de modo diverso a lei especial, reger-se-ão pelo disposto no novo CC.
Assim, as disposições do CC, em princípio, não se aplicam aos títulos de crédito nominados/típicos, que possuem legislação especial. É o caso da duplicata, da letra de câmbio, da nota promissória e do cheque, para citar apenas os principais. O Código Civil funciona, pois, na parte relativa aos títulos de crédito, como uma teoria geral para os chamados títulos atípicos ou inominados, isto é, que não possuem lei específica.
[…]
Pode-se até dizer que a intenção do legislador foi boa – de fato, é realmente muito interessante para o mercado ter a permissão legal geral e abstrata de criação de títulos de crédito –, mas o resultado não o foi. O tratamento dado pelo Código Civil aos títulos de crédito recebeu inúmeras e contundentes críticas da doutrina comercialista, sobretudo porque alguns institutos cambiários relevantes, como o aval e o endosso, foram disciplinados com regras que contrariam frontalmente a Lei Uniforme de Genebra. Basta citar, por exemplo, que o Código Civil não admite o aval parcial (art. 897, parágrafo único) e não prevê a corresponsabilização do endossante pelo pagamento do título (art. 914). A lei Uniforme, por sua vez, admite o aval parcial (art. 30) e prevê a corresponsabilização do endossante (art. 15).
Apresente o conceito de título de crédito, seus princípios informadores e suas características.
Resumo
- Conceito: documento necessário ao exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado.
- Princípios informadores do regime jurídico cambial: a) cartularidade; b) literalidade; c) autonomia.
- Características: 1) É um documento formal; 2) É um bem móvel; 3) É um título apresentável; 4) É uma título executivo extrajudicial; 5) Representa uma obrigações quesíveis, cabendo ao credor dirigir-se ao devedor para receber a importância devida.
Livro
O conceito de título de crédito unanimemente aceito pelos doutrinadores é o que foi dado por Cesare Vivante. O grande jurista italiano definiu título de crédito como o documento necessário ao exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado.
Tal conceito foi adotado pelo Código Civil, que em seu art. 887 dispõe que “o título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. Apesar de ter-se baseado no famoso conceito de título de crédito dado por Vivante, o CC, na verdade, afastou-se um pouco dele ao usar a palavra “contido”, e não a palavra “mencionado”. Há quem critique essa opção do legislador, já que o título, realmente, não “contém” um crédito, mas apenas o “menciona”, em razão do princípio da autonomia, que detalharemos adiante.
Há outros conceitos conhecidos, como o de José Maria Whitaker, para quem título de crédito é o documento capaz de realizar imediatamente o valor que representa. Trata-se de conceito que ressalta, com propriedade, a função econômica dos títulos de crédito.
O conceito de Vivante é o ideal porque nos remete, por intermédio das expressões “necessário”, “literal” e “autônomo”, aos três princípios informadores do regime jurídico cambial: a) cartularidade; b) literalidade; c) autonomia.
Ademais, segundo a doutrina especializada, do conceito de títulos podemos extrair também suas principais características. Primeiro, os títulos de crédito possuem natureza essencialmente comercial, daí por que o direito cambiário é sub-ramo específico do direito comercial, desenvolvido com a finalidade clara de conferir aos títulos de crédito as prerrogativas necessárias ao cumprimento de sua função primordial: circulação de riqueza com segurança.
Pode-se dizer ainda que os títulos de crédito (i) são documentos formais, por precisarem observar os requisitos essenciais previstos na legislação cambiária, (ii) são considerados bens móveis (nesse sentido, aliás, dispõem os arts. 82 a 84 do Código Civil), sujeitando-se aos princípios que norteiam a circulação desses bens, como o que prescreve que a posse de boa-fé vale como propriedade, e (iii) são títulos de apresentação, por serem documentos necessários ao exercício dos direitos neles contidos. Outra característica dos títulos de crédito é que eles constituem títulos executivos extrajudiciais (art. 784 do Código de Processo Civil), por configurarem uma obrigação líquida e certa.
Destaque-se também que os títulos de crédito representam obrigações quesíveis (querable), cabendo ao credor dirigir-se ao devedor para receber a importância devida, e que a emissão do título e a sua entrega ao credor têm, em regra, natureza pro solvendo, isto é, não implica novação no que se refere à relação jurídica que deu origem ao título: a relação jurídica que originou o título, portanto, não irá se confundir com a relação cambiária representada pelo título emitido.
Por fim, cabe ressaltar que o título de crédito é título de resgate, porque sua emissão pressupõe futuro pagamento em dinheiro que extinguirá a relação cambiária, e é também um título de circulação, uma vez que sua principal função é, como já afirmamos reiteradas vezes, a circulabilidade do crédito.

Em que consiste o princípio da cartularidade?
Resumo
- A posse do título de crédito é condição para o exercício do direito nele incorporado.
Livro
Pelo princípio da cartularidade, a posse do título de crédito é condição para o exercício do direito nele incorporado. O objetivo desta regra principiológica é impedir que alguém se apresente como credor do título, depois de ter negociado o crédito com terceiro, cedendo-o.
Em síntese, o princípio da cartularidade nos permite afirmar que o direito de crédito mencionado na cártula não existe sem ela, não pode ser transmitido sem a sua tradição e não pode ser exigido sem a sua apresentação.
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Em obediência ao princípio da cartularidade, (i) a posse do título pelo devedor presume o pagamento do título, (ii) só é possível protestar o título apresentando-o, (iii) só é possível executar o título apresentando-o, não suprindo a sua ausência nem mesmo a apresentação de cópia autenticada.
Em que consiste o princípio da literalidade?
Resumo
- O título vale pelo que nele está escrito. Nem mais, nem menos.
- Uma quitação parcial, por exemplo, deve ser feita no próprio título, porque, caso contrário, poderá ser contestada. O mesmo ocorre, também, com o aval e com o endosso.
Livro
Quando se diz que o título de crédito é o documento necessário ao exercício do direito literal nele representado, faz-se referência expressa ao princípio da literalidade, segundo o qual o título de crédito vale pelo que nele está escrito. Nem mais, nem menos. Com efeito, “o direito decorrente do título é literal no sentido de que, quanto ao conteúdo, à extensão e às modalidades desse direito, é decisivo exclusivamente o que dele consta. Assim, só existe para o mundo cambiário o que está expresso no título”. Em outros termos, nas relações cambiais somente os atos que são devidamente lançados no próprio título produzem efeitos jurídicos perante o seu legítimo portador.
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Perceba-se a importância do princípio da literalidade para que os títulos de crédito cumpram de forma segura a sua função precípua de circulação do crédito: como a pessoa que recebe o título tem a certeza de que a partir de sua simples leitura ficará ciente de toda a extensão do crédito que está recebendo, sente-se segura a realizar a operação.
Assim, uma quitação parcial, por exemplo, deve ser feita no próprio título, porque, caso contrário, poderá ser contestada. O mesmo ocorre, também, com o aval e com o endosso. Um aval tem que ser feito no próprio título, sob pena de não produzir efeito de aval. O endosso, da mesma forma, tem de ser feito no próprio título, sob pena de não valer como endosso.
Se o aval é feito, eventualmente, num instrumento separado do título, não será válido como aval, porque não respeita o princípio da literalidade. Poderá valer, no máximo, como uma fiança, que é um instituto do direito civil assemelhado ao aval, porém com efeitos jurídicos diversos.
Em que consiste o princípio da autonomia?
Resumo
- Por esse princípio, entende-se que o título de crédito configura documento constitutivo de direito novo, autônomo, originário e completamente desvinculado da relação que lhe deu origem.
- O legítimo portador do título pode exercer seu direito de crédito sem depender das demais relações que o antecederam, estando completamente imune aos vícios ou defeitos que eventualmente as acometeram.
Livro
O terceiro e mais importante princípio relacionado aos títulos de crédito, considerado a pedra fundamental de todo o regime jurídico cambial, é o princípio da autonomia. Por esse princípio, entende-se que o título de crédito configura documento constitutivo de direito novo, autônomo, originário e completamente desvinculado da relação que lhe deu origem. Assim, as relações jurídicas representadas num determinado título de crédito são autônomas e independentes entre si, razão pela qual o vício que atinge uma delas, por exemplo, não contamina a(s) outra(s). Melhor dizendo: o legítimo portador do título pode exercer seu direito de crédito sem depender das demais relações que o antecederam, estando completamente imune aos vícios ou defeitos que eventualmente as acometeram.
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Em decorrência do princípio da autonomia, portanto, a pessoa que recebe um título de crédito numa negociação não precisa se preocupar em investigar a sua origem nem as relações que eventualmente o antecederam, uma vez que ainda que tais relações existam e estejam viciadas, elas não contaminam as relações futuras decorrentes da circulação desse mesmo título.
Em que consiste o princípio da abstração?
Resumo
- Subprincípio extraído do princípio da autonomia.
- Princípio da abstração. Quando o título circula, ele se desvincula da relação que lhe deu origem. Se não há circulação, há uma vinculação entre esta relação e o título dela originado
- Obs: não se deve confundir a abstração como subprincípio do regime jurídico cambial com a abstração ora analisada. Aquela, como visto, é um predicado de qualquer título de crédito, já que todos eles podem circular e, consequentemente, se desprender da relação que lhes deu origem. Esta significa tão somente um atributo que alguns títulos ostentam, o de não ter sua emissão submetida a causas preestabelecidas na legislação.
Livro
Decorrentes do princípio da autonomia, há dois outros importantes princípios – ou subprincípios, como preferem alguns autores, uma vez que não trazem nenhuma ideia nova em relação à autonomia, mas apenas uma outra forma de se encarar este princípio. Trata-se dos subprincípios da abstração e da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé.
Segundo o subprincípio da abstração, entende-se que quando o título circula, ele se desvincula da relação que lhe deu origem. Assim, no exemplo dado anteriormente, quando “B” endossou o título para “C”, fazendo-o circular, tal título se desvinculou da operação que lhe deu origem – a compra e venda do carro. A abstração significa, portanto, a completa desvinculação do título em relação à causa que originou sua emissão.
Veja-se que enquanto a relação cambial é travada entre os próprios sujeitos que participaram da relação que originou o título, existe uma vinculação entre esta relação e o título dela originado. No mesmo exemplo já mencionado, se “B” não circula o título para “C”, há uma vinculação entre o título emitido e a relação de compra e venda que acarretou sua emissão.
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Por fim, vale destacar que alguns autores confundem a abstração como subprincípio do regime jurídico cambial e a abstração que caracteriza os chamados títulos de crédito abstratos, que não têm a sua emissão condicionada a certas causas previstas em lei, o que ocorre apenas com os títulos causais.
COMENTÁRIOS EM OUTRO PONTO (diferenciação entre título causal e abstrato):
Nesse ponto, é preciso reforçar observação que já fizemos anteriormente: não se deve confundir a abstração como subprincípio do regime jurídico cambial com a abstração ora analisada. Aquela, como visto, é um predicado de qualquer título de crédito, já que todos eles podem circular e, consequentemente, se desprender da relação que lhes deu origem. Esta significa tão somente um atributo que alguns títulos ostentam, o de não ter sua emissão submetida a causas preestabelecidas na legislação.
No entanto, é preciso deixar claro que essa é uma opinião particular nossa, a qual, a despeito de ser compartilhada por alguns autores de renome, não é seguida, ao que nos parece, pela doutrina majoritária. Muitos autores, pois, tratam a abstração com um único sentido, razão pela qual defendem que os títulos causais, como a duplicata, não se desvinculariam da relação original, ainda que postos em circulação.
Ainda que prescrito o título, permanece a abstração da relação jurídica cambial nele representada?
Não custa lembrar, ainda, que essa abstração, decorrente do princípio da autonomia dos títulos de crédito, desaparecerá com a prescrição do título. A prescrição do título opera, pois, não apenas a perda da sua executividade, mas também a perda da sua cambiaridade, ou seja, o título perde as suas características intrínsecas de título de crédito, dentre elas a abstração. Por isso, caberá ao credor, na cobrança de título prescrito, demonstrar a origem da dívida, o locupletamento ilícito do devedor etc., conforme tem decidido o Superior Tribunal de Justiça:
Direito comercial e processual civil. Agravo no agravo de instrumento. Embargos à ação monitória. Nota promissória prescrita. Propositura de ação contra o avalista. Necessidade de se demonstrar o locupletamento. Precedentes. Prescrita a ação cambial, desaparece a abstração das relações jurídicas cambiais firmadas, devendo o beneficiário do título demonstrar, como causa de pedir na ação própria, o locupletamento ilícito, seja do emitente ou endossante, seja do avalista. Agravo não provido (STJ, AgRg no AG 549.924/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 05.04.2004, p. 260).
Em que consiste o princípio da inoponibilidade?
Resumo
- Subprincípio decorrente do princípio da autonomia.
- CC: “as exceções fundadas em relação de devedor com os portadores precedentes, somente poderão ser por ele opostas ao portador, se este, ao adquirir o título tiver agido de má-fé”.
Livro
O princípio da inoponibilidade das exceções pessoais (a expressão exceção é aqui utilizada em seu sentido técnico-processual, significando defesa) ao terceiro de boa-fé, por sua vez, nada mais é do que a manifestação processual do princípio da autonomia. Assim, ainda utilizando o exemplo acima mencionado, se “A”, procurado por “C”, não paga a dívida constante do título, “C” poderá executar “A”, e este, ao apresentar os embargos, não poderá opor o vício existente na relação originária, travada entre “A” e “B”. Com efeito, os vícios relativos à relação que originou o título são oponíveis apenas contra “B”, mas não contra “C”, terceiro de boa-fé que recebeu o título legitimamente.
[…]
A inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé está assegurada pelo art. 17 da Lei Uniforme, segundo o qual “as pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”. No mesmo sentido, dispõe o art. 916 do Código Civil que “as exceções fundadas em relação de devedor com os portadores precedentes, somente poderão ser por ele opostas ao portador, se este, ao adquirir o título tiver agido de má-fé”.
Um exemplo prático explica melhor. Digamos que “A” compra um carro de “B”, sendo esta compra instrumentalizada por meio da emissão de uma nota promissória no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). “B”, por sua vez, tem uma dívida perante “C” no valor aproximado de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Nesse caso, “B” poderá quitar a dívida que tem perante “C” utilizando-se da nota promissória dada por “A”, endossando–a (o endosso, como veremos a seguir, é o ato cambial próprio para transferir um título de crédito) para “C”, que se torna o titular dessa nota, podendo cobrar o seu respectivo valor de “A” na data do vencimento. Nessa hipótese, “A” poderá recusar-se ao pagamento do título alegando, por exemplo, eventual nulidade da venda que “B” lhe fez, venda essa que, como dito acima, originou a emissão da nota promissória? A resposta é negativa, e a justificativa está exatamente na aplicação do princípio da autonomia dos títulos de crédito. Ora, se as relações representadas naquele título são autônomas e independentes, os eventuais vícios que maculam a relação de “A” com “B” não atingem a relação de “B” com “C” nem a relação deste com “A”.
O que são título nominais? Equiparam-se a título nominativos?
Título nominal, por sua vez, é aquele que identifica expressamente o seu titular, ou seja, o credor. A transferência da titularidade do crédito, pois, não depende apenas da mera entrega do documento (cártula) a outra pessoa: é preciso, além disso, praticar um ato formal que opere a transferência da titularidade do crédito. Nos títulos nominais com cláusula “à ordem”, esse ato formal é o endosso, típico do regime jurídico cambial (art. 910 do Código Civil). Já nos títulos nominais com cláusula “não à ordem” esse ato formal é a cessão civil de crédito, a qual, como o próprio nome já indica, submete-se ao regime jurídico civil.
Por fim, os títulos nominativos, segundo o art. 921 do Código Civil, são aqueles emitidos em favor de pessoa determinada, cujo nome consta de registro específico mantido pelo emitente do título. Nesse caso, portanto, a transferência só se opera validamente por meio de termo no referido registro, o qual deve ser assinado pelo emitente e pelo adquirente do título (art. 922 do Código Civil).
Em regra, os títulos de crédito típicos, nominados ou próprios – letra de câmbio, nota promissória, cheque e duplicata, por exemplo – são títulos nominais à ordem, ou seja, devem ser emitidos com indicação expressa do beneficiário do crédito e podem circular via endosso. O único caso de título ao portador, quanto a estes títulos, é o do cheque até o limite de R$ 100,00 (cem reais), conforme veremos adiante.
Quanto à estrutura, como podem ser classificados os títulos de crédito?
Segundo esse critério classificatório, os títulos de crédito podem ser uma ordem de pagamento ou uma promessa de pagamento.
Os títulos que se estruturam como ordem de pagamento – letra de câmbio, cheque e duplicata – se caracterizam por estabelecerem três situações jurídicas distintas a partir da sua emissão: em primeiro lugar, tem-se a figura do sacador, que emite o título, ou seja, ordena o pagamento; em segundo lugar, tem-se a situação do sacado, contra quem o título é emitido, ou seja, trata-se da pessoa que recebe a ordem de pagamento; por fim, tem-se a figura do tomador (ou beneficiário), em favor de quem o título é emitido, isto é, pessoa a quem o sacado deve pagar, em obediência à ordem que lhe foi endereçada pelo sacador.
No cheque, por exemplo, que se estrutura como uma ordem de pagamento, como dito acima, podem-se ser facilmente identificadas as figuras do sacador (correntista que emite o cheque), do sacado (instituição financeira que cumprirá a ordem de pagamento que lhe foi dada) e o tomador (terceiro que recebe o cheque como forma de pagamento e que irá descontá-lo).
Por outro lado, nos títulos que se estruturam como promessa de pagamento – nota promissória – existem apenas duas situações jurídicas distintas: de um lado tem-se a figura do sacador ou promitente, que promete pagar determinada quantia; de outro, tem-se a situação do tomador, beneficiário da promessa que receberá o valor prometido.
O que é um título causal?
Título causal é aquele que somente pode ser emitido nas restritas hipóteses em que a lei autoriza a sua emissão. É o caso, por exemplo, da duplicata, que só pode ser emitida, como será visto com mais detalhes adiante, para documentar a realização de uma compra e venda mercantil (duplicata mercantil) ou um contrato de prestação de serviços (duplicata de serviços).
Cite as diferentes formas de classificar os títulos de crédito, dando exemplo em cada caso.

Como funciona a letra de câmbio? Quais são seus requisitos essenciais?
Resumo
- Estrutura-se como ordem de pagamento (sacador, sacado e tomador)
- Requisitos essenciais:
a) a expressão letra de câmbio (cláusula cambiária);
b) uma ordem incondicional para pagamento de quantia determinada;
c) o nome do sacado;
d) o nome do tomador;
e) a assinatura do sacador;
f) a data do saque;
g) o lugar do pagamento ou a menção de um lugar junto ao nome do sacado;
h) o lugar do saque ou a menção de um lugar junto ao nome do sacador. - A data de pagamento não é requisito essencial. Se não for prevista, considera-se a letra emitida à vista.
Livro
A letra de câmbio é um título de crédito que se estrutura como ordem de pagamento, razão pela qual, ao ser emitida, dá origem a três situações jurídicas distintas: a) a do sacador, que emite a ordem; b) a do sacado, a quem a ordem é destinada; c) a do tomador, que é o beneficiário da ordem.
Essas três situações jurídicas distintas a que nos referimos acima não precisam, necessariamente, estar ocupadas por três pessoas diferentes. De fato, a Lei Uniforme admite, em seu art. 3.º, que a letra seja sacada: (i) à ordem do próprio sacador; (ii) sobre o próprio sacador; ou (iii) por ordem e conta de terceiro.
No primeiro caso, o sacador e o tomador são a mesma pessoa, ou seja, a letra é emitida por alguém em seu próprio benefício. No segundo caso, o sacador e o sacado são a mesma pessoa, ou seja, a letra é emitida pelo sacado contra ele mesmo. Já no terceiro caso, ocorre a situação usual, em que as três situações jurídicas são ocupadas por sujeitos de direito também distintos, ou seja, uma pessoa (sacador) ordena que alguém (sacado) pague a outrem (tomador).
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Em tese, a letra de câmbio deve ser emitida preenchendo os seus requisitos essenciais, estabelecidos na legislação (arts. 1.º e 2.º da Lei Uniforme): a) a expressão letra de câmbio (cláusula cambiária); b) uma ordem incondicional para pagamento de quantia determinada; c) o nome do sacado; d) o nome do tomador; e) a assinatura do sacador; f) a data do saque; g) o lugar do pagamento ou a menção de um lugar junto ao nome do sacado; h) o lugar do saque ou a menção de um lugar junto ao nome do sacador.
Quanto ao segundo requisito, perceba-se que não se admite que o cumprimento da obrigação mencionada na letra fique sujeito à implementação de qualquer condição, suspensiva ou resolutiva. E mais: quanto ao valor da letra, deve ser mencionada a moeda de pagamento, e o art. 1.º, inciso II, do Decreto 2.044/1908 estabelece que as letras emitidas em território brasileiro devem ser pagas em moeda nacional. Admite-se também emissão de letra com indexação, desde que o índice seja conhecido e de ampla utilização na praxe comercial.
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Deve a letra ainda conter a assinatura do sacador, o qual, embora não seja o devedor principal desse título – posição ocupada pela sacado –, torna-se codevedor a partir da sua emissão, uma vez que ele, conforme determinação do art. 9.º da Lei Uniforme, garante a aceitação e o pagamento da letra. Em síntese: se o sacado não aceitar a letra ou não pagá-la, pode o tomador voltar-se contra o sacador.
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Veja-se, por fim, que dentre os requisitos essenciais acima analisados não se encontra a indicação da época do pagamento do título, cuja ausência, portanto, não invalida a letra, que nesse caso será considerada à vista (art. 2.º da Lei Uniforme).

Admite-se a emissão de letra de câmbio em branco?
A despeito de todos esses requisitos pela Lei Uniforme, destaque-se, todavia, que a jurisprudência admite a emissão da letra de câmbio – e de qualquer outro título de crédito – em branco ou incompleta. Esse entendimento, aliás, está consolidado no Enunciado 387 da súmula de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, segundo o qual “a cambial emitida ou aceita com omissões ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto”. No mesmo sentido, dispõe o Código Civil, em seu art. 891, que “o título de crédito, incompleto ao tempo da emissão, deve ser preenchido de conformidade com os ajustes realizados”.
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A identificação do sacado, devedor principal da letra, também é deveras relevante, e essa identificação deve ser feita com a menção ao número de sua carteira de identidade, do seu CPF, do seu título de eleitor ou de sua carteira profissional (CTPS). Já a exigência de identificação do tomador, por sua vez, denota a impossibilidade, pelo menos em tese – já que, como dito, o STF admite a emissão de título em branco ou incompleto –, de emissão de letra de câmbio ao portador.
Para que a letra de câmbio possa circular por endosso, é necessária a previsão da cláusula “à ordem”?
A identificação precisa do título, feita por meio da chamada cláusula cambiária, é de suma importância: primeiro, porque o título de crédito, a depender da sua espécie, submete-se a regimes jurídicos às vezes distintos; segundo, porque nos títulos de crédito próprios – nota promissória, letra de câmbio, duplicata e cheque – considera-se implícita a cláusula à ordem, que admite a sua circulação por meio de endosso (art. 11 da Lei Uniforme). Nada impede, todavia, que se mencione, expressamente, a cláusula não à ordem. É o que deixa claro o mesmo art. 11: “quando o sacador tiver inserido na letra as palavras ‘não a ordem’, ou uma expressão equivalente, a letra só é transmissível pela forma e com os efeitos de uma cessão ordinária de créditos”. Que fique bem claro, todavia, que para tanto é necessário a efetiva inserção da cláusula não à ordem. Caso contrário, a cláusula à ordem considera-se, como visto, implícita.
É obrigatório o aceite da letra de câmbio? Qual é a consequência da recusa do aceite?
Resumo
- O aceite, na letra de câmbio, é facultativo, porém irretratável.
- A recusa do aceite produzirá efeitos relevantes para o sacador e para o tomador, uma vez que ocorrerá o vencimento antecipado do título, podendo o tomador exigir do sacador – codevedor da letra, como visto – o seu pronto pagamento.
Livro
Emitida a letra de câmbio, ela será entregue ao tomador, o qual, por sua vez, a levará ao sacado, para que este a aceite (art. 25 da Lei Uniforme), o que deve ser feito no próprio título por meio da expressão “aceito” ou “aceitamos”, seguida da assinatura do sacado ou de procurador com poderes especiais para tanto (art. 11 do Decreto 2.044/1908). Se a letra foi emitida contra mais de um sacado, o tomador deve apresentá-la, inicialmente, ao primeiro nomeado no título, e depois sucessivamente.
Em princípio, perceba-se que o sacado não tem obrigação cambial alguma, uma vez que ele não é obrigado a cumprir a ordem de pagamento emitida pelo sacador contra a sua vontade. O aceite, portanto, é o ato pelo qual o sacado assume obrigação cambial e se torna o devedor principal da letra (aceitante).
[…]
O aceite, na letra de câmbio, é facultativo, porém irretratável. Como bem ensina Fábio Ulhoa Coelho, “na letra de câmbio, o aceite é sempre facultativo. Isso significa que, mesmo na hipótese de o sacado ser devedor do sacador ou tomador, ele não está obrigado a representar essa dívida por um título de crédito, isto é, por um documento de circulação cambial”.
Sendo o aceite uma faculdade do sacado, ele pode simplesmente recusá-lo, sem precisar dar qualquer justificativa para tanto. É preciso ressaltar, todavia, que a recusa do aceite produzirá efeitos relevantes para o sacador e para o tomador, uma vez que ocorrerá o vencimento antecipado do título, podendo o tomador exigir do sacador – codevedor da letra, como visto – o seu pronto pagamento.
Admite-se o aceite parcial de letra de câmbio?
Resumo
- Sim, admite-se o aceite parcial.
- Nesse caso, também ocorrerá o vencimento antecipado do título, podendo o tomador cobrar a totalidade do crédito contra o sacador.
- Duas modalidades de aceite parcial: a) aceite-limitativo; b) aceite-modificativo.
Livro
Cumpre esclarecer, ainda, que o sacado pode aceitar a letra parcialmente, situação em que haverá, consequentemente, uma recusa parcial. Nesse caso, também ocorrerá o vencimento antecipado do título, podendo o tomador cobrar a totalidade do crédito contra o sacador. A única diferença entre a recusa total e a recusa parcial, pois, relaciona-se à posição assumida pelo sacado. No primeiro caso, ele não assume obrigação cambial nenhuma. No segundo caso, porém, ele se vincula ao pagamento do título nos termos do seu aceite (art. 26 da Lei Uniforme).
Há duas espécies de aceite parcial: a) aceite-limitativo, através do qual o sacado aceita apenas parte do valor do título; b) aceite-modificativo, por meio do qual o sacado altera alguma condição de pagamento do título, como, por exemplo, o seu vencimento.
Em que consiste a cláusula não aceitável?
Resumo
- Na cláusula não aceitável, a letra não pode ser levada a aceite antes do vencimento.
- Há uma variante dessa cláusula em que a letra pode ser apresentada para aceite antes do seu vencimento, mas somente após uma certa data fixada pelo sacador.
Livro
Se o sacador proíbe, no próprio título, sua apresentação para aceite, tal letra de câmbio é considerada não aceitável. E a letra de câmbio não aceitável só deverá ser apresentada ao sacado no vencimento, para pagamento. Isto se faz para que não haja protesto por falta de aceite e, por consequência, não haja antecipação do vencimento em razão do protesto.
Existe ainda uma pequena variante da cláusula não aceitável, por meio da qual o sacador estipula uma data certa a partir da qual a letra pode ser levada a aceite. Antes dessa data, portanto, é vedada a apresentação do título para aceite do sacado. Veja-se a diferença: na cláusula não aceitável, a letra não pode ser levada a aceite antes do vencimento; nessa variante da cláusula, a letra pode ser apresentada para aceite antes do seu vencimento, mas somente após uma certa data fixada pelo sacador.
INTERNET:
Quando saca a letra de câmbio, Leopoldo pode começar a ter medo de pagar essa letra de câmbio que ele resolveu criar. Significa que ele poderá antever a recusa de Arthur e ele não poderá pagar caso haja vencimento antecipado do título. Para que ele não seja pego de surpresa, ele saca aquela letra de câmbio para Diogo com a cláusula “não aceitável”. Significa que ele não poderá apresentar a letra de câmbio ao sacado para que este apresente o aceite, e que só se poderá apresentá-la no dia 17/4, que é o dia do vencimento. Formalizando: “constitui-se de cláusula inserida no título pelo sacador proibindo o tomador de apresentar o título ao sacado antes do seu vencimento, evitando-se assim que o vencimento antecipado do título na hipótese de recusa do aceite.”
Quando vence letra a certo termo da vista? E a letra à vista?
Resumo
- A letra à vista, por sua vez, é aquela que tem seu vencimento no dia da apresentação do título ao sacado.
- Já a letra a certo termo da vista é a que vence após um determinado prazo, estipulado pelo sacador quando de sua emissão, que começa a correr a partir da vista (aceite) do título
Livro
Emitida a letra e realizado o aceite pelo sacado, o título se torna exigível a partir do seu vencimento, podendo-se distinguir, quanto a esse fato, quatro espécies de letras de câmbio: a) letra com dia certo; b) letra à vista; c) letra a certo termo da vista; e d) letra a certo termo da data.
A letra com dia certo é a que vence em data preestabelecida pelo sacador, logicamente posterior à data do saque. Assim, no momento da emissão é fixada uma data certa, mencionada no título, em que a letra irá vencer. A letra à vista, por sua vez, é aquela que tem seu vencimento no dia da apresentação do título ao sacado. Não há a prefixação de uma data específica, portanto. Já a letra a certo termo da vista é a que vence após um determinado prazo, estipulado pelo sacador quando de sua emissão, que começa a correr a partir da vista (aceite) do título. Pode-se prever, pois, que a letra vence dois meses após o aceite. Por fim, a letra a certo termo da data também vence após um determinado prazo estipulado pelo sacador, mas que começa a correr não a partir do aceite, mas a partir da própria emissão (saque) do título.
Quais são os requisitos da nota promissória?
Resumo
Requisitos:
a) a expressão nota promissória (cláusula cambiária);
b) uma promessa incondicional de pagamento de quantia determinada;
c) o nome do tomador;
d) a data do saque;
e) a assinatura do subscritor;
f) o lugar do saque ou a menção de um lugar junto ao nome do subscritor.
- A ausência de menção à época do pagamento faz com que a nota seja considerada à vista.
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Já destacamos, quando do estudo das classificações dos títulos de crédito, que a nota promissória se estrutura como uma promessa de pagamento, razão pela qual sua emissão dá origem a duas situações jurídicas distintas: a do sacador ou promitente (chamado na Lei Uniforme de subscritor), que emite a nota e promete pagar determinada quantia a alguém; e a do tomador, em favor de quem a nota é emitida e que receberá a importância prometida.
[…]
Da mesma forma que ocorre com a letra de câmbio, a nota promissória deve atender aos requisitos essenciais previstos em lei para que valha como título de crédito. São eles (art. 75 da lei Uniforme): a) a expressão nota promissória (cláusula cambiária); b) uma promessa incondicional de pagamento de quantia determinada; c) o nome do tomador; d) a data do saque; e) a assinatura do subscritor; f) o lugar do saque ou a menção de um lugar junto ao nome do subscritor.
Aproveitando as observações que já fizemos quando do estudo da letra de câmbio, pode-se dizer que: (i) a nota pode ser emitida em branco ou incompleta (Súmula 387 do STF); (ii) a nota promissória, por ser título de crédito, possui implícita a cláusula à ordem, podendo vir expressa, todavia, a cláusula não à ordem; (iii) a identificação do devedor principal – que na nota é o subscritor – deve ser feita com a menção ao número de sua carteira de identidade, do seu CPF, do seu título de eleitor ou de sua carteira profissional (CTPS); (iv) a exigência de identificação do tomador impede, pelo menos em tese, a emissão de nota promissória ao portador; (v) a promessa de pagamento deve ser incondicional, não se admitindo a sujeição a qualquer condição suspensiva ou resolutiva; e (vi) a ausência de menção à época do pagamento faz com que a nota seja considerada à vista.

A nota promissória está sujeita à aceite?
Resumo
- Embora as regras de aceite não sejam aplicáveis à nota promissória, a Lei Uniforme admite a emissão de nota promissória a certo termo da vista, caso em que o título deverá ser levado ao visto do subscritor no prazo de um ano a contar do saque da nota (art. 78).
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Em primeiro lugar, a letra de câmbio é uma ordem de pagamento, enquanto a nota promissória é uma promessa de pagamento. Sendo assim, são inaplicáveis às notas promissórias as regras sobre aceite (cláusula não aceitável, prazo de respiro, vencimento antecipado por recusa do aceite, entre outras). Por essa razão, pode-se pensar que a nota promissória poderia ser sacada com dia certo, à vista e a certo termo da data, mas não poderia ser sacada a certo termo da vista, justamente por não depender de aceite.
Ocorre que a própria Lei Uniforme admite, em seu art. 78, a emissão de nota promissória a certo termo da vista, caso em que o título deverá ser levado ao visto do subscritor no prazo de um ano a contar do saque da nota. Após o visto do subscritor, começará então a correr um certo prazo, já estipulado desde a emissão, após o qual considera-se vencido o título.
Qual é o prazo prescricional da nota promissória?
Resumo
- O prazo de prescrição da nota em relação ao seu subscritor é igual ao da letra em relação ao aceitante (três anos, contados do vencimento, conforme disposto no art. 70 da Lei Uniforme).
- Para ação monitória, o prazo é quinquenal, contado do vencimento.
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Registre-se ainda que na letra de câmbio o devedor principal é o sacado, enquanto na nota promissória o devedor principal é o próprio sacador (ou subscritor). Portanto, a Lei Uniforme determina, também no seu art. 78, que “o subscritor de uma nota promissória é responsável da mesma forma que o aceitante de uma letra”. As regras aplicáveis ao aceitante da letra, pois, devem ser aplicadas ao subscritor da nota. Exemplificando, pode-se dizer que o prazo de prescrição da nota em relação ao seu subscritor é igual ao da letra em relação ao aceitante (três anos, contados do vencimento, conforme disposto no art. 70 da Lei Uniforme).
Por fim, cumpre mencionar que o prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de nota promissória sem força executiva é quinquenal, a contar do dia seguinte ao vencimento do título (Súmula 504 do STJ).
OBS:
Na letra a certo termo da vista, o tomador deverá apresentá-la para aceite no prazo estabelecido no título ou, caso não tenha sido estabelecido prazo algum, dentro de<strong> um ano</strong>, contado da data de sua emissão (art. 23 da Lei Uniforme).
Na letra à vista, por sua vez, o tomador não precisa necessariamente levá-la para aceite do sacado, podendo optar por apresentá-la diretamente para pagamento, o que deve ser feito em <strong>um ano</strong> a partir da emissão do título.
Se a nota promissória estiver vinculada a um contrato, ela pode circular? E pode ser executada como título executivos extrajudicial?
Resumo
- Quando a nota promissória é emitida com vinculação a um determinado contrato, isso deve estar previsto no título.
- Com isso, há uma relativização da abstração do título, já que ao terceiro, conhecedor do negócio, podem ser oposta as exceções realtivas ao contrato. Contudo, o título não perde sua executividade.
- Só há perda de executividade se o contrato a que está ligada descaracterizar a sua liquidez. É o que ocorre com o contrato de abertura de crédito (Súmula 258 do STJ).
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Inicialmente, cumpre destacar que quando a nota promissória for emitida com vinculação a um determinado contrato – não apenas contratos bancários, o que é mais comum, mas qualquer contrato –, tal fato deve constar expressamente do título, uma vez que este pode circular, e o terceiro que recebê-lo por endosso deve ter conhecimento da relação contratual à qual o título está atrelado.
Assim, constando expressamente da nota promissória a vinculação a determinado contrato, de certa forma estará descaracterizada a abstração/autonomia do título, já que o terceiro que o recebeu via endosso tem conhecimento da relação que lhe deu origem, e, portanto, está consciente de que contra ele poderão ser opostas exceções ligadas ao referido contrato.
Atente-se, entretanto, que a nota promissória perde apenas, e em certa medida, a sua abstração (subprincípio ligado à autonomia), permitindo-se que o devedor alegue contra um eventual terceiro endossatário, conforme visto acima, as exceções fundadas na relação contratual que está atrelada ao título. Todavia, a nota promissória conserva, em princípio, a sua executividade, salvo se o contrato a que está ligada descaracterizar a sua liquidez. Nesse sentido:
1 – Consoante entendimento desta Corte, o fato de achar-se a nota promissória vinculada a contrato <strong>não a desnatura como título executivo extrajudicial</strong>. 2 – Recurso provido para determinar o regular prosseguimento da execução (STJ, REsp 259.819-PR, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 05.02.2007, p. 237).
1. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a nota promissória vinculada a um contrato de abertura de crédito perde a sua autonomia ante a iliquidez do título que a originou, acarretando, portanto, na nulidade da execução por ela embasada. Súmula 258/STJ. 2. Entretanto, a vinculação de uma nota promissória a um contrato retira a autonomia de título cambial, mas não, necessariamente, a sua executoriedade. <strong>Assim, quando a relação jurídica subjacente estiver consubstanciada em contrato que espelhe uma dívida líquida, como no caso, não há empecilho ao prosseguimento da execução. </strong>Diversamente, se estiver amparada em contrato que não espelhe dívida líquida, como se verifica do contrato de abertura de crédito, não será possível a execução. Dessa forma, este Tribunal tem admitido a execução de nota promissória vinculada a contrato de mútuo que contenha valor determinado, por se entender que o contrato traduz a existência de dívida líquida e certa. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido (AgRg nos EDcl no REsp 1.367.833/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 16.02.2016, DJe 19.02.2016).
A questão merece explicação mais detalhada. A nota promissória vinculada a um contrato específico, com expressa menção no título a este fato, tem a sua abstração e autonomia, pode-se dizer, relativizada. Isso se dá porque o título passa a ter uma ligação intrínseca com o contrato que o originou, podendo-se então aplicar, grosso modo, a máxima de que o acessório (a nota) segue o principal (o contrato). Portanto, se o contrato a que está ligada a nota promissória não descaracterizar a sua liquidez, ela continuará ostentando a característica de título executivo extrajudicial, nos termos do art. 784 do Código de Processo Civil, e poderá fundamentar ação executiva contra o devedor.
É por isso que o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o simples fato de a nota promissória estar ligada a um contrato de mútuo não a descaracteriza como título executivo, isto é, ela não perde a sua executividade. Isso ocorre porque esse tipo de contrato bancário não desfigura a liquidez da nota promissória. Assim, “a nota promissória, ainda que vinculada a contrato de mútuo bancário, não perde a sua executoriedade. Precedentes do STJ” (AgRg no REsp 777.912/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 28.11.2005, p. 289).
Em contrapartida, a situação é totalmente diferente quando a nota promissória está atrelada a contrato de abertura de crédito rotativo. É que esse contrato, segundo jurisprudência consolidada há algum tempo pelo STJ, é ilíquido, tornando o título a ele atrelado também título ilíquido. Recentemente, entretanto, surgiram alguns precedentes do STJ favoráveis aos bancos, quando se trata de contrato de abertura de crédito fixo:
Processo civil. Contrato bancário. Mútuo. Originário de débito em conta-corrente. Título executivo. O contrato de abertura de crédito fixo, é título executivo, nos termos do Art. 585, II, do CPC, ainda que oriundo de débito em conta-corrente (AgRg no REsp 623.809/MT).
Com efeito, os bancos tentaram, durante muito tempo, fazer com que os contratos de abertura de crédito fossem reconhecidos como títulos executivos extrajudiciais, tentativa que foi repelida pela jurisprudência, ao argumento de que tais contratos eram ilíquidos, já que seu valor era apurado unilateral e arbitrariamente pelo banco exequente. Os bancos tentaram, então, uma saída alternativa: executar os contratos de abertura de crédito acompanhados de extratos pormenorizados do débito, alegando que estes confeririam liquidez ao contrato exequendo. Mais uma vez a jurisprudência repeliu a tentativa dos bancos, editando a Súmula 233: “o contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo”. O máximo que o STJ permite, nesse caso, é a propositura de ação monitória (Súmula 247: “o contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil ao ajuizamento da ação monitória”).
A saída encontrada pelos bancos, então, foi vincular aos contratos de abertura de crédito rotativo um título executivo que pudesse, futuramente, embasar uma eventual execução contra o cliente, e esse título foi justamente a nota promissória. Ocorre que mais uma vez o Superior Tribunal de Justiça frustrou a tentativa dos bancos de garantir mais o crédito que fornece aos seus clientes, firmando entendimento de que “a nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou” (Súmula 258).
Enfim, a grande solução para os bancos acabou vindo com a edição da Lei 10.931/2004, que criou a cédula de crédito bancário, título de crédito específico destinado a operacionalizar contratos bancários, que estudaremos adiante.
Em que consiste a cláusula-mandato?
Outro entendimento pretoriano acerca das notas promissórias ligadas a contratos bancários está consolidado no Enunciado 60 da Súmula de jurisprudência dominante do STJ, segundo o qual “é nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste”.
Tal enunciado sumular se refere à chamada cláusula-mandato, a qual era comumente colocada em contratos bancários, constituindo a própria instituição financeira, ou às vezes uma empresa coligada a ela, como procuradora do cliente contratante. Assim, em caso de inadimplemento da obrigação contratual, o banco ou a sua coligada, conforme o caso, emitia um título de crédito (nota promissória) em seu próprio favor, no valor da dívida, na condição de mandatária do cliente devedor. Com isso, estaria sanado o problema da eventual iliquidez (vide jurisprudência transcrita no tópico acima e Súmula 258 do STJ).
O entendimento consolidado pelo STJ na sua Súmula 60, transcrita acima, foi firmado, sobretudo, com base na interpretação do art. 51, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que “imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor”.

