ABUSO SEXUAL CONTRA ADOLESCENTE Flashcards
(10 cards)
Como entender o fenômeno da “coisificação do outro” quando o abusador toma
a vítima no ato violento?
O fenômeno da “objetificação do outro” quando um agressor toma a vítima em um ato violento, particularmente no contexto de violência sexual, pode ser compreendido por meio de diversas perspectivas psicanalíticas apresentadas nas fontes.
Em primeiro lugar, um aspecto central deste fenómeno é a tentativa do agressor de exercer domínio sobre o outro.. O ato violento reduz a vítima a um objeto a ser controlado e usado para a satisfação do agressor ou para a realização de seus desejos. Isso envolve uma anulação da vontade e da subjetividade da vítima , obrigando-a a um estado de submissão e passividade.. Por exemplo, em casos de abuso sexual, a vítima torna-se incapaz de se defender ou reagir, criando “condições ideais para a perpetuação direta do abuso”.. A própria ideia de que a vítima adolescente pode ser suspeita de ter “seduzido o agressor” ou mesmo “apreciado o jogo sexual”destaca essa objetificação, pois descarta sua experiência subjetiva de violação e as enquadra como um meio para o desejo do agressor.
Em segundo lugar, o ato pode ser visto como algo que reduz a vítima a um estado de desamparo infantil . A “ameaça de estupro”, por exemplo, pode despertar na vítima uma “fantasia de violação” que evoca uma “satisfação fundamental” de ser um “bebê indefeso nas mãos de adultos que cuidam dele”.. Isso sugere que o ato do agressor efetivamente reverte a vítima a um estado primordial de dependência, tratando-a como um objeto sem agência ou vontade, semelhante a uma criança cujas necessidades ficam inteiramente a critério do adulto.
Além disso, o conceito de “objetificação” se conecta ao tema mais amplo da ausência de reconhecimento ou interlocução da vítima. Embora não descrevam diretamente o ato do agressor, as fontes sobre automutilação destacam a “experiência de indiferença” quando um cuidador primário não reconhece a singularidade e a existência da criança.. Isso leva a uma “matriz de indiferença consigo mesmo e com o outro”. Em um ato violento, a objetificação da vítima pelo agressor é uma forma profunda de não reconhecimento, negando a realidade subjetiva da vítima e reduzindo-a a algo que existe apenas para uso do agressor, criando assim uma “dimensão cruel da sensação de não existência do eu para o outro”.. Quando a dor da vítima não pode ser expressa em palavras ou reconhecida por um “Outro”, isso geralmente leva a um “movimento de descarga no corpo”., enfatizando ainda mais como o corpo se torna um local para ação direta ou expressão quando a elaboração ou o reconhecimento psíquico são negados.
Em suma, a “coisificação do outro” em atos violentos implica reduzir a vítima a uma entidade desprovida de vontade pessoal ou subjetividade, submetendo-a ao domínio completo do agressor e negando seu reconhecimento e agência inerentes.
Fantasia da violação + Satisfação fundamental + coisificação do outro
“Reduz a vítima a um estado de desamparo infantil”
Isso significa que, ao sofrer a ameaça ou a violência sexual, a pessoa pode se sentir completamente impotente, como uma criança indefesa diante de um adulto poderoso.
Ela perde a sensação de controle, escolha e proteção.
Sente-se frágil, vulnerável, como se não pudesse se defender — assim como um bebê que depende totalmente do adulto para sobreviver.
Esse estado é chamado de regressão psíquica: a pessoa volta, mesmo que de forma inconsciente, a um estágio muito primitivo do desenvolvimento emocional.
🔵 “Fantasia de violação” e “satisfação fundamental”
Essa parte é mais complexa e vem de uma leitura psicanalítica. Vamos por partes:
A “fantasia de violação” não significa que a vítima quer ser violentada, mas sim que, em situações de extremo medo e impotência, o psiquismo recorre a imagens e fantasias inconscientes arcaicas, muitas vezes ligadas à infância.
A ideia de “satisfação fundamental” vem de experiências muito precoces da vida, como quando o bebê é totalmente dependente, mas sente que será cuidado, alimentado, protegido.
Então, paradoxalmente, a mente pode misturar a sensação de ser dominado (como na ameaça de estupro) com fantasias antigas de dependência e cuidado. Essa mistura acontece de forma inconsciente e pode gerar muita confusão emocional e sofrimento.
⚠️ Importante: isso não significa que a violência é desejada ou aceita. Pelo contrário — essa regressão mostra como o trauma pode desorganizar o funcionamento psíquico, trazendo à tona memórias e sensações muito antigas que a mente usa para tentar “lidar” com algo que, na realidade, é insuportável.
🟢 “Objeto sem agência ou vontade”
Aqui o foco está no modo como o agressor trata a vítima:
Ele nega sua humanidade, como se ela fosse um objeto a ser usado.
A vítima deixa de ser alguém com desejos, limites e dignidade, e passa a ser tratada como algo que está ali só para satisfazer o poder do outro.
Isso aprofunda a sensação de despersonalização: a pessoa pode se sentir como se nem existisse mais como sujeito.
Em resumo:
Esse trecho nos mostra que a violência sexual pode causar:
Uma regressão emocional profunda, fazendo a vítima se sentir como um bebê impotente.
Um colapso na sensação de autonomia e dignidade.
Uma confusão psíquica intensa, na qual o medo extremo pode ativar memórias arcaicas de quando se era cuidado — mesmo que o contexto atual seja de abuso.
Quais são as razões que levam a uma relativa dificuldade em reconhecer o(a)
adolescente na condição de vítima de abuso sexual?
Existem várias razões complexas que contribuem para a relativa dificuldade em reconhecer adolescentes como vítimas de abuso sexual , conforme discutido nas fontes:
*
Percepção social de adolescentes vs. crianças : Ao contrário das crianças, os adolescentes são frequentemente percebidos como menos inocentes. Isso imediatamente levanta suspeitas sobre seu papel no abuso.
*
Suspeita de Sedução e Prazer : Existe uma tendência social problemática de suspeitar que o adolescente pode ter “seduzido o agressor” ou mesmo “gostado do jogo sexual”. Essa percepção enfraquece fundamentalmente seu status de vítima.
*
Falta de Credibilidade e “Violência do Silêncio” : Como consequência dessas suspeitas, quando adolescentes tentam denunciar abusos sexuais, seus relatos provavelmente enfrentarão a descrença da sociedade, do judiciário e até mesmo de suas próprias famílias.. Essa falta de crença efetivamente força o adolescente a retornar a uma “violência do silêncio”.
*
Dificuldade em provar atos não consensuais : nos casos em que não há marcas físicas de violência no corpo , provar que a relação sexual não foi consensual torna-se extremamente difícil.
*
Pressões familiares e medo de retaliação : os adolescentes podem enfrentar imensa pressão e medo de serem ressentidos pelos irmãos se a denúncia de um pai agressor levar à perda da renda familiar, o que pode levá-los a serem culpados pela desorganização da família.. Essa pressão pode levá-los a assumir falsamente a responsabilidade pela sedução em uma “tentativa vã de restabelecer a coesão familiar aparente”, o que perpetua o “não dito” e intensifica as fantasias de autoculpa..
*
Envolvimento de fantasias inconscientes : O sofrimento psicológico da violência sexual não é causado apenas pelo ato violento em si, mas também pelo “complexo entrelaçamento deste com fantasias sexuais inconscientes” e pela autoculpa inconsciente por essas fantasias.. Para as meninas, as fantasias edipianas intensas, especialmente quando a sexualidade genital emerge, podem levar à submissão alimentada pela culpa e à manutenção do segredo, acreditando que são “culpadas por terem, um dia, fantasiado e desejado essa relação sexual”..
*
A “fantasia de violação” e o desamparo infantil : a ameaça de estupro pode despertar uma “fantasia de violação” na vítima, que pode evocar uma “satisfação fundamental” de ser um “bebê indefeso nas mãos de adultos que cuidam dele”.. Essa experiência primordial de dependência pode levar a formas de submissão que são “totalmente incompreensíveis à luz da razão”..
*
Impacto da descrença de adultos-chave : O trauma pode estar profundamente enraizado quando um adulto, um “terceiro”, não acredita na narrativa da vítima. Essa descrença pode levar a uma “renúncia ou recusa” psíquica, onde uma parte da mente acredita que o evento aconteceu, mas outra parte o nega..
*
Comunicação através do corpo quando as palavras falham : De forma mais ampla, e como explorado em discussões anteriores, os adolescentes muitas vezes têm dificuldade em verbalizar uma dor psíquica intensa, especialmente na ausência de um “Outro” receptivo.. Quando as palavras falham ou não são ouvidas, o corpo pode se tornar o principal local de expressão do sofrimento. Essa dificuldade geral em encontrar um interlocutor para sua angústia significa que mesmo a dor psicológica mais grave pode não ser articulada verbalmente, tornando mais difícil para outros
Por que o(a) adolescente, que sofre abuso sexual, está submetido(a) à
“violência do silêncio, dificultando, inclusive, a denúncia de tal violência
sofrida?
🟣 O que é a “violência do silêncio”?
É a imposição explícita ou implícita de que o adolescente cale o que viveu, por medo, vergonha, ameaças, ou porque percebe que ninguém quer ou consegue escutar.
Essa violência não é física, mas psíquica, simbólica e relacional, e pode ser tão ou mais traumática que o próprio abuso.
🔹 Por que isso acontece?
1. Medo de não ser acreditado(a)
Muitos adolescentes tentam falar — mas quando veem que o adulto duvida, desconversa ou reage com raiva, aprendem que é “melhor calar”.
Isso é agravado quando o agressor é alguém próximo e respeitado (pai, tio, padrasto, professor).
- Culpa e vergonha internalizadas
Sentimentos como:
“Será que fui eu que provoquei?”
“Meu corpo reagiu, então talvez eu tenha gostado.”
“Se eu contar, minha família vai desmoronar.”
Esses pensamentos fazem o adolescente se calar como forma de proteção psíquica, mesmo que isso lhe cause sofrimento.
- Ameaças diretas do agressor
O abusador muitas vezes diz coisas como:
“Se você contar, ninguém vai acreditar.”
“Vou fazer algo com sua mãe.”
Essas ameaças imobilizam emocionalmente a vítima e fortalecem o silêncio.
- Ambiente familiar ou institucional repressivo
Quando a família ou escola é rígida, moralista ou negligente, o adolescente aprende que certos assuntos “não se falam”, especialmente os ligados ao sexo.
Isso gera um sentimento de solidão e abandono emocional. - Desconhecimento do que é abuso
Adolescentes, principalmente os mais jovens, às vezes nem sabem que o que aconteceu foi violência. Isso dificulta dar nome ao que sentem, o que inviabiliza a denúncia.
🔴 O que esse silêncio provoca?
Reforça a dor psíquica da vítima.
Aumenta a culpa e o isolamento.
Impede a denúncia e, com isso, a responsabilização do agressor.
Pode levar a sintomas graves: depressão, automutilação, uso de drogas, distúrbios alimentares, dissociação, etc.
✅ Em resumo:
A “violência do silêncio” é uma segunda violência, sofrida quando o adolescente:
É impedido ou não consegue falar sobre o abuso;
Não encontra acolhimento, escuta ou proteção;
E se vê sozinho, preso ao trauma, sem saída simbólica ou concreta.
Como entender o papel da fantasia da violação e o da intensidade das
fantasias edipianas na submissão do(a) adolescente à situação de violência e,
consequentemente, à exigência do abusador em mantê-la secreta?
Em primeiro lugar, a “fantasia de violação” desempenha um papel significativo na submissão do adolescente. A ameaça de estupro pode despertar uma “fantasia de violação” na vítima, o que é descrito como comum, especialmente na adolescência.. Essa fantasia é poderosa o suficiente para produzir uma excitação fisiológica. Ser completamente dominado por alguém também pode evocar uma “satisfação fundamental” comum a todos os indivíduos: a experiência de ser um bebê indefeso nas mãos de adultos que cuidam dele. Essa experiência primordial de dependência persiste na memória como uma promessa de prazer ilimitado (gozo ilimitado) e constitui a base para a constituição do desejo. Em certas situações, a busca pela realização do desejo e a satisfação das necessidades fisiológicas podem levar a formas de submissão que são “totalmente incompreensíveis à luz da razão”.
🟣 O que é “gozo ilimitado”?
O termo gozo (em francês, jouissance, usado por Lacan) não é sinônimo de prazer comum.
Ele se refere a uma forma de prazer extrema, que ultrapassa os limites do corpo e da razão — um prazer que pode ser doloroso, confuso, até destrutivo.
👉 E o que seria o “gozo ilimitado” nesse contexto?
É a fantasia inconsciente de um prazer total, absoluto e pleno, que remonta a um estado primordial de fusão com a figura materna ou cuidadora — geralmente o bebê com a mãe.
🔵 Como isso se forma?
Nos primeiros meses de vida, o bebê vive uma relação de total dependência:
Ele chora, e alguém vem alimentá-lo, troca sua fralda, acolhe, esquenta, embala.
Para o bebê, esse cuidado parece quase mágico — como se seus desejos fossem imediatamente atendidos.
Essa vivência gera uma memória psíquica arcaica de que existe um lugar onde tudo que é desejado pode ser plenamente satisfeito — sem frustração, sem falta.
Essa memória vai formar a base do desejo humano, mas esse desejo nunca será plenamente realizado na vida adulta, porque o mundo real tem limites, regras, faltas, frustrações.
🟠 E como isso se relaciona à “submissão incompreensível à razão”?
Em certas situações — especialmente em experiências traumáticas, relacionamentos abusivos ou compulsões — o sujeito pode regredir psiquicamente a esse desejo inconsciente de ser totalmente cuidado, dominado ou satisfeito, como quando era um bebê.
Isso pode levar a comportamentos de:
Submissão extrema, onde a pessoa se entrega totalmente ao outro (mesmo em relações abusivas);
Busca de prazer que ignora o sofrimento (como em relações sexuais violentas, automutilação com alívio, vícios, etc.);
Confusão entre dor e prazer, entre dependência e desejo, entre agressão e amor.
⚠️ Tudo isso acontece fora do controle racional da pessoa. Por isso se diz que essas formas de submissão são “incompreensíveis à luz da razão” — porque são movidas por forças inconscientes muito profundas.
✅ Em resumo:
O gozo ilimitado é uma fantasia inconsciente de um prazer absoluto, vivido simbolicamente na relação bebê-cuidador.
Essa fantasia persiste na vida adulta e pode reaparecer de forma confusa ou destrutiva, especialmente em situações de trauma, submissão ou relações abusivas.
Nesses casos, a pessoa não age com base na lógica ou razão, mas sob o efeito inconsciente dessa memória de fusão e satisfação total, mesmo que isso a leve a se colocar em risco.
Como entender o papel da fantasia da violação e o da intensidade das
fantasias edipianas na submissão do(a) adolescente à situação de violência e,
consequentemente, à exigência do abusador em mantê-la secreta?
Em segundo lugar, a intensidade das fantasias edipianas , particularmente nas adolescentes, contribui para a sua sujeição e para a manutenção do segredo.. À medida que a sexualidade genital emerge durante a puberdade, essas fantasias tornam-se mais intensas. Uma adolescente pode sentir-se culpada por ter, em algum momento, fantasiado ou desejado uma relação sexual que, com a “turbulência causada pela sexualidade genital”, agora se concretizou e trouxe consequências desastrosas para ela.. Essa culpa inconsciente alimenta sua submissão à situação violenta e seu consentimento à exigência do agressor de manter o abuso em segredo..
O sofrimento psicológico resultante da violência sexual não se deve apenas ao ato violento em si, mas também ao “complexo entrelaçamento deste com fantasias sexuais inconscientes” e à autoculpa inconsciente por essas fantasias.. Essa dinâmica interna, aliada a pressões externas como o descrédito da sociedade, do judiciário e até mesmo das próprias famílias caso tentem denunciar o abuso, efetivamente força o adolescente a uma “violência do silêncio”.. Em casos de incesto, especialmente sem marcas físicas de violência, é difícil provar atos não consensuais. Além disso, o medo de ser ressentido pelos irmãos se a denúncia de um pai agressor levar à perda da renda familiar pode pressionar os adolescentes a assumir falsamente a responsabilidade pela sedução em uma “tentativa vã de restabelecer a aparente coesão familiar”.. Isso perpetua o “não dito” e intensifica as fantasias de autoculpa, complicando ainda mais sua capacidade de falar..
O “segredo” do abuso, particularmente em contextos intrafamiliares, permanece muitas vezes devido à “ausência do tabu do incesto” nestas famílias. Essa “ação de recusa”, o “não dito” no seio da família, pode interferir na capacidade da vítima de reconhecer suas próprias percepções e sensações corporais como reais, dificultando assim o processo de elaboração psíquica e possibilitando o “funcionamento evacuativo da compulsão à repetição”.. O profundo impacto da descrença de um adulto de confiança também cimenta o trauma, levando a uma “renúncia ou recusa” psíquica, onde uma parte da mente acredita que o evento aconteceu, mas outra parte o nega..
Em resumo, a submissão do adolescente à violência sexual e o consequente sigilo estão profundamente enraizados em uma complexa interação de fantasias inconscientes, particularmente a “fantasia de violação” primordial e a culpa associada a intensos desejos edipianos. Esses conflitos internos são exacerbados por fatores externos, como a descrença social e as pressões familiares, que, coletivamente, criam uma “violência do silêncio” que dificulta profundamente a capacidade do adolescente de revelar o abuso.
Quais são os graves efeitos da violência sexual sofrida na infância, em termos
de sexualizar todos os relacionamentos, que se propagam nas fases
subsequentes da vida?
*
Tendência a sexualizar todos os relacionamentos : Indivíduos que foram abusados na infância apresentam uma tendência a sexualizar todos os seus relacionamentos. Isso significa que temas ou dinâmicas sexuais podem permear suas interações, mesmo em contextos não sexuais.
*
Padrões autodestrutivos e promiscuidade : essa tendência pode levar a um padrão autodestrutivo de promiscuidade , especialmente em meninas que foram violadas. Esses indivíduos podem se envolver em comportamentos sexuais que são arriscados ou prejudiciais a eles mesmos.
*
Envolvimento em relacionamentos abusivos : as vítimas geralmente estabelecem relacionamentos tão abusivos quanto aqueles que vivenciaram , envolvendo-se com parceiros potencialmente violentos ou abusivos.. Isso sugere uma repetição da dinâmica traumática.
*
Mães Coniventes ou Cegas : Em alguns casos, as meninas violadas podem tornar-se mães cúmplices ou incapazes de ver, apesar de indícios claros, a violência a que os seus próprios filhos estão a ser sujeitos.. Isso destaca um ciclo perturbador em que o trauma afeta sua capacidade de proteger a próxima geração.
*
Continuidade Intergeracional através da Identificação com o Agressor : Esta propagação do abuso está ligada ao mecanismo de identificação com o agressor. Este conceito, embora não explicitamente cunhado por Freud, envolve a inversão de papéis da vítima e a imitação inconsciente do agressor.. No contexto do abuso sexual, a vítima introjeta o agressor, levando à submissão total à vontade e aos desejos do agressor. Isso pode fazer com que a vítima internalize a culpa e se torne incapaz de se defender ou de reagir ao desprazer.. Este mecanismo contribui para um “círculo vicioso preocupante” onde os indivíduos abusados acabam por propagar o abuso.
*
Incapacidade de se defender ou reagir : as vítimas tornam-se completamente incapazes de se defender ou reagir diante do desprazer, permanecendo passivas diante da agressão. Isso cria condições ideais para a perpetuação direta do abuso, bem como para a tolerância ou cumplicidade inconsciente entre os envolvidos..
*
O “Não Dito” e a Compulsão à Repetição : O segredo que envolve o abuso, particularmente nos casos intrafamiliares onde o tabu do incesto está ausente, significa que a violência é real, mas tratada como inexistente.. Essa “ação de recusa” ou “não dito” no seio familiar pode interferir na capacidade da vítima de reconhecer suas próprias percepções e sensações corporais como reais , dificultando a elaboração psíquica e possibilitando o “funcionamento evacuativo da compulsão à repetição”..
*
Alterações Psíquicas e Inversão de Valores Morais : Se a vítima não recebe ajuda ou proteção imediata, ela é forçada a se submeter para sobreviver, o que leva a uma inversão de valores morais e alterações psíquicas prejudiciais à sua personalidade.. Eles podem “encenar a derrota”, copiando os vencidos em vez dos vencedores, pois o corpo não pode ser “inocente” quando a realidade não oferece provas de que também é um lugar de prazer, levando a uma relação persecutória com o próprio corpo e a realidade..
*
Amplificação do descontrole e da culpa : na adolescência, a violência sexual e qualquer sofrimento físico que a acompanha amplificam as experiências de descontrole da modificação corporal, culpa e ambivalência de sentimentos.. As consequências são graves, afetando profundamente o desenvolvimento psíquico do adolescente e carregando um preocupante potencial de perpetuação da violência sofrida.
Essencialmente, as fontes enfatizam que o abuso sexual na infância pode distorcer o relacionamento de um indivíduo com sua própria sexualidade e com os outros, levando a um ciclo de reconstituição e transmissão de traumas, muitas vezes impulsionado por processos inconscientes complexos e pela “violência do silêncio”.
🔴 1. O que significa “sexualizar todos os relacionamentos”?
Quando uma criança sofre violência sexual, sua experiência corporal e afetiva é violentamente atravessada por um excesso de excitação para o qual ela não tem estrutura psíquica para lidar. Isso pode gerar:
A impressão inconsciente de que a sexualidade é o único modo de se relacionar com os outros.
A crença de que o corpo é a única forma de valor ou de obtenção de afeto.
Uma tendência a se colocar em situações repetidas de sedução, submissão ou erotização, mesmo sem desejo genuíno.
Ou seja, o afeto, o amor, o cuidado e a atenção passam a ser confundidos com o sexual. A criança cresce com uma organização psíquica em que a sexualidade é o eixo de todos os vínculos — não por escolha, mas por trauma.
🔵 2. Isso está relacionado à pulsão de morte?
Sim, está. Na teoria freudiana:
A pulsão de vida (Eros) busca ligação, crescimento, prazer e continuidade.
A pulsão de morte (Thanatos) busca ruptura, repetição compulsiva, autodestruição, desintegração.
Quando o trauma sexual acontece:
A criança é invadida por um excesso de excitação que não pode simbolizar ou elaborar.
Isso produz o que Freud chamou de “experiência traumática sem representação” — o afeto fica livre, desamarrado, se manifestando depois como angústia, compulsão, sintomas.
👉 A repetição inconsciente de relações erotizadas, autodestrutivas ou sem desejo genuíno pode ser uma manifestação da pulsão de morte, que age como uma tentativa de:
Dominar retroativamente o trauma (reviver para tentar controlar);
Ou reproduzir o sofrimento inconscientemente, como se o sujeito estivesse aprisionado a uma cena que nunca pôde entender.
🟣 3. Efeitos possíveis ao longo da vida:
Confusão entre amor e sexualidade
(“Se alguém me deseja, então me ama.”)
Vulnerabilidade a relações abusivas ou promíscuas
(“Esse é o jeito que aprendi a ser querida/o.”)
Desconexão do próprio desejo
A pessoa erotiza vínculos sem desejar, por automatismo.
Culpa, vergonha e autoagressão
Quando a sexualidade aparece, ela vem carregada de angústia.
Dificuldade de intimidade verdadeira
O contato afetivo é sempre mediado pela sedução, o que impede a construção de vínculos seguros e profundos.
Repetição compulsiva
Envolve voltar a situações semelhantes ao trauma original — com outros sujeitos, mas com a mesma lógica relacional (por exemplo, se colocar inconscientemente em situações de submissão, violência, ou abandono).
✅ Em resumo:
A sexualização precoce de todos os vínculos, após abuso sexual na infância, é uma forma de marca traumática no psiquismo, que pode levar a uma vida afetiva e sexual desorganizada, confusa e autodestrutiva.
Essa dinâmica sim, está ligada à pulsão de morte, pois há repetição, autossabotagem, dor e impossibilidade de simbolizar plenamente o desejo.
Se quiser, posso relacionar isso com autores como Ferenczi (com o conceito de “confusão de línguas”), Laplanche, Judith Herman, ou com a teoria do trauma complexo. Deseja aprofundar por esse caminho?
O que significa “continuidade intergeracional”?
à transmissão ou propagação de violência ou padrões problemáticos através das gerações, muitas vezes de forma inconsciente.. Este conceito está ligado principalmente aos efeitos severos da violência sexual sofrida na infância ou adolescência.
Aqui está uma explicação detalhada:
*
Definição e Mecanismo : O termo “continuidade intergeracional” descreve um “círculo vicioso preocupante” onde indivíduos que foram submetidos à violência acabam propagando esse abuso. Este fenômeno está explicitamente ligado ao mecanismo de identificação com o agressor.
◦
Identificação com o agressor : Este mecanismo de defesa, embora não seja um termo cunhado por Freud, envolve a vítima invertendo os papéis e imitando inconscientemente o agressor.. Nos casos de abuso sexual, a vítima introjeta o agressor , levando à submissão total à vontade e aos desejos do agressor.. Isso pode fazer com que a vítima internalize a culpa e se torne incapaz de se defender ou de reagir ao desprazer.. Esta dinâmica cria condições ideais para a perpetuação direta do abuso, bem como para a tolerância ou cumplicidade inconsciente entre os envolvidos..
*
Propagação de padrões abusivos : vítimas de abuso sexual na infância podem estabelecer relacionamentos tão abusivos quanto aqueles que vivenciaram , envolvendo-se com parceiros potencialmente violentos ou abusivos.. Em alguns casos, as meninas que foram violadas podem tornar-se mães cúmplices ou incapazes de ver, apesar das indicações claras, a violência a que os seus próprios filhos estão a ser sujeitos. Isso destaca um ciclo perturbador em que o trauma afeta sua capacidade de proteger a próxima geração de danos semelhantes.
*
O papel do “não dito” : A “continuidade intergeracional” também é profundamente influenciada pelo que permanece “não dito” dentro das famílias, particularmente em casos de abuso intrafamiliar onde o tabu do incesto está ausente.. Essa “ação de recusa” ou “não dito” pode interferir na capacidade da vítima de reconhecer suas próprias percepções e sensações corporais como reais, dificultando assim o processo de elaboração psíquica e possibilitando o “funcionamento evacuativo da compulsão à repetição”.. Esta compulsão à repetição, onde experiências traumáticas não elaboradas são reencenadas, é um componente fundamental da transmissão intergeracional.
*
Repetição do Trauma : As fontes indicam que o que não foi elaborado psiquicamente por uma geração anterior se repete como um ato na geração seguinte, em vez de uma fantasia ou outra representação simbólica.. Isso significa que o trauma, em vez de ser processado e integrado, se manifesta em comportamentos e relacionamentos que refletem o abuso original.
*
Exemplos específicos : O conceito é exemplificado por casos como o de uma vítima que, após ser violentada sexualmente pelo pai e não receber ajuda, engravida dele novamente, recusando-se a abortar e alegando ser feliz porque o ama.. Outro exemplo é o de uma adolescente que sofreu abusos do pai durante quatro anos, mas não revelou isso porque sentia que era a única filha que o pai amava e lhe dava atenção especial.. Esses cenários complexos demonstram o profundo impacto psicológico e a dificuldade de quebrar o ciclo sem intervenção externa.
*
Consequências e Manifestações : Os graves efeitos da violência sexual, que incluem a tendência a sexualizar todas as relações, padrões autodestrutivos de promiscuidade e envolvimento em dinâmicas abusivas, fazem todos parte desta continuidade intergeracional.. Nos meninos, as consequências podem ser mais diretas e evidentes, como a delinquência, a toxicodependência e até o abuso sexual de outras crianças..
Em essência, “continuidade intergeracional” significa como o trauma não resolvido e a dinâmica psíquica do abuso podem ser transmitidos, levando à perpetuação de padrões violentos ou disfuncionais nas gerações futuras, muitas vezes por meio de mecanismos inconscientes como a identificação com o agressor e a compulsão de repetir
Como entender o mecanismo de identificação projetiva com o agressor em
situação de violência sexual?
O mecanismo de identificação projetiva com o agressor em situações de violência sexual descreve um processo psíquico complexo onde a vítima adota inconscientemente aspectos do papel e do comportamento do agressor. Este fenômeno é crucial para compreender a propagação do trauma através das gerações, um conceito anteriormente discutido como “continuidade intergeracional”..
Aqui está uma análise de como esse mecanismo é entendido nas fontes:
Compreendendo a identificação com o agressor
*
O reconhecimento implícito de Freud : Embora o termo “identificação com o agressor” não tenha sido cunhado pelo próprio Freud, o mecanismo é observável em sua obra, como no jogo do forte-da-terra , onde uma criança repete ativamente a experiência de abandono que sentiu de sua mãe, ganhando assim um controle ilusório sobre a situação e simbolicamente se “vingando”.
*
Descrição de Anna Freud : Anna Freud isolou e descreveu este mecanismo como um importante mecanismo de defesa na formação do superego. Diante de uma ameaça, crítica ou agressão física, principalmente de uma autoridade superior, o sujeito inverte os papéis, assume a responsabilidade pela agressão, introjeta o agressor e passa a imitá-lo, projetando em outrem a imagem da vítima..
*
Implicações sadomasoquistas : Lagache observou que esse mecanismo de defesa pode ter uma coloração sadomasoquista e estar na origem do ideal do egoEm conflitos entre as demandas do adulto e a resposta da criança, esta pode se identificar com o adulto onipotente e tornar-se sádica. Esse mecanismo é frequentemente relatado no contexto de um relacionamento dual (não triangular) e é caracterizado por características sadomasoquistas marcantes, o que é altamente pertinente às circunstâncias específicas de violência sexual e incesto..
*
Foco específico de Ferenczi : Ferenczi aplicou este conceito estritamente ao abuso sexual, definindo a agressão como a agressão sexual de um adulto (vivendo num mundo de paixão e culpa) contra uma criança presumivelmente inocente. Ele enfatizou a força traumática do evento externo real.
Dinâmica de Submissão e Internalização
*
Submissão total : Um resultado fundamental da identificação com o agressor é a submissão total da vítima à vontade e aos desejos do agressor.. Este agressor torna-se então introjetado e intrapsíquico, permitindo à vítima manter um “estado prévio de ternura” através de um processo psíquico distorcido.
*
Culpa internalizada e passividade : A vítima paga um preço por essa minimização da ameaça externa: seu comportamento se torna muito semelhante ao do agressor, pois introjeta o sentimento de culpa e, ao fazê-lo, sente-se merecedora da violência que sofreu ou está sofrendo.. Isso faz com que as vítimas se tornem completamente incapazes de se defender ou reagir ao desprazer , permanecendo passivas durante a agressão.. Essa passividade cria condições ideais tanto para a perpetuação direta do abuso quanto para a tolerância ou cumplicidade inconsciente entre os envolvidos.
*
Inversão de valores morais : Se a vítima não receber ajuda ou proteção imediata, ela é forçada a se submeter para sobreviver, o que leva a uma inversão de valores morais e alterações psíquicas prejudiciais à sua personalidade.. Eles podem “encenar a derrota”, copiando os vencidos em vez dos vencedores, assemelhando-se ao processo de identificação com o agressor. Isso pode levar a uma relação persecutória com o próprio corpo e a realidade , pois seu corpo não é inocente, mas um lugar de dor..
*
Transformação da passividade em atividade : Por meio de atos violentos, o sujeito busca inverter o processo , transformando a passividade em atividade, identificando-se com a figura mais forte, dominante e onipotente.. Isso envolve uma tentativa de anular experiências traumáticas não elaboradas por meio de encenação e repetição compulsiva , que carregam a marca da pulsão de morte..
Continuidade Intergeracional e Consequências
*
Propagação de padrões abusivos : A identificação com o agressor alimenta a “continuidade intergeracional” da violência. Indivíduos que sofreram abusos tendem a sexualizar todos os seus relacionamentos. Isso pode levar a padrões autodestrutivos de promiscuidade e envolvimento em relacionamentos tão abusivos quanto aqueles que vivenciaram. Em alguns casos, as vítimas femininas podem tornar-se mães cúmplices ou cegas que não reconhecem a violência que os seus próprios filhos sofrem. Para as vítimas do sexo masculino, as consequências podem incluir delinquência, dependência de drogas e até mesmo abuso sexual de outras crianças..
*
O “não dito” e a repetição : O silêncio em torno do abuso intrafamiliar, onde o tabu do incesto está ausente, significa que a violência é real, mas tratada como inexistente. Essa “ação de recusa” ou “não dito” pode interferir na capacidade da vítima de reconhecer suas próprias percepções e sensações corporais como reais, dificultando a elaboração psíquica e possibilitando o “funcionamento evacuativo da compulsão à repetição”.. O que não foi elaborado psiquicamente por uma geração anterior repete-se como um ato na geração seguinte, em vez de uma fantasia ou representação simbólica..
*
A adolescência como período vulnerável : Na adolescência, a violência sexual e o sofrimento físico que a acompanha amplificam as experiências de descontrole corporal, culpa e ambivalência de sentimentos.. As consequências são graves, afetando profundamente o desenvolvimento psíquico do adolescente e carregando um preocupante potencial de perpetuação da violência sofrida. A vulnerabilidade inata da adolescência, somada a esse mecanismo, faz dela um “momento privilegiado para o surgimento de comportamentos violentos, sejam eles heterossexuais ou autodestrutivos”..
*
A “violência do silêncio” : A dificuldade em reconhecer o adolescente como vítima, somada à descrença social e à pressão familiar, muitas vezes leva o adolescente a ser “novamente lançado na violência do silêncio”.. Isso contribui para a autoculpabilização e a perpetuação do “não dito”.. Para as meninas, as fantasias edipianas intensas podem levar à submissão por culpa e à manutenção do segredo.
Em essência, a identificação projetiva com o agressor é um mecanismo de defesa psíquica profundo, muitas vezes inconsciente, onde a vítima internaliza o poder e a culpa do agressor, levando a padrões autodestrutivos, à repetição de dinâmicas abusivas em relacionamentos futuros e à transmissão intergeracional de traumas, particularmente quando o apoio externo e o processamento simbólico estão ausentes..