Estudo dirigido 1 Flashcards
(21 cards)
Quando se iniciou o estudo científico da adolescência?
o estudo científico da adolescência se iniciou no final do século XIX e início do século XX, sendo G. Stanley Hall considerado o “pai da psicologia da adolescência”.
Hall publicou, em 1904, a obra Adolescence, na qual ele descrevia a adolescência como um período turbulento, marcado por conflitos emocionais e instabilidade, influenciado por fatores biológicos (como a puberdade) e sociais. Essa obra é vista como o marco inicial do estudo científico da adolescência.
Qual foi a contribuição de Stanley Hall para o estudo sobre a adolescência?
Como ele a definia?
A contribuição de Stanley Hall foi significativa, pois ele inaugurou o estudo científico da adolescência. Ele descreveu a adolescência como um período de grande emocionalidade e estresse. Segundo Hall (1925), ele definiu fundamentalmente a adolescência como biológica. Ele entendeu esta fase como um período turbulento e contencioso, caracterizado por “uma série de fraturas e erupções vulcânicas” no seio das famílias.
Como é compreendida a perspectiva invencionista sobre a adolescência?
A perspectiva invencionista sobre a adolescência não a entende como uma fase puramente biológica, mas como uma criação cultural ou uma construção social. Esta perspectiva sugere que a própria ideia de adolescência, com suas características, demandas e comportamentos específicos, é moldada por variáveis culturais que diferem entre vários períodos históricos e sociedades. Argumenta-se que a adolescência, tal como a entendemos hoje, é potencialmente uma “invenção cultural” (Rappaport, 1982) ou mesmo um “luxo” (Serra, 1997) que as sociedades ou grupos sociais mais desenvolvidos podem permitir.. O surgimento da adolescência como etapa reconhecida da vida parece estar relacionado a fatores como a democratização da educação e o desenvolvimento das leis trabalhistas (Gallantin, 1978). Alguns filósofos destacam que a adolescência começa com a biologia, mas termina com a cultura (Mussen & cols., 1995), o que é evidente em sociedades mais simples, onde essa fase pode ser muito breve (Traverso-Yepez & Pinheiro, 2002).
Quais são os estereótipos em relação aos adolescentes?
Impulsividade e excitabilidade: desde a Antiguidade, a adolescência tem sido vista através das lentes da impulsividade e da excitabilidade.
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Características Negativas (Antiguidade): Platão (século IV a.C.) enfatizou os traços negativos da juventude, alertando contra o consumo de álcool antes dos 18 anos devido à crença de que era como “colocar fogo no fogo”.Aristóteles (século IV a.C.) descreveu os jovens como apaixonados, irascíveis e facilmente influenciados por seus impulsos . Ele também os considerava exageradamente positivos em suas declarações e se acreditavam oniscientes..
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Turbulência e Contestação: Stanley Hall (1925) descreveu a adolescência como um período de intensa emocionalidade e estresse , entendendo-a como uma “zona de turbulência e contestação”, um período de “uma linha de fraturas e erupções vulcânicas” dentro das famílias..
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Indolência, indisciplina e preguiça: Nos períodos que antecederam a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, a literatura frequentemente enfatizava a indolência, a indisciplina e a preguiça dos adolescentes..
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“Delinquente juvenil” ou “rebelde sem causa”: Nos Estados Unidos, durante a década de 1950, surgiu o estereótipo do “delinquente juvenil” ou “rebelde sem causa”..
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Ligação à violência: Marty (2006) afirma que a adolescência é frequentemente associada à violência , embora esclareça que a violência não é exclusiva dos jovens, mas um certo nível pode ser típico desta fase do desenvolvimento..
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Subcultura e contracultura: a década de 1960 contribuiu para a percepção da adolescência como uma subcultura, frequentemente associado a sinais externos específicos, como cabelos longos e roupas coloridas, e ao surgimento de uma contracultura com uma nova maneira de pensar.
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Simplificação excessiva da uniformidade: Mussen, Conger e Kagan (1977) alertam contra a simplificação excessiva de assumir que todos os adolescentes são iguais , pois os estudos atuais destacam as diversas variáveis que influenciam os indivíduos durante esta fase..
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Comportamento de risco (implícito): O medo da adolescência como um “momento crítico” da existência no século XIX sugere um estereótipo de adolescentes envolvidos em comportamentos potencialmente arriscados.
O que é puberdade? Qual é a diferença entre puberdade e adolescência?
A puberdade refere-se aos fenômenos fisiológicos que envolvem mudanças corporais e hormonais. Envolve as mudanças orgânicas que levam à maturação biológica adulta com dimorfismo sexual e capacidade reprodutiva. Essas mudanças biológicas da puberdade são universais e visíveis , modificando as crianças, dando-lhes a altura, a forma e a sexualidade dos adultos.. Para as meninas, o início da puberdade ocorre por volta dos 10 anos, e para os meninos, por volta dos 12 anos , e o ritmo dessas mudanças varia dentro do mesmo sexo..
A adolescência, por outro lado, pertence aos componentes psicossociais deste mesmo processo. Envolve a adaptação às novas estruturas físicas, psicológicas e ambientais que surgem da puberdade. Enquanto a puberdade é mais focada na maturação física , a adolescência é influenciada pelas manifestações da puberdade e inclui alterações cognitivas, sociais e de perspectiva de vida.O início da adolescência coincide com a puberdade.
Portanto, enquanto a puberdade fornece a base biológica, a adolescência envolve o desenvolvimento psicológico e social do indivíduo em resposta a essas mudanças e sua preparação para a vida adulta
Como entender que a puberdade tardia ou precoce possa ser um fator de risco
para a doença?
Puberdade precoce ou tardia é fator de risco porque gera um descompasso entre corpo e mente. Isso pode afetar a autoestima, provocar ansiedade, isolamento ou dificuldades sociais. Quando precoce, o adolescente pode ser exposto a situações para as quais ainda não está emocionalmente preparado. Quando tardia, pode se sentir inferior ou excluído pelos colegas. Esse desequilíbrio aumenta a chance de desenvolver problemas de saúde física e, principalmente, emocional.
A puberdade é um processo de mudanças intensas. Quando ela ocorre fora do “tempo esperado” — seja muito cedo (puberdade precoce) ou muito tarde (puberdade tardia) — pode gerar conflitos internos, dificuldades de adaptação social e impacto psicológico, o que aumenta o risco de problemas de saúde.
⚠️ Riscos associados à puberdade precoce:
Problemas emocionais e psicológicos
→ Ansiedade, depressão, baixa autoestima, confusão sobre a identidade.
Hipersexualização precoce e maior exposição a situações de risco
→ Como o adolescente aparenta mais idade, pode ser tratado como mais velho do que realmente é.
Isolamento social
→ Sente-se diferente dos colegas que ainda estão na infância.
⏳ Riscos associados à puberdade tardia:
Dificuldade de integração social
→ Pode ser alvo de bullying ou exclusão por não “acompanhar” os pares.
Baixa autoestima e insegurança
→ Especialmente em relação ao corpo, comparando-se aos colegas.
Sinais de doenças hormonais ou problemas de saúde
→ Como distúrbios endócrinos, desnutrição ou doenças crônicas.
✅ Em resumo:
A puberdade fora do tempo esperado pode desencadear desequilíbrios físicos, emocionais e sociais, funcionando como um fator de vulnerabilidade ao adoecimento — especialmente no campo da saúde mental.
O que significa caracteres sexuais primário, secundário e terciário?
Caracteres sexuais primários
São estruturas anatômicas ligadas diretamente à reprodução.
➡️ Estão presentes desde o nascimento, mas se desenvolvem durante a puberdade.
Masculino: testículos, pênis, próstata.
Feminino: ovários, útero, vagina.
🔸 Caracteres sexuais secundários
São as mudanças físicas que aparecem na puberdade, mas não estão diretamente ligadas à reprodução.
➡️ Indicam o amadurecimento sexual.
Masculino: aumento da massa muscular, engrossamento da voz, pelos no rosto e no corpo.
Feminino: desenvolvimento das mamas, alargamento dos quadris, aparecimento de pelos.
🔺 Caracteres sexuais terciários
São os aspectos psicológicos e sociais ligados à identidade de gênero e ao papel sexual na sociedade.
➡️ Envolvem a forma como a pessoa se percebe, se comporta e se relaciona no contexto social e afetivo.
Exemplo: modo de vestir, postura, atração sexual, identidade de gênero, padrões de relacionamento.
Tipo de Caractere Sexual O que é? Exemplos
Primário Estruturas ligadas diretamente à reprodução Ovários, útero, vagina, testículos, pênis
Secundário Mudanças físicas na puberdade (não reprodutivas) Mamas, pelos, voz grossa, quadris largos
Terciário Aspectos sociais e psicológicos da sexualidade Identidade de gênero, comportamento, atração sexual
Quais são os lutos vividos na adolescência - que trazem uma série de
implicações subjetivas - e os mecanismos defensivos utilizados pelos
adolescentes para lidarem com os mesmos?
Segundo “Game over.pdf”, o adolescente vivencia “o luto pela infância, pelo corpo infantil, pelos pais da infância”. Esta fonte enfatiza que os pais também lamentam a perda da infância de seus filhos, mas se concentra na perspectiva do adolescente. A adolescência também é descrita como o “momento de ruptura com a posição, própria da infância, de ser uma possessão dos pais”. Esta ruptura com a dependência dos pais representa uma perda significativa de uma posição familiar e segura. Além disso, “Cópia de A Adolescencia Calligaris, Contard .pdf” observa que os adolescentes perdem “aquela graça infantil que, em nossa cultura, parece garantir o amor incondicional dos adultos, sua proteção e solicitude imediatas”. Esta segurança perdida muitas vezes não é imediatamente substituída pelo reconhecimento adulto. O texto afirma ainda que a criança “perde (ou, para crescer, renúncia) a segurança do amor que era garantida à criança, sem ganhar em troca outra forma de reconhecimento que lhe pareceria, nessa altura, devido”. Em termos psicanalíticos, há uma “perda gradual, não exatamente abrupta, do lugar de objeto do amor dos pais”como o adolescente é “parido subjetivamente da família: é expulso do corpo sintomático em cujo ventre se formou”.
Estas perdas têm profundas implicações subjectivas . “Cópia de A Adolescência Calligaris, Contard .pdf” destaca que a insegurança se torna assim o traço próprio da adolescência. Adolescentes vivenciam fragilidade de autoestima, depressão e tentativa de suicídio. Diante do espelho, o adolescente muitas vezes percebe um “espelho […] vazio” entre a criança que foi e o adulto que ainda não é. Eles se sentem “não mais adorados e ainda não reconhecidos”, questionando constantemente sua amabilidade, desejabilidade e adequação. Há uma proclamada ignorância dos protagonistas : os adolescentes sentem que os pais não os compreendem, enquanto eles não compreendem os pais, que por sua vez afirmam não compreender mais nada.. “Game over.pdf” sugere que o adolescente existe porque duvida e é odiado pelos adultos por fazer perguntas que os adultos não conseguem responder. A adolescência é também um momento em que o olhar crítico do adolescente, resultante do seu novo distanciamento dos pais, aponta as fragilidades dos adultos como potenciais modelos de identificação.
Para lidar com essas perdas e o sofrimento subjetivo resultante, os adolescentes utilizam vários mecanismos de defesa . “Cópia de A Adolescência Calligaris, Contard .pdf” descreve adolescência como acontecimento e rebeldiacontra a “moratória” imposta ou período de espera antes da maioridade. Uma defesa primária é buscar o reconhecimento como adultos, levando a uma variedade de comportamentos.
Alguns mecanismos de defesa importantes incluem:
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Gregarismo: Os adolescentes transformam assim sua faixa etária num grupo social para encontrar reconhecimento mútuo como pares, excluídos do mundo adulto e sua “moratória”. Eles buscam nesses grupos a ausência do período de espera imposto pelos adultos e critérios claros de aceitação.
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Delinquência: Envolver-se em comportamentos transgressivos é outra forma de buscar reconhecimento e desafiar a autoridade adulta. Os adolescentes podem agir para forçar uma resposta dos adultos, interpretando a repressão como uma forma de reconhecimento.
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Toxicomania (Abuso de Substâncias): Experimentar drogas pode ser uma forma de rebelião contra a “moratória” e a hipocrisia percebida do uso de drogas por adultos. Também pode ser uma forma de formar laços entre pares e forçar o reconhecimento adulto através da necessidade de reabilitação.
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O Adolescente que se Enfeia: Desafiar as normas estéticas adultas pode ser uma forma de rejeitar os valores sociais em torno da desejabilidade e potencialmente provocar uma reação que confirme a sua sensação de ser perigoso ou rebelde.
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O Adolescente Barulhento: Identificar-se intensamente com ídolos e tendências pode ser uma forma de forjar uma identidade distinta dos adultos e estabelecer pertencimento dentro de um grupo de pares.
Esses mecanismos de defesa, conforme descritos em “Cópia de A Adolescencia Calligaris, Contard .pdf”, são frequentemente paradoxais. Adolescentes transgridem para obter reconhecimento, e adultos, em suas tentativas de compreensão, criam imagens frequentemente extremas da adolescência.. Em última análise, a busca do adolescente pelo reconhecimento dos adultos leva-os a espelhar os próprios desejos reprimidos dos adultos por rebelião e liberdade..
Como entender o fenômeno da adolescência estendida e sua relação com a cultura ocidental contemporânea?
Segundo “Através dos séculos.pdf”, a sociedade ocidental contemporânea prolongou o período da adolescência , que deixou de ser vista apenas como uma preparação para a vida adulta e passou a ter importância como uma etapa distinta no ciclo vital humano.. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece uma fase adicional chamada “juventude” , que vai dos 15 aos 25 anos, que abrange a parte final da adolescência e o início da idade adulta.. Esta extensão implica um atraso na assunção de responsabilidades adultas.
Vários fatores dentro da cultura ocidental contemporânea contribuem para esse fenômeno:
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Definições em Mudança da Vida Adulta: “Cópia de A Adolescencia Calligaris, Contard .pdf” destaca que, na cultura ocidental moderna, a definição de adulto é frequentemente indefinida . A vida adulta está ligada a ser “desejável e invejável”, tornando os critérios para a transição da adolescência pouco claros.. Sem um conjunto claro de “provas rituais” ou competências que definam a vida adulta, o período de espera (“moratória”) para os adolescentes é prolongado.
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Estruturas Econômicas e Sociais: “Através dos séculos.pdf” observa que culturas tecnicamente mais sofisticadas retardam a entrada dos jovens nas estruturas sociais , com crescentes demandas por educação e especialização para o emprego. Isso exige um período maior para que os indivíduos cumpram as “tarefas da adolescência”, levando ao seu prolongamento. O texto também aponta um cenário econômico adverso e a dificuldade de estabilidade no emprego como fatores enfrentados pela “onda jovem” na virada do século XXI, contribuindo para a falta de perspectivas e um período prolongado de dependência..
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A Idealização da Adolescência: “Cópia de A Adolescencia Calligaris, Contard .pdf” argumenta que a adolescência se tornou uma das formações culturais mais poderosas do nosso tempo, um mito através do qual os adultos veem os adolescentes e os adolescentes se veem a si mesmos. Tornou-se um objeto de inveja e medo , moldando sonhos adultos de liberdade e pesadelos de desordem. Essa idealização, onde os adultos podem até aspirar a ser como adolescentes, confunde ainda mais os limites entre a adolescência e a idade adulta, contribuindo potencialmente para um período prolongado.
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A “moratória” e o reconhecimento tardio: Calligaris argumenta que a adolescência é caracterizada por uma “moratória” imposta pela sociedade. Adolescentes que assimilaram valores sociais e cujos corpos são maduros ainda são privados do pleno reconhecimento adulto e da capacidade de se envolverem plenamente no amor, no sexo e no trabalho.. Este período de espera imposto, e a ausência de critérios claros para o seu término, conduz naturalmente a um estado prolongado de adolescência.
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A Mudança do Papel da Educação: “Através dos séculos.pdf” aponta que o papel da educação mudou. Antes focada na formação profissional, a educação básica agora visa o desenvolvimento integral do indivíduo, sem a preocupação imediata com a profissionalização.. Esse período prolongado em instituições educacionais pode contribuir para uma adolescência prolongada.
Em essência, a extensão da adolescência na cultura ocidental contemporânea está entrelaçada com uma complexa interação de fatores: a falta de marcadores claros para a vida adulta, as crescentes demandas por educação e independência econômica, a idealização cultural da juventude e a “moratória” social que atrasa a integração plena dos jovens aos papéis adultos.. Esta mudança significa um afastamento de períodos históricos anteriores, onde a adolescência era breve ou não era claramente reconhecida como uma fase separada da vida..
Lutos
O luto pela infância: Refere-se ao fim de um período conhecido e relativamente seguro da vida . A infância, embora tenha suas próprias complexidades, é frequentemente caracterizada por uma maior dependência dos cuidados parentais e um conjunto diferente de expectativas. O adolescente lamenta a perda da natureza despreocupada e das menores responsabilidades associadas à infância.Subjetivamente, isso pode se manifestar como um sentimento de nostalgia por uma época mais simples e uma sensação de ser lançado em um mundo mais complexo e exigente. O adolescente pode se sentir despreparado para os desafios da adolescência e da vida adulta, o que leva à ansiedade e à insegurança..
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O luto pelo corpo infantilA puberdade traz mudanças físicas significativas e frequentemente rápidas, que podem ser perturbadoras para o adolescente. Ele vivencia a perda do físico familiar da infância e precisa se adaptar a um novo corpo que lhe parece estranho e imprevisível .. Este “novo” corpo também está ligado à sexualidade emergente e às expectativas sociais em relação à aparência física, o que pode levar a problemas de imagem corporal, autoconsciência e insegurança.. O adolescente que se olha no espelho pode ver uma imagem que não se parece nem com a criança que era nem com o adulto que ainda se tornará, levando a uma sensação de vazio ou desconexão.
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O luto pelos pais da infância: Esta é talvez uma das perdas mais complexas. O adolescente vivencia uma desidealização dos pais , deixando de vê-los como figuras oniscientes e onipotentes da infância.. Eles começam a perceber seus pais como indivíduos com suas próprias falhas, limitações e questões não resolvidasEssa perda pode ser dolorosa, pois desmantela a segurança das figuras parentais idealizadas que forneceram apoio e orientação inabaláveis na infância. Subjetivamente, isso pode levar a sentimentos de desilusão, raiva e uma sensação de solidão, à medida que o adolescente reconhece a falibilidade de seus cuidadores primários como modelos de identificação .. Isso não significa necessariamente que os pais não sejam mais importantes, mas seu papel e a percepção que o adolescente tem deles sofrem uma mudança fundamental.
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Ruptura com a posição, própria da infância, de ser uma possessão dos paisA infância é frequentemente caracterizada por um maior grau de controle e dependência parental. A adolescência marca uma ruptura com essa posição de dependência, à medida que o indivíduo busca autonomia e independência .Essa “ruptura” significa a perda do conforto e da segurança de ser mantido e orientado pelos pais. Subjetivamente, essa pode ser uma experiência conflitante . Embora o adolescente deseje liberdade, ele também pode se sentir ansioso por assumir maiores responsabilidades e navegar pelo mundo sem o mesmo nível de orientação parental. Isso pode se manifestar como um comportamento rebelde , à medida que afirma sua independência e se distancia..
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Perda daquela graça infantil que, em nossa cultura, parece garantir o amor incondicional dos adultos, sua proteção e solicitude imediatas: As crianças frequentemente recebem um tipo específico de afeto e atenção acríticos simplesmente em virtude de sua idade e da suposta inocência. À medida que os adolescentes amadurecem fisicamente, perdem essa consideração positiva, automática e incondicional dos adultos.A “graça infantil” que antes despertava cuidado e proteção imediatos não está mais presente. Subjetivamente, isso pode levar a um sentimento de ser menos amado ou menos digno de atenção , especialmente se não for imediatamente substituído por uma forma diferente de reconhecimento adulto.. O adolescente pode sentir-se “não mais adorado”.
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Perda (ou, para crescer, renúncia) à segurança do amor que era garantida à criança, sem ganhar em troca outra forma de reconhecimento que lhe pareceria, nessa altura, devido: O amor previsível e muitas vezes gratuito da infância não é mais garantido na adolescência. Para crescer, o adolescente precisa abrir mão da segurança desse amor infantil na transição para a idade adulta.. No entanto, eles não recebem automaticamente o reconhecimento que sentem que merecem como adultos emergentes. Essa falta de reconhecimento claro por parte dos adultos pode gerar uma insegurança significativa. O adolescente se sente preso em um espaço liminar, não é mais uma criança, mas ainda não é totalmente reconhecido como adulto.
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Perda gradual, não exatamente abrupta, do lugar de objeto do amor dos pais: A natureza da relação pais-filhos muda durante a adolescência. O adolescente deixa de ser o foco principal do afeto dos pais como era na infância.. Este é um processo gradual , mas representa uma perda significativa de uma posição central na dinâmica familiar. Subjetivamente, isso pode levar a sentimentos de menos importância, de ser esquecido ou até mesmo rejeitado , mesmo que os pais continuem a amá-los e cuidar deles de maneiras diferentes.
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Ser parido subjetivamente da família: é expulso do corpo sintomático em cujo ventre se formou: Esta é uma perda mais metafórica, referindo-se à separação psicológica do adolescente da unidade familiar como uma entidade coesa e indiferenciadaO adolescente desenvolve um senso de identidade mais distinto, separado da dinâmica familiar e de suas necessidades não expressas. Essa “expulsão” pode ser vivenciada como uma perda de pertencimento ou um sentimento de ser afastado , embora seja um passo necessário para a individuação. Apesar dessa separação subjetiva, o adolescente ainda precisa coexistir com a família, criando potencial para conflitos e mal-entendidos..
Esses “lutos” estão interligados e contribuem para a experiência subjetiva geral da adolescência como um período de transição significativa, frequentemente marcado por insegurança, questionamentos e busca por uma nova identidade e lugar no mundo. Os mecanismos de defesa empregados pelos adolescentes, como discutido anteriormente, são tentativas de navegar pela turbulência emocional decorrente dessas perdas fundamentais.
Por que Eizirik (2001) afirma que a adolescência requer um mergulho
profundo para dentro do mundo interno, ou seja, uma virada rumo ao interior, viabilizado por uma intensificação do narcisismo?
Eizirik afirma que a adolescência exige um mergulho profundo no mundo interno porque é um momento de grandes transformações psíquicas. O adolescente está deixando a infância para trás e precisa reformular sua identidade, lidar com novas sensações corporais, desejos e relações sociais. Tudo isso exige uma reavaliação interna: quem sou eu agora? O que eu quero? Qual é meu lugar no mundo?
🔄 O papel do narcisismo nesse processo:
Eizirik destaca que essa virada para dentro é viabilizada por uma intensificação do narcisismo.
Mas atenção: não se trata de egoísmo, e sim de um movimento natural de foco sobre si mesmo, necessário para que o adolescente:
Reorganize sua autoestima;
Reavalie suas relações de dependência com os pais;
Construa uma nova imagem de si;
Explore seus desejos, valores e projetos.
🧠 Em resumo:
A adolescência, segundo Eizirik (2001), é um processo de interiorização que permite ao sujeito reconstruir sua identidade frente às novas demandas da vida. O narcisismo saudável funciona como uma energia psíquica voltada para essa autoexploração, sendo essencial para o amadurecimento emocional.
O que significa dizer, como expressa Eizirik (2001), que a evolução das
relações amorosas na adolescência se dá no sentido do narcisismo para a
descoberta do outro? Como este processo ocorre no menino e na menina?
Eizirik entende que, na adolescência, o jovem inicia suas experiências afetivas e amorosas ainda centrado em si mesmo, ou seja, com um amor mais narcísico — voltado para a autoimagem, validação e idealizações.
➡️ Com o tempo, e à medida que amadurece emocionalmente, o adolescente passa a reconhecer o outro como uma pessoa real, com desejos, limites e subjetividade própria.
👉 Ou seja, ele evolui da busca por si mesmo no outro (narcisismo) para a capacidade de se vincular afetivamente de forma mais genuína, com empatia e reciprocidade.
🧠 Como esse processo ocorre em meninos e meninas?
Eizirik observa que esse movimento é vivido de formas diferentes entre meninos e meninas, influenciado por fatores psíquicos e sociais:
👦 Meninos:
Tendem a manter por mais tempo um ideal narcísico de si mesmos.
Muitas vezes se envolvem afetivamente com figuras femininas idealizadas, como uma extensão do amor à própria imagem.
Podem ter mais dificuldade inicial de reconhecer o outro como sujeito (não apenas objeto de desejo ou validação).
👧 Meninas:
Em geral, entram mais cedo no processo de identificação com o outro.
Costumam ter maior capacidade de empatia e vínculo afetivo precoce.
Mesmo assim, também passam por fases de idealização e busca por validação da própria identidade através da relação com o outro.
O que pode ser entendido quando Eizirik (2001) afirma que, “no final da
adolescência, a pessoa amada, embora ainda se relacione de alguma forma
com os pais na fantasia inconsciente, já esteja bem distanciada destes, e seja
amada por suas próprias qualidades e características”?
Segundo Eizirik (2001), ao final da adolescência, o indivíduo atinge um nível mais maduro de desenvolvimento afetivo, no qual é capaz de amar o outro por suas próprias qualidades e características, e não mais como uma projeção inconsciente das figuras parentais. Isso significa que, durante a adolescência, as primeiras experiências amorosas ainda carregam, de forma inconsciente, traços das relações estabelecidas com os pais na infância. Nessas fases iniciais, é comum que o adolescente projete em seus pares afetivos idealizações e desejos que têm origem no vínculo primário com as figuras parentais. No entanto, à medida que o sujeito atravessa os desafios da adolescência e desenvolve maior autonomia emocional, ocorre um processo de diferenciação interna, em que o outro deixa de ser um “substituto” simbólico do pai ou da mãe. Assim, o amor se torna mais realista, baseado na alteridade, no reconhecimento das qualidades singulares da outra pessoa, e não mais em fantasias idealizadas ou na repetição inconsciente de vínculos infantis. Esse deslocamento é um sinal de amadurecimento psíquico, pois revela a capacidade do jovem de estabelecer vínculos afetivos mais autênticos, recíprocos e menos centrados em si mesmo ou em suas fantasias internas.
Com o tempo, o adolescente passa por um movimento de:
Diferenciar seus pais das novas figuras de amor;
Reconhecer a individualidade do outro;
Abrir mão da idealização infantil.
➡️ Isso exige que o jovem reformule sua identidade, questione os padrões antigos e se torne emocionalmente mais autônomo.
Quando esse processo ocorre de forma saudável, o adolescente deixa de buscar no outro uma “versão simbólica dos pais” e começa a amar alguém por quem essa pessoa realmente é — com qualidades, defeitos, desejos e subjetividade própria.
Esse é o momento em que o amor se torna:
Menos narcisista (centrado em si mesmo);
Mais relacional (centrado na troca, empatia e reconhecimento do outro).
Como entender a concepção de Calligaris (2000) no sentido de considerar a
adolescência como um tempo de moratória, imposto pela sociedade? Por que esta moratória social é indefinida?
efine a adolescência como uma “moratória” imposta pela sociedade. Isso ocorre quando um indivíduo tem tempo suficiente para assimilar os valores amplamente compartilhados pela comunidade , como alcançar sucesso financeiro/social e relacionamentos românticos/sexuais.. Além disso, seu corpo atingiu a maturação necessária para realizar essas tarefas com eficácia e competir com os adultos. Porém, neste preciso momento, a comunidade impõe- lhes uma “moratória”.
Por outras palavras, os adolescentes são capazes, instruídos e treinados para adoptar os ideais da comunidade, mas apesar da sua preparação física e mental, não são reconhecidos como adultos.. Em vez disso, eles aprendem que permanecerão sob a tutela de adultos por aproximadamente mais dez anos, preparando-se para o sexo, o amor e o trabalho sem se envolverem totalmente neles, ou apenas o fazendo marginalmente.. Este período de suspensão, entre a maturação dos seus corpos e a permissão para realizar plenamente os valores sociais, é o que constitui a adolescência segundo Calligaris. Ele observa que esse fenômeno é novo e quase exclusivamente contemporâneo , consolidando-se como outra etapa da vida com a modernidade tardia.
Esta “moratória” social é indefinida porque, na cultura ocidental moderna, a definição de adulto é indefinida. Calligaris afirma que um adulto é alguém que consegue ser “desejável e invejável”.Consequentemente, permanece incerto quanto desejo e inveja um indivíduo precisa gerar para ser aceito no reino dos “adultos”..
Portanto, a questão de quais “provas” são necessárias para que um adolescente ganhe o estatuto de adulto também permanece em aberto.. Calligaris argumenta que a “moratória” da adolescência é, de certa forma, resultado dessa mesma indefinição. Se a condição de adulto fosse definida por competências específicas, a adolescência como período de espera prolongado não existiria; em vez disso, haveria apenas candidatos em fase de iniciação com critérios claros de sucesso.. Como ninguém sabe verdadeiramente o que define um homem ou uma mulher na sociedade contemporânea, os requisitos para que um adolescente se torne adulto são igualmente pouco claros.. O critério direto da maturação física é desconsiderado e não há uma lista estabelecida de provas ritualísticas. Isso deixa o adolescente diante de uma suspensão forçada de sua vida com insegurança radical e perguntas como: “O que eles esperam de mim?”, “Como posso fazer com que eles me reconheçam e me aceitem como adulto?” e ”Por que eles me idealizam?”.
Calligaris (2000) também pontua que o adolescente é ótimo intérprete dos
desejos inconscientes dos adultos. Então, como compreender tal frase: “faça o
que eu desejo e não o que eu peço e atue em consequência”?
reflete o papel do adolescente como um “ótimo intérprete do desejo dos adultos”.. Calligaris argumenta que essa interpretação surge das contradições inerentes à forma como os adultos ocidentais modernos criam os adolescentes.
Aqui está uma análise do motivo pelo qual os adolescentes se tornam tais intérpretes e o significado da frase:
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Expectativas contraditórias dos adultos: os adultos apresentam aos adolescentes mensagens conflitantes. Eles enfatizam valores como autonomia e independênciaao mesmo tempo que impõe uma “moratória” que nega aos adolescentes o pleno reconhecimento da vida adulta e a capacidade de agir autonomamente em áreas-chave como o amor, o sexo e o trabalho. Os adultos querem que os adolescentes busquem sucesso social e romântico, mas também dizem a eles para adiar esses esforços para se “prepararem” melhor.
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A natureza indefinida da idade adulta: Os critérios para atingir a idade adulta na cultura ocidental moderna são pouco claros e indefinidos , vinculados a ser “desejável e invejável” sem “provas rituais” específicas.. Essa falta de expectativas claras deixa os adolescentes em um estado de insegurança, questionando-se sobre o que precisam fazer para serem reconhecidos como adultos.
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Interpretando desejos subjacentes: Diante dessas contradições e da falta de caminhos claros para a vida adulta, os adolescentes embarcam em uma busca para entender o que os adultos realmente desejam. Eles tentam decifrar os desejos inconscientes ou ocultos dos adultos que estão por trás de suas instruções e solicitações explícitas. O adolescente argumenta que se seguir as ordens diretas dos adultos leva à perda do afeto da infância sem obter o reconhecimento adulto, então talvez a chave seja cumprir o que os adultos secretamente anseiam..
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“Faça o que eu desejo e não o que eu peço”: esta frase resume a necessidade percebida pelo adolescente de olhar além da superfície das exigências dos adultos. Sugere que os pedidos expressos pelos adultos podem não estar alinhados com seus desejos mais profundos, muitas vezes reprimidos.. Os adolescentes tentam agir de maneiras que acreditam que irão satisfazer esses desejos subjacentes, na esperança de finalmente obter a aprovação e o reconhecimento dos adultos..
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Agindo de acordo: Uma vez que o adolescente acredita ter interpretado o verdadeiro desejo do adulto, ele age de acordo com essa interpretação. Isso pode se manifestar em várias formas de rebelião e transgressão. Por exemplo, se os adolescentes sentem um desejo adulto reprimido de rebelião contra as normas sociais, eles podem se envolver em comportamento rebelde, acreditando que isso ressoará com os desejos ocultos dos adultos e levará à aceitação.. Calligaris chega a sugerir que a idealização da marginalidade e da delinquência na cultura popular reflete um sonho adulto reprimido.
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O resultado paradoxal: a ironia é que a interpretação e a atuação bem-sucedidas do adolescente desses desejos adultos reprimidos muitas vezes levam a conflitos e mal-entendidos.. Os adultos podem não reconhecer ou admitir conscientemente esses desejos e podem reagir negativamente à atuação do adolescente sobre eles.. Isso cria um “fantástico quiproquó” onde o adolescente realiza um desejo adulto reprimido, mas o adulto rejeita a manifestação desse desejo.
Em resumo, Calligaris argumenta que as inconsistências nas expectativas dos adultos e a falta de definições claras da vida adulta forçam os adolescentes a assumir o papel de intérpretes dos desejos inconscientes dos adultos. A frase “faça o que eu desejo e não o que eu peço, e aja de acordo” descreve a estratégia do adolescente de tentar obter o reconhecimento dos adultos, atendendo ao que percebem ser os anseios ocultos dos adultos, mesmo que isso signifique ir contra suas ordens explícitas. Isso frequentemente leva a uma situação paradoxal em que as ações do adolescente, motivadas pelo desejo de aceitação, são recebidas com a desaprovação dos adultos..
Quais são as tribos de adolescentes descritas por Calligaris (2000) e suas
características?
O Adolescente Gregário: Este adolescente busca reconhecimento e aceitação dentro do seu grupo de pares porque se sente negado o reconhecimento pelos adultos devido à “moratória” que lhe é imposta. Eles criam ou se juntam a grupos onde podem ser reconhecidos como iguais, estabelecendo suas próprias condições sociais. Esses grupos geralmente têm critérios claros de admissão, como estilos compartilhados ou comportamentos específicos (às vezes transgressivos). Calligaris observa que esse gregarismo é visto como uma patologia pelos adultos porque significa um afastamento da estrutura familiar hierárquica e do reconhecimento adulto almejado. O grupo se torna um espaço onde os adolescentes podem trocar o que os adultos recusaram ou adiaram. A transgressão dentro do grupo solidifica-o e assegura o reconhecimento mútuo.
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O Adolescente Delinquente: Para este adolescente, a motivação primária é obter reconhecimento desafiando e provocando o pacto social adulto. Como o “ritual iniciático” para a vida adulta não é claro, o delinquente busca reconhecimento “fora” ou “contra” a norma social, muitas vezes dentro de um grupo de pares delinquentes que estabelece suas próprias regras de reconhecimento mútuo.. Suas transgressões muitas vezes visam excitar a lei e a repressão que se segue , que eles paradoxalmente interpretam como uma forma de reconhecimento adulto, vendo-se como as “partes obscuras e esquecidas dos adultos”.. Calligaris sugere que a banalidade dos comportamentos delinquentes frequentes dos adolescentes reflete a banalidade dos desejos reprimidos dos adultos.
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O adolescente viciado em drogas: Calligaris argumenta que o interesse do adolescente pelas drogas pode ser visto como uma representação dos sonhos abandonados de libertação e revolução de uma geração anterior.. Além disso, a proibição seletiva de drogas lícitas (álcool e tabaco) para adolescentes é vivenciada como infantilizante, tornando essas substâncias atraentes como um desafio à autoridade adulta.. As drogas ilícitas oferecem outra via para desafiar a “moratória” , potencialmente através do tráfico, e fornecem uma base para o reconhecimento gregário entre os usuários. Subjacente ao medo adulto do uso de drogas por adolescentes, Calligaris sugere, está a preocupação de que as drogas possam realmente satisfazer os desejos do adolescente, levando potencialmente à felicidade e, assim, escapando da busca perpétua inerente ao desejo moderno.. Os adultos veem as drogas como uma fuga perigosa da “moratória” para outro mundo.
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O adolescente que se torna feio: esta categoria descreve adolescentes que desafiam as normas estéticas adultas ao adotar estilos que os adultos consideram pouco atraentes.. Essas transgressões estéticas servem a múltiplos propósitos: criar um padrão estético interno para reconhecimento e diferenciação do grupoe desafiando deliberadamente o cânone adulto dominante. Em última análise, essas estéticas “feias” são uma forma de buscar atenção e uma reação (mesmo negativa) dos adultos , esperando que o medo ou a indignação dos adultos confirmem a autopercepção do adolescente como perigoso, ousado e sexy – em essência, como um adulto..
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Adolescente barulhento: refere-se a adolescentes que admiram excessivamente ídolos, apegam-se a marcas e imitam personagens , aparentemente perdendo-se em referências externas.Calligaris sugere que esse comportamento pode ser entendido como uma tentativa de definir uma identidade quando o caminho para a identidade adulta não é claro. Além disso, pode ser interpretado como uma rejeição dos valores do mundo adulto e uma forma de criar um sentimento de pertencimento dentro de uma cultura de pares. Mesmo que este comportamento pareça rejeitar o reconhecimento adulto, Calligaris argumenta que inadvertidamente ele promulga o sonho adulto de autonomia e liberdade, colocando assim, paradoxalmente, o adolescente no centro do ideal cultural.
Estas cinco figuras representam diferentes estratégias que os adolescentes empregam na sua jornada ambígua rumo à idade adulta, fortemente influenciadas pela “moratória” social e pela sua interpretação dos desejos adultos..
Comente a afirmação de Mário e Diana Corso (1997): “a impossibilidade dos
adultos de saberem sobre a adolescência dos filhos advém da impossibilidade
de eles saberem sobre a própria adolescência
Isso sugere uma desconexão significativa entre as gerações, enraizada na dificuldade do adulto em acessar ou processar seu próprio passado de desenvolvimento.
Corso e Corso elaboram este ponto observando que os adultos geralmente têm dificuldade em se envolver com a adolescência. Eles tendem a se comportar como se ainda fossem adolescentes ou a negar completamente o fenômeno da adolescência , revelando sua incapacidade fundamental de compreendê-lo.. Os autores afirmam explicitamente que essa impossibilidade de conhecer a adolescência decorre da impossibilidade de conhecer a própria adolescência.
Esta ideia é ainda reforçada pela noção de “estranhamento” que surge entre pais e adolescentes. Os pais podem não reconhecer seus filhos na adolescência, usando as diferenças percebidas como uma razão para o não reconhecimento.. Este afastamento é mútuo, uma vez que os adolescentes também vivenciam o seu ambiente familiar familiar como diferente. Essa distância emocional e a falta de reconhecimento podem dificultar a comunicação, com ambos os lados alegando que não se entendem mais..
O texto também aborda a dificuldade que os adultos enfrentam em processar a própria adolescência. Sugere que é impossível recordar e processar totalmente a própria adolescência , o que contribui para a falta de compreensão das experiências dos filhos..
Além disso, Calligaris (2000), em “Cópia de A Adolescencia Calligaris, Contard .pdf”, oferece uma perspectiva semelhante. Ele discute como a adolescência é uma poderosa construção cultural .e que os adultos muitas vezes olham para os adolescentes através desta lente. Os adultos podem ter visões idealizadas ou negativas da adolescência com base em suas próprias experiências passadas ou mitos sociais. Essa noção preconcebida, potencialmente decorrente de uma adolescência pessoal mal compreendida, pode impedir ainda mais a compreensão genuína da jornada única dos próprios filhos na adolescência.
Em essência, Corso e Corso argumentam que a barreira para a compreensão reside na própria história adolescente não resolvida ou inacessível do adulto. Sem uma compreensão clara de suas próprias experiências formativas durante a adolescência, os adultos estão mal equipados para empatizar ou compreender os desafios e mudanças pelos quais seus filhos estão passando.. Essa falta de autoconsciência desde a adolescência os impede de transpor a lacuna geracional e promover uma comunicação eficaz.
- Comente uma outra afirmação de Mário e Diana Corso (1997): “Os pais jogam
os filhos no dever de serem órfãos, ou seja, de serem livres deles”.
destaca uma dinâmica peculiar nas relações modernas entre pais e filhos, moldada pela ênfase no individualismo.
Corso e Corso explicam que este “dever de ser órfão” surge do desejo dos pais de não influenciar indevidamente os destinos dos seus filhos ou de os sobrecarregar com os seus próprios desejos explícitos. Não se trata necessariamente de negligência, mas sim de uma escolha consciente decorrente das próprias incertezas dos pais sobre o que constitui um “bom destino” em uma sociedade individualista. Sentindo-se inseguros, eles podem pensar que seus filhos estão mais bem equipados para escolher seus próprios caminhos. Esta postura parental impõe implicitamente às crianças a responsabilidade de serem livres e independentes das expectativas e trajetórias de vida dos seus pais..
Esta noção conecta-se com o tema mais amplo da família nuclear moderna, fundada no amor livre e idealmente trabalhando para libertar a criança de si mesma.. Os pais veem-se cada vez mais como exemplos humanos de destinos possíveis, em vez de guias a serem seguidos rigorosamente. O caminho da criança é muitas vezes orientado para preencher as lacunas deixadas pelas falhas percebidas pelos pais.
No entanto, isso pode criar um paradoxo. Enquanto os pais expressam a importância da felicidade dos filhos em qualquer escolha que façam,, essa liberdade pode parecer um abandono porque as crianças ficam sem referenciais claros, mesmo aqueles que as oponham. Surge a pergunta: como podemos ser verdadeiramente livres daqueles que têm tantas esperanças e expectativas sobre nós??
Isto também ressoa com a perspectiva de Contardo Calligaris (2000) sobre a “moratória” da adolescência. Os adolescentes são mantidos num estado de dependência, apesar da sua maturação física, ao mesmo tempo que lhes é dito o valor supremo da autonomia e da independência. Os pais, incorporando esse ideal moderno de independência, podem empurrar seus filhos nessa direção, contribuindo inadvertidamente para esse “dever de ser órfão” antes mesmo que a “moratória” social seja totalmente suspensa.
Além disso, a própria “adolescentefobia” dos pais , conforme descrita por Corso e Corso, onde eles veem seus filhos adolescentes como uma fonte constante de ansiedade, pode ser outra manifestação desse desejo por separação e independência, embora motivado pelo medo e não apenas por um desejo consciente pela liberdade da criança.
Em essência, Corso e Corso argumentam que esse impulso parental para promover a independência, embora aparentemente positivo, pode fazer com que os adolescentes sintam que devem trilhar seus próprios caminhos sem a orientação clara ou mesmo as expectativas explícitas de seus pais, ficando assim “órfãos” em termos de direção familiar clara e pontos de referência.. Isso contribui para o estranhamento sentido entre pais e adolescentes, como discutido anteriormente, tornando a comunicação e a compreensão mútua mais desafiadoras.
Game Over
“Game over” como metáfora para sentimentos parentais: A chegada da adolescência nos filhos pode evocar uma sensação de “game over” para os pais. Isso significa um sentimento de que seu tempo de controlar e influenciar fortemente a vida de seus filhos acabou. Apesar da necessidade contínua de cuidados parentais, os pais vivenciam uma perda de eficácia em seus papéis tradicionais, como se “os controles não funcionassem mais”..
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A “Morte do Ideal”: Para os pais, a adolescência marca a “morte do ideal”. O “sonho acabado” que eles vivenciam é a percepção de que a versão idealizada de seu filho, uma personificação perfeita de suas aspirações, não se realizará.. Este confronto com a realidade imperfeita do filho adolescente é uma experiência traumática para os pais.
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Ruptura e Perda para os Pais: Embora muito se fale sobre a perda da infância do adolescente, Corso e Corso argumentam que os pais também são profundamente afetados, vivenciando uma sensação de perda da criança que conheceram – o “corpinho de criança tão bom de apertar e cheirar” – e seu antigo papel como figuras poderosas e amadas.. A adolescência significa uma ruptura onde a criança deixa de ser simplesmente uma posse dos pais.
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Quebra de Comunicação e Ignorância Proclamada: Um aspecto significativo desta fase é a impossibilidade de comunicação. Os adolescentes tornam-se silenciosos e retraídos, enquanto as tentativas de conversa muitas vezes levam a argumentos improdutivos. Tanto os pais quanto os adolescentes afirmam que “não entendem mais nada”. Corso e Corso sugerem que esta ignorância proclamada é uma característica definidora da relação adulto-adolescente.
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A incapacidade do adulto de conhecer a adolescência: Os autores postulam que “a impossibilidade de saber sobre a adolescência advém da impossibilidade de saber sobre a sua adolescência!” (a impossibilidade de saber da adolescência vem da impossibilidade de saber da própria adolescência!). Os adultos têm dificuldade em recordar e processar as suas próprias experiências na adolescência, o que torna difícil compreender a jornada dos seus filhos..
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Dessidealização e estranhamento mútuos: A adolescência envolve uma desidealização de ambas as partes – pais e filhos.. Os adolescentes descobrem que os pais têm falhas, enquanto os pais veem a imagem idealizada do filho desaparecer. Isso leva ao “estranhamento” , onde o ambiente familiar familiar parece estranho ao adolescente, e os pais não conseguem reconhecer o filho nessa nova forma. Este sentimento do familiar se tornando externo e estranho é vivenciado tanto pelos pais quanto pelos adolescentes.
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Estranheza e Agressividade: Esse estranhamento pode criar distanciamento e até abrir portas para a agressividade. As diferenças são muitas vezes exageradas como forma de estabelecer a separação.
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O “Dever de Ser Órfão”: Alguns pais, incertos sobre o que constitui um bom caminho de vida para os seus filhos, podem implicitamente empurrá-los para a independência, criando um “ dever de ser órfãos, ou seja, de serem livres deles”. Embora pareça promover a liberdade, isso pode fazer com que os adolescentes se sintam abandonados e sem orientação clara.
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“Adolescentofobia”: Os pais também podem desenvolver “adolescentefobia” , onde temem a vitalidade e o potencial dos seus filhos adolescentes, contrastando-os com os seus próprios sentimentos de envelhecimento e impotência..
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A necessidade de reconexão: Os autores sugerem que a solução passa por um “reatamento das pontes” entre pais e filhos. Isso requer um processo de re-historicização de suas relações, permitindo que ambas as partes se reconheçam de uma nova maneira, quase em um nível racional e narrativo..
Função dos grupos
- Função de espelho e identificação
O grupo permite ao adolescente se reconhecer no outro e construir uma nova imagem de si.
Por meio da identificação com os pares, ele se distancia da imagem infantil e começa a elaborar uma nova identidade.
Esse movimento é importante para a reconstrução do Eu, especialmente diante dos lutos da infância (como falam Aberastury e Knobel). - Espaço de pertencimento
O grupo funciona como um espaço de acolhimento simbólico em que o adolescente se sente pertencente — algo fundamental em uma fase marcada por dúvidas e inseguranças.
Ajuda a lidar com o sentimento de desencaixe e solidão que a ruptura com os pais pode causar. - Suporte na elaboração dos lutos
Ao sair da infância, o adolescente precisa fazer lutos simbólicos (do corpo infantil, dos pais idealizados etc.).
O grupo, por ser menos ameaçador do que o adulto, oferece apoio emocional e afetivo nesse processo. - Ensaio de relações sociais
O grupo é onde o adolescente experimenta papéis sociais, testa limites, negocia regras e convive com o desejo do outro — o que é central na formação subjetiva. - Defesa contra angústias internas
Em alguns casos, o grupo pode também funcionar como uma defesa contra conflitos psíquicos, quando o adolescente se dissolve no coletivo para fugir de angústias individuais.
Isso pode aparecer em grupos muito rígidos ou violentos, onde a identidade individual se apaga em prol do grupo (a psicanálise alerta para isso como risco).
Mecanismos Egoicos
Principais mecanismos egoicos presentes na adolescência (e nos grupos):
1. Projeção
Atribuir ao outro aquilo que não se consegue reconhecer em si mesmo.
Ex: “Ele me odeia” pode, na verdade, ser o adolescente lidando com seus próprios sentimentos hostis ou inseguros.
2. Identificação
O adolescente se identifica com figuras do grupo para formar sua identidade.
Isso pode ser saudável (como experimentar novos modos de ser) ou defensivo (apagar-se no grupo para fugir da angústia da individualidade).
3. Formação Reativa
Agir de forma oposta a um desejo inaceitável.
Ex: um adolescente pode zombar de comportamentos afetivos ou sensíveis por medo de parecer frágil.
4. Racionalização
Justificar atitudes ou sentimentos com argumentos “lógicos”, para não entrar em contato com o verdadeiro motivo inconsciente.
Ex: “Eu só fumo porque estou estressado com os estudos” — quando pode haver um desejo de transgressão ou pertencimento.
5. Negação
Recusar-se a aceitar uma realidade dolorosa.
Muito comum quando o adolescente nega mudanças corporais ou emocionais.
6. Regressão
Retorno a comportamentos mais infantis frente a angústias.
Pode aparecer em crises ou momentos de frustração intensa.
7. Deslocamento
Transferir sentimentos de uma pessoa (ou situação) para outra, menos ameaçadora.
Ex: brigar com um amigo depois de uma discussão com os pais.
E nos grupos?
Os grupos de adolescentes muitas vezes funcionam como reforço desses mecanismos, especialmente identificação, projeção e negação.
O grupo pode ser espaço de proteção (quando bem conduzido) ou de reforço de defesas rígidas (como em grupos violentos, muito fechados ou excludentes).