AÇÃO RESCISÓRIA E RECLAMAÇÃO Flashcards
(36 cards)
Em quais hipóteses é cabível o ajuizamento de reclamação?
As hipóteses de cabimento estão previstas no art. 998 do CPC.
a) preservar a competência do tribunal;
Visa-se evitar que órgãos jurisdicionais inferiores usurpem a competência dos tribunais. Interessante caso de aplicação dessa hipótese ocorre quando o juízo singular não recebe a apelação interposta contra a sentença, afirmando que esta não cumpriu com os requisitos de admissibilidade. É que no novo CPC, o juízo de admissibilidade da apelação compete exclusivamente aos tribunais de segundo grau (art. 1.010, §3º, do NCPC). Dessa forma, da decisão do juízo de primeiro grau que inadmite a apelação não mais é cabível agravo de instrumento, mas sim reclamação, a ser dirigida ao tribunal de segundo grau.
b) garantir a autoridade das decisões do tribunal;
Em regra, tal hipótese de cabimento estará condicionada a existência de uma decisão
judicial do tribunal, que gere efeitos “erga omnes”. Contudo, é possível ainda o uso da
reclamação em processos que gerem efeitos apenas para as partes, como no caso em que o juízo singular deixe de cumprir uma decisão de um tribunal superior, que, por exemplo, determina a soltura do réu, em uma ação de alimentos.
c) garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
- A primeira hipótese, relacionada ao descumprimento de súmula vinculante, foi disciplinada por meio da Lei 11.417/06. A referida lei determina o cabimento de reclamação para o STF no caso de decisão judicial ou ato administrativo que contrariar, negar vigência ou aplicar indevidamente entendimento consagrado em súmula vinculante.
- Já a segunda hipótese, diz respeito às ações de controle de concentrado de constitucionalidade, uma vez que estas possuem efeitos vinculantes contra os demais órgãos do Poder Judiciário e para o Poder Executivo, além de efeitos “erga omnes”. Assim, o cabimento da reclamação é uma decorrência lógica dessas características do controle concentrado.
d) garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência;
Nesse caso, estabelece o §4º do art. 988 do CPC, que a observância dos aludidos precedentes vinculantes compreende a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. Dessa forma, como o art. 489, §1º, V, do NCPC exige, na fundamentação da decisão, que o órgão julgador identifique os fundamentos determinantes do precedente vinculante, já para demonstrar o seu cabimento ou não ao caso concreto, será a partir dessa decisão que a parte terá condição de analisar o cabimento da reclamação contra a decisão.
e) garantia da observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos
Nos termos do §5º, inciso II, o cabimento da reclamação nesses casos está condicionado ao esgotamento das instâncias ordinárias. Por esgotamento das “instâncias ordinárias” deve ser entendido a proibição do uso de reclamação contra sentença de primeiro grau. Somente nos casos de acórdãos que desrespeitem precedentes fixados em julgamentos de recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida, ou nos casos de recursos especiais ou extraordinários, julgados com a técnica de recursos repetitivos é que será cabível a reclamação.
Do mesmo modo, não será cabível reclamação da decisão monocrática do relator, já que nesse caso é possível o manejo de agravo interno (Art. 1.021, caput).
Quem detém legitimidade para o ajuizamento de reclamação?
Podem propor reclamação a parte interessada e o Ministério Público.
- A parte interessada não necessariamente precisa estar no processo em cujos autos foi proferida a decisão atacada, sendo cabível, ainda, reclamação por parte de terceiros interessados. O interesse, nesse caso, deverá ser demonstrado concretamente pela parte interessada.
- Por sua vez, o Ministério Público possui legitimidade em razão de sua condição de fiscal da ordem jurídica. Dessa forma, não há necessidade de ele ser parte no processo. Existe um interesse público intrínseco no respeito à competência, à autoridade das decisões e precedentes vinculantes e, sendo a reclamação um dos meios de proteger esse respeito, decorre a legitimidade do Ministério Público para o caso.
Quais os requisitos da petição inicial da reclamação?
- A reclamação deve ser formalizada por meio de petição inicial. Inexistindo previsão expressa, aplica-se à petição inicial da reclamação constitucional o disposto no artigo 319 do CPC, mas somente naquilo que couber.
- O endereçamento deverá ser para o tribunal.
- Com relação a qualificação das partes, a do autor segue o procedimento comum. Contudo, no caso do réu, considerando que será sempre uma autoridade judiciária e administrativa que usurpa a competência ou desrespeita decisão proferida por tribunal, não será necessária a qualificação pessoal da autoridade, bastando a indicação do juízo ou da pessoa jurídica de direito público a qual pertence.
- A causa de pedir será a narração de uma das hipóteses de cabimento da reclamação.
- O pedido será de acolhimento e, dependendo da causa de pedir, será diferente a providência pretendida.
- No caso de usurpação de competência, é possível que baste ao autor que o tribunal profira decisão que tenha sido indevidamente proferida pelo órgão competente. No caso de desrespeito à decisão proferida pelo tribunal, é possível o pedido de cassação.
- O pedido de produção de provas é dispensado, já que a petição inicial já deve vir instruída com as provas desejadas, nos termos do art. 988, §2º, do CPC. Por fim, entende-se que não há citação, mas notificação da autoridade, da mesma maneira que ocorre no mandado de segurança.
Em qual prazo deve ser proposta a reclamação?
Por se tratar de uma ação constitucional, não há prazo processual para o ingresso da reclamação. Contudo, o CPC (Art. 988, §5º, I) estabelece que não cabe reclamação contra decisão judicial já transitada em julgada, porque nesse caso a reclamação faria as vezes de ação rescisória. No mesmo sentido o STF:
“Súmula 734 do STF - Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal.”.
Quais são as posturas possíveis do relator diante de uma reclamação?
“Art. 989. Ao despachar a reclamação, o relator:
I - requisitará informações da autoridade a quem for imputada a prática do ato
impugnado, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias;
II - se necessário, ordenará a suspensão do processo ou do ato impugnado para evitar
dano irreparável;
III - determinará a citação do beneficiário da decisão impugnada, que terá prazo de 15
(quinze) dias para apresentar a sua contestação.”.
Além da manifestação da autoridade a quem for imputada a prática do ato impugnado,
que sempre é necessário, o CPC permite que qualquer interessado possa impugnar o pedido do reclamante:
“Art. 990. Qualquer interessado poderá impugnar o pedido do reclamante.”.
Para que haja intervenção do terceiro interessado, este deverá demonstrar interesse
jurídico na decisão, é dizer, que possa ser atingido reflexamente em sua esfera jurídica. O terceiro, contudo, recebe o processo no estado em que ele se encontra. Por fim, o CPC também determina a manifestação do Ministério Público como fiscal da lei, caso não seja parte do processo:
“Art. 991. Na reclamação que não houver formulado, o Ministério Público terá vista do processo por 5 (cinco) dias, após o decurso do prazo para informações e para o oferecimento da contestação pelo beneficiário do ato impugnado.”.
De que forma será o julgamento da reclamação?
“Art. 992. Julgando procedente a reclamação, o tribunal cassará a decisão exorbitante de seu julgado ou determinará medida adequada à solução da controvérsia.”.
Na hipótese de ofensa à autoridade de decisão proferida pelo tribunal, a procedência da reclamação gera a cassação da decisão impugnada, de forma que o tribunal profere outra decisão em seu lugar (assim, não há reforma), nem determina que outra seja proferida (assim, não há anulação). Excepcionalmente, no caso de descumprimento de súmula vinculante, a própria Lei 11.417/06, determina que outra decisão seja proferida no lugar da decisão cassada, de forma que, nesse caso, haverá tecnicamente a anulação da decisão e não a cassação.
Em relação à usurpação de competência, a procedência do pedido leva o tribunal a praticar os atos necessários a preservação de sua competência.
Por fim, a lei determina que, mesmo antes da lavratura do acórdão que julga a reclamação, o presidente do tribunal determinará o cumprimento da decisão proferida:
“Art. 993. O presidente do tribunal determinará o imediato cumprimento da decisão, lavrando-se o acórdão posteriormente.”.
No que consiste a ação rescisória?
A ação rescisória possui natureza jurídica de ação. Cuida-se de uma espécie de sucedâneo recursal externo, é dizer, meio de impugnação que ocorre em processo diverso daquele no qual a decisão atacada foi proferida.
O NCPC exige para o manejo da ação rescisória que haja o trânsito em julgado da decisão, bem como que a decisão a ser impugnada seja de mérito, nos termos do artigo 966, ressalvado o disposto no §2º deste mesmo artigo.
Assim, pode-se conceituar a ação rescisória como uma ação autônoma que busca desconstituir decisões judiciais que geraram coisa julgada material.
No que consiste a rescindibilidade?
- A decisão rescindível não se confunde com a decisão nula ou decisão inexistente.
- Para que uma decisão possa ser desconstituída por meio de ação rescisória é necessário que ela exista juridicamente, já que aquilo que não existe não precisa ser desconstituído, bastando uma simples declaração de inexistência jurídica.
- Com relação às nulidades, a doutrina entende que todas elas são convalidadas com o trânsito em julgado. Assim, não é correta a ideia de que todas as nulidades absolutas autorizam o manejo de ação rescisória.
- Conclui-se, assim, que o vício de rescindibilidade não se confunde com inexistência, validade ou nulidade absoluta, sendo tão somente uma opção política do legislador, que prevê determinadas hipóteses em que a segurança jurídica gerada pela coisa julgada material poderá ser afastada pela ação rescisória.
Qual a extensão do conceito de “decisão de mérito” como objeto de uma ação rescisória?
O CPC prevê, expressamente, que as decisões de mérito são objeto da rescisória (Art. 966, caput). Ao falar em “decisões de mérito”, o CPC permitiu que não só as sentenças possam ser objeto de ação rescisória, mas também a decisão interlocutória de mérito, a decisão monocrática do relator e o acórdão. Exige a lei apenas que a decisão seja de mérito e tenha transitado em julgado.
Quais decisões de mérito não admitem a propositura de ação rescisória?
Nem todas as decisões de mérito poderão ser objeto de ação rescisória. Em algumas situações, o legislador, por uma opção política, retira a possibilidade de manejo de ação rescisória contra algumas decisões, mesmo que elas sejam de mérito. São elas:
a) acórdão proferido em ação direta de inconstitucionalidade ou ação declaratória de constitucionalidade (Art. 26, Lei 9.868/99);
b) acórdão proferido em arguição de descumprimento de preceito fundamental (Art. 12, Lei 9.882/99);
c) decisões proferidas nos juizados especiais (Art. 59, Lei 9.099/95).
É admissível ação rescisória parcial?
A ação rescisória poderá impugnar toda a decisão de mérito ou apenas parte dela, é dizer, o CPC admite o manejo de ação rescisória parcial, consubstanciada naquela que não impugna todos os capítulos da decisão:
“Art. 966. (…)
§3º - A ação rescisória pode ter por objeto apenas 1 (um) capítulo da decisão.”.
É possível o ajuizamento de ação rescisória ainda que não se trate propriamente de uma decisão de mérito?
O NCPC inovou no ordenamento jurídico ao prever algumas hipóteses de cabimento de ação rescisória:
Art. 966. (…)
§2º - Nas hipóteses previstas nos incisos do caput, será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, impeça:
I - nova propositura da demanda; ou
O dispositivo deve ser combinado com o art. 486, §1º, o qual prevê as hipóteses em que a repropositura da ação em determinadas hipóteses de extinção terminativa do processo depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.
II - admissibilidade do recurso correspondente.
O inciso II, que consagra a hipótese de cabimento de rescisória contra a decisão terminativa que impeça a admissibilidade do recurso correspondente é contrário ao entendimento do STJ sob a égide do CPC de 1973.
Até então, o STJ entendia pelo não cabimento de ação rescisória nesse caso, uma vez que não se trata de decisão meritória (AgRg no Resp 1.472.811/CE). Contudo, em razão da disposição expressa no novo CPC, tal entendimento resta superado.
É necessária a interposição de todos os recursos cabíveis para que se proponha a ação rescisória?
Salienta-se que todas as decisões que podem ser objeto de rescisória necessitam estar transitadas em julgado, caso contrário faltará interesse de agir ao autor, já que a decisão ainda poderá ser impugnada mediante recurso. Não se exige, contudo, que a parte esgote todos os recursos cabíveis contra a decisão a ser impugnada, basta que, no caso concreto, a parte tenha deixado de interpor o recurso eventualmente cabível contra a decisão, permitindo que ela transite em julgado. Essa é a inteligência da Súmula 514 do STF:
“Súmula 514 do STF - Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos.”.
a) Em que hipóteses é possível a propositura de ação rescisória?
- Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
O inciso I prevê três espécies de crimes que podem ser cometidos pelo juiz: a prevaricação (Art. 319, CP), concussão (Art. 316, CP) e a corrupção passiva (Art. 317, CP).
- Não se exige, para o ingresso da ação rescisória, que o magistrado tenha sido previamente condenado pelos crimes em questão ou mesmo que haja um processo criminal tramitando em razão da conduta do magistrado. Assim, o reconhecimento do crime poderá ocorrer originalmente, e de forma incidental, no juízo cível competente para o julgamento da ação rescisória.
- Em que pese não seja necessária a prévia investigação na esfera penal, havendo uma sentença penal transitada em julgado sobre os mesmos fatos, será necessário analisar o seu conteúdo.
- Caso a sentença seja condenatória, haverá vinculação obrigatória do juízo cível (art. 63 do CPP).
- Caso a sentença seja absolutória, será preciso investigar o seu fundamento. Se a sentença absolutória se fundamentou na inexistência material do fato, haverá vinculação obrigatória do juízo cível (arts. 66 do CPP e 935 do CC), mas sendo a absolvição por outro motivo, a decisão penal não vincula o juízo cível (art. 935 do CC).
- Caso haja a tramitação conjunta de ação penal e ação rescisória, é cabível a suspensão da rescisória, com fundamento no art. 315 do CPC, cabendo ao juízo cível a decisão acerca da conveniência e oportunidade da suspensão.
- Por fim, no caso em que a decisão a ser rescindida tenha sido tomada de forma colegiada (acórdão), nem sempre a existência de um juiz que pratique os crimes previstos no presente inciso dará ensejo a rescisão da decisão, sendo necessário que o voto desse juiz tenha concorrido para a maioria ou para unanimidade, considerando neste último caso a possível influência do juiz criminoso nos votos proferidos pelos outros integrantes do colegiado. Não será cabível ação rescisória na hipótese de o juiz criminoso proferir voto minoritário, superado pelos votos dos outros membros do colegiado que não estejam envolvidos na prática do crime.
Em quais hipóteses é possível o ajuizamento de ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;”.
Conforme o inciso II, somente nos casos que o juiz for impedido é que será possível o manejo de ação rescisória. Dessa forma, a suspeição do juiz não enseja o uso de ação rescisória. Ressalta-se, nesse sentido, que a doutrina entende que não é necessário que tenha havido a alegação de impedimento no processo originário. Nos casos de decisão colegiada, o STJ já decidiu não haver nulidade se o voto do juiz impedido não tenha sido decisivo para o resultado (Resp 1.008.792/RJ).
No caso de incompetência, somente a incompetência absoluta é causa de rescisão da decisão. Salienta-se que a doutrina entende que se a sentença proferida por juiz absolutamente incompetente for alvo de apelação, com o posterior julgamento do recurso pelo tribunal competente, não será cabível o uso de ação rescisória.
Por fim, a ação rescisória é admissível ainda que o impedimento do juiz ou a incompetência absoluta do juízo tenham sido arguidos e resolvidos no processo originário.
c) Em quais hipóteses é possível o ajuizamento de ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;”.
Nesse inciso, o legislador reuniu duas situações completamente distintas. A primeira situação diz respeito ao dolo ou a coação da parte vencedora (também pode ser do representante legal ou advogado) e tem relação com os princípios da lealdade e da boa-fé processual, mas só permite o manejo de ação rescisória quando o dolo ou a coação impedir ou dificultar a atuação processual do adversário, ou, ainda, quando influenciar significativamente o juiz, a ponto de afastá-lo da verdade. Exige-se, assim, que haja um nexo de causalidade entre o dolo e a coação da parte e o resultado do processo.
A colusão (simulação) entre as partes também foi regulada no art. 142 do CPC:
“Art. 142. Convencendo-se, pelas circunstâncias, de que autor e réu se serviram do processo para praticar ato simulado ou conseguir fim vedado por lei, o juiz proferirá decisão que impeça os objetivos das partes, aplicando, de ofício, as penalidades da litigância de má-fé.”.
a) Em quais hipóteses será cabível o ajuizamento de ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
IV - ofender a coisa julgada;”.
Inicialmente, será cabível ação rescisória sempre que houver ofensa ao efeito negativo da coisa julgada, que funciona como um pressuposto processual negativo, impedindo a propositura de demandas que envolvam as mesmas partes, pedido e objeto.
Também será possível o manejo de rescisória no caso de violação ao efeito positivo dacoisa julgada. Nesse caso, o juiz deixou de observar a coisa julgada já formada ao julgar uma demanda que estava vinculada a ela.
Em caso de conflito entre coisas julgadas, qual delas deverá prevalecer?
Em decisão publicada em 07/02/2020, a CORTE ESPECIAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, analisando a divergência entre as referidas turmas no julgamento dos Embargos de divergência em Agravo em recurso especial nº 600.811, uniformizou o entendimento no sentido de que, no conflito entre sentenças, PREVALECE AQUELA QUE POR ÚLTIMO TRANSITOU EM JULGADO, enquanto não desconstituída mediante Ação Rescisória”.
Segundo a Corte Especial, “este entendimento se alinha ao magistério de eminentes processualistas: “Em regra, após o trânsito em julgado (que, aqui, de modo algum se preexclui), a nulidade converte-se em simples rescindibilidade. O defeito, arguível em recurso como motivo de nulidade, caso subsista, não impede que a decisão, uma vez preclusas as vias recursais, surta efeito até que seja desconstituída, mediante rescisão (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, 5ª ed, Forense: 1985, vol. V, p. 111, grifos do original).
Na lição de Pontes de Miranda, após a rescindibilidade da sentença, “vale a segunda, e não a primeira, salvo se a primeira já se executou, ou começou de executar-se”. (Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed., t. 6. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 214). (EAREsp 600.811/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/12/2019, DJe 07/02/2020)”.
Em quais hipóteses poderá ser ajuizada ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
V - violar manifestamente norma jurídica;”.
Aqui, o cabimento de ação rescisória somente se justifica nos casos em que houver um erro crasso do juízo na aplicação do direito no caso concreto.
- Segundo o Superior Tribunal de Justiça, “na ação rescisória fundada em literal violação de lei, não cabe O REEXAME DE TODA A DECISÃO RESCINDENDA, para verificar se nela haveria OUTRAS VIOLAÇÕES À LEI NÃO ALEGADAS pelo demandante, mesmo que se trate de questão de ordem pública”. Na ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), a indicação de violação literal de disposição de lei é ônus do requerente, haja vista constituir a sua causa de pedir, vinculando o juízo rescidente aos dispositivos de lei apontados como literalmente violados. (REsp 1.663.326-RN, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 13/02/2020 – Informativo 665)
- O termo “norma jurídica” é abrangente, alcançando as normas:
a) materiais e processuais;
b) constitucionais e infraconstitucionais;
c) nacionais e estrangeiras.
A doutrina entende que ela inclui até mesmo os princípios não escritos. - Apesar da abrangência do termo, o STJ não admite o manejo de ação rescisória por ofensa à súmula (AR 4.112-SC, Min. Rel. Marco Aurélio Bellizze, julgada em 28/11/2012 - Informativo nº 0510 - Período: 18 de dezembro de 2012).
No entanto, a doutrina entende que é cabível ação rescisória no caso de súmula vinculante.
- Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais (Súmula 343 do STF).
Não obstante a redação da Súmula 343 do STF, o Supremo tem admitido a ação rescisória por “ofensa à literal disposição constitucional, ainda que a decisão rescindenda tenha se baseado em interpretação controvertida, ou seja, anterior à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal”, porque “a manutenção de decisões das instâncias ordinárias divergentes da
interpretação adotada pelo STF revela-se afrontosa à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional” (AR 1.478, DJe de 01/02/2012).
Interpretando-se a Súmula 343 do STF, conclui-se que “a ação rescisória, resta, então, cabível, se, à época do julgamento cessara a divergência, hipótese em que o julgado divergente, ao revés de afrontar a jurisprudência, viola a lei que confere fundamento jurídico ao pedido” (ERESP 908774/RJ).
O Superior Tribunal de Justiça vem relativizando a Súmula 343 do STF. A Segunda Seção assentou entendimento segundo o qual, “nas hipóteses em que, APÓS O JULGAMENTO, A JURISPRUDÊNCIA, AINDA QUE VACILANTE, TIVER EVOLUÍDO para sua pacificação, a rescisória pode ser ajuizada” (AR 3.682/RN, DJe de 19/10/2011). Com efeito, a relativização da Súmula n. 343/STF visa a conferir maior eficácia jurídica aos precedentes dos Tribunais Superiores, ou melhor, “à tese ou ao princípio jurídico (ratio decidendi) assentado na motivação do provimento decisório”, que é o precedente em sentido estrito.
Sem prejuízo do entendimento acima, o STJ entende que, mesmo que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tenha evoluído para pacificar determinada tese, em sentido contrário ao que havia sido decidido pelo acórdão rescindendo proferido pelo Tribunal local, somente será cabível a ação rescisória se “A CONTROVÉRSIA SEJA SOLUCIONADA POR MEIO DE PRECEDENTE COM EFICÁCIA VINCULANTE (art. 543-C do CPC/73 ou art. 927 do CPC/15), que unifica a interpretação e aplicação da lei” (REsp 1.655.722-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 14/3/2017, DJe 22/3/2017. Informativo nº 0600 - Publicação: 26 de abril de 2017).
e) Em quais hipóteses é possível o ajuizamento de ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;”
Nesta hipótese, o autor ou réu da ação originária obtém prova nova cuja existência era ignorada e que não pôde fazer uso por motivo alheio a sua vontade.
O CPC determina que para que a prova seja considerada nova, ela deve ter sido obtida pelo autor após o trânsito em julgado da decisão que se busca rescindir. Para que seja apta a fundamentar a ação rescisória, a prova nova deverá ter a aptidão de, por si só, assegurar um resultado positivo ao autor da ação rescisória.
Frise-se que, ao contrário do CPC/73, que permitia o ajuizamento de ação rescisória quando, “depois da sentença, o autor obtivesse DOCUMENTO NOVO, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável, o NCPC, em seu artigo 966, VII, permite o ajuizamento de ação rescisória quando “obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, PROVA NOVA cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável”. Ou seja, não se restringe mais à prova documental, sendo cabível ação rescisória em caso de qualquer prova nova.
f) Em que hipóteses é possível o ajuizamento de ação rescisória?
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(…)
VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.”
O último inciso do art. 966 versa sobre o chamado erro de fato. O próprio art. 966 determina o que se considera como erro de fato:
Art. 966. (…)
§1º - Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.
Portanto, para que uma ação rescisória tenha como fundamento o erro de fato é preciso o seguinte:
a) o erro de fato deve ser fundamento essencial da sentença;
b) a apuração do equívoco de fato deve ser realizada com base nas provas produzidas nos autos do processo originário, sendo proibida a produção de provas na própria ação rescisória;
c) o fato não pode representar ponto controvertido no processo originário. Inexistirá ponto controvertido quando as partes não aleguem e caberia ao juiz conhecer o tema de ofício, quando houve confissão de uma parte ou ainda quando a parte contrária se absteve de impugnar a alegação do fato;
d) inexistência de pronunciamento judicial a respeito do fato, entendendo-se que a má apreciação de prova não gera ação rescisória.
O NCPC excluiu alguma hipótese em que era cabível o ajuizamento de ação rescisória?
Cabe frisar que o artigo 966 excluiu do rol das hipóteses que admitem o cabimento da rescisória o fato de haver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença, que era previsto no artigo 485, VIII do CPC/73 (Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: VIII – houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença;).
O referido dispositivo trazia grande confusão quando comparado com a ação anulatória prevista no artigo 486 do CPC/73 (Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.).
- Segundo a doutrina majoritária, se o juiz, interpretando a confissão, desistência ou transação, julgasse procedente o pedido, caberia ação rescisória, nos termos do artigo 485, VIII do CPC/73. Se, por outro lado, o juiz simplesmente homologasse os atos de disposição de direitos, caberia ação anulatória na forma do artigo 486 do CPC/73.
Agora o NCPC acaba com a referida distinção (e confusão terminológica), passando a prever que “os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei”, conforme §4º do artigo 966 do CPC/15:
“Art. 966. (…)
§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.”.
Sendo assim, a ação anulatória se apresenta como medida adequada para os atos de disposição de direitos (confissão, desistência ou transação), bem como para os atos homologados pelo juízo.
1) Quem detém legitimidade para ajuizar ação rescisória?
“Art. 967. Têm legitimidade para propor a ação rescisória:
I - quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;”.
As partes que participaram do processo originário possuem legitimidade ativa para propor rescisória. Pouco importa aí como se deu a participação da parte, razão pela qual podem propor ação rescisória autor, réu, terceiros intervenientes, incluindo o assistente.
A sucessão, seja “inter vivos” ou “causa mortis” tornam os herdeiros ou sucessores legitimados à propositura da ação rescisória. A sucessão pode ter ocorrido antes ou depois do encerramento do processo originário, desde que não tenha havido a participação deles (sucessão processual) naquele processo.
No caso específico de ação baseada em confissão viciada por erro, dolo ou coação, o CPC estabelece que somente o confitente possui legitimidade para propor a rescisória, ficando os seus herdeiros legitimados apenas a continuar ação já iniciada:
“Art. 393. A confissão é irrevogável, mas pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação.
Parágrafo único. A legitimidade para a ação prevista no caput é exclusiva do confitente e pode ser transferida a seus herdeiros se ele falecer após a propositura.”.
Nesse caso, os herdeiros somente possuem legitimidade ativa superveniente.
2) Quem detém legitimidade para propor ação rescisória?
“Art. 967. Têm legitimidade para propor a ação rescisória:
(…)
II - o terceiro juridicamente interessado;”.
Terceiro juridicamente interessado é o sujeito que mantém com uma ou ambas as partes da demanda uma relação jurídica que tenha sido afetada com a decisão que se busca rescindir. Poderia ter atuado no processo originário como litisconsorte facultativo ou assistente, o que teria lhe garantido sua legitimidade como parte, mas por assim não ter procedido continua a ser terceiro.
3) Quem detém legitimidade para propor ação rescisória?
“Art. 967. Têm legitimidade para propor a ação rescisória:
(…)
III - o Ministério Público:
a) se não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a intervenção;
b) quando a decisão rescindenda é o efeito de simulação ou de colusão das partes, a fim de fraudar a lei;
c) em outros casos em que se imponha sua atuação;”.
A legitimidade do Ministério Público com base nesse inciso somente se justifica nos casos de ausência de intervenção do MP quando ela era necessária. Se for parte no processo, a legitimidade do MP terá por base o inciso I.