Ilicitude Flashcards
(40 cards)
Qual o conceito unitário de ilicitude?
É a relação de contrariedade entre o fato humano e as exigências do ordenamento jurídico penal, representando uma lesão ou ameaça a bens jurídicos protegidos.
Quais os sinônimos para excludentes de ilicitude?
Justificantes ou descriminantes
Por que se diz que excludentes de ilicitude atuam no conceito analítico de fato punível como um verdadeiro tipo permissivo?
O tipo penal é proibitivo, pois veicula uma conduta que é proibida, que se pretende coibir. A excludente de ilicitude, para a doutrina, não é a mera exclusão da ilicitude, não é um mero obstáculo ou impedimento ao juízo de ilícito, mas uma conduta permitida pelo ordenamento jurídico. Nesse sentido, um tipo permissivo.
Quais são as quatro justificantes, ou excludentes de ilicitude, previstas em lei? E qual é a justificante supralegal?
LEGAIS
- Estado de necessidade (art. 23, I, do CP)
- Legítima defesa (art.23, II, do CP)
- Estrito cumprimento de um dever legal (art. 23, III, do CP)
- Exercício regular de um direito (art. 23, III, do CP)
SUPRALEGAL
O consentimento do ofendido
Para que um agente atue amparado por uma causa excludente de antijuridicidade, deve querer conscientemente fazê-lo? Em outras palavras, deve ter consciência de que se encontra sob a égide de uma descriminante e ter a vontade de dela se valer?
Teoria objetiva e subjetiva
Me parece que a teoria mais atual é a subjetiva
Há duas teorias disputando a resposta a esta pergunta. A TEORIA OBJETIVA, ligada a autores adeptos do sistema causalista do fato punível, defendem a cisão do injusto em uma face objetiva (tipicidade + antijuridicidade) e subjetiva (culpabilidade e seus elementos). Como entendem que a antijuridicidade (o que inclui a ilicitude) é fato objetivo, para eles não há como incluir questões subjetivas nas causas de sua exclusão (como é, no caso da questão, a consciência da justificante).
A TEORIA SUBJETIVA, de seu turno, exigirá os elementos subjetivos para fazer incidir uma causa de justificação. Se vc enxerga a justificante como um tipo de permissão, sua estrutura de aplicação é a mesma dos tipos de proibição, o que inclui também o aspecto subjetivo, a intenção do agente.
O que é a justificante do estado de necessidade?
Sacrifício de um bem jurídico para salvar outro
Pode-se o conceituar como sendo o sacrifício de um bem juridicamente protegido, para salvar de perigo atual e inevitável outro bem juridicamente protegido do próprio agente ou de um terceiro, desde que outra conduta, nas circunstâncias concretas, não fosse razoavelmente dele exigível pelo ordenamento. O CP assim diz:
Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. § 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever _legal_ de enfrentar o perigo. § 2º Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.
Qual a diferença entre o estado de necessidade justificante e o estado de necessidade exculpante?
Igualdade de valor entre os bens sacrificados
Ou mera inexigência de conduta diversa, sem equivalência entre os bens jurídicos
(…) um arqueólogo que há anos buscava uma relíquia valiosa, para salvá-la de um naufrágio, deixa perecer um dos passageiros do navio. (…) É natural que o sacrifício de uma vida humana não pode ser considerado razoável para preservar-se um objeto, por mais valioso que seja. Entretanto, no caso concreto, seria demais esperar do cientista outra conduta, a não ser a que ele teve, pois a decisão que tomou foi fruto de uma situação de desespero, quando não há tranquilidade suficiente para sopesar os bens que estão em disputa. Não poderá ser absolvido por excludente de ilicitude, visto que o direito estaria reconhecendo a supremacia do objeto sobre a vida humana, mas poderá não sofrer punição em razão do afastamento da culpabilidade (juízo de reprovação social).
ATENÇÃO!
Doutrina e jurisprudência majoritárias se inclinam no sentido de que o CP, em razão dos delineamentos normativos que trouxe para o estado de necessidade, teria adotado a teoria unitária, pela qual se mostra imprescindível realizar esse sopesamento entre os bens jurídicos, e somente há de se reconhecer a incidência do instituto nos casos em que o bem sacrificado fosse menor ou de igual valor em comparação com o defendido. Rejeita-se, majoritariamente, portanto, a teoria diferenciadora, que faz as distinções acima citadas:
O CPM (Código Penal Militar) adotou a teoria diferenciadora, de forma expressa.
Qual a diferença entre estado de necessidade agressivo e estado de necessidade defensivo? Há alguma consequência prática dessa distinção?
A ação contra a origem do perigo ou terceiros?
O estado de necessidade agressivo gera necessidade de indenização
No estado de necessidade defensivo, o agente pratica o ato necessário contra a COISA da qual emana o perigo para o bem jurídico.
No estado de necessidade agressivo, o agente pratica o ato necessário contra uma COISA OU PESSOA diversa da qual emana o perigo (como a pessoa que toma um veículo alheio para salvar a vida de alguém, sem pedir permissão ao proprietário).
A diferença entre esses dois, dessas duas situações de necessidade, está na indenização, porque, no defensivo, não haverá dever de indenizar; e, no estado de necessidade agressivo, haverá necessidade de indenizar aquele terceiro lesado.
Por que o estado de necessidade defensivo é necessariamente contra uma coisa, e não contra uma pessoa?
Se o perigo vem de uma pessoa, é legítima defesa
No estado de necessidade defensivo, o perigo emana de uma coisa, e não de uma pessoa. Não se inclui no estado de necessidade defensivo a pessoa, eis que quando o perigo emana de um ser humano e contra este se volta a conduta do agente, teremos, por via de regra, hipótese de legítima defesa e não de estado de necessidade).
ATENÇÃO!
No estado de necessidade agressivo, a ação pode ser contra uma pessoa (já que o perigo não vem dessa pessoa).
Quais são os seis requisitos, elencados pela doutrina, para configuração da justificante do estado de necessidade?
- Existência de perigo atual
- Involuntariedade na geração do perigo
- Inevitabilidade do perigo e da lesão
- Proporcionalidade entre o sacrifício do bem ameaçado e o valor do bem protegido
- Proteção a direito próprio ou de terceiro
- Ausência de dever legal de enfrentar o perigo
A doutrina elenca seis requisitos para a configuração do estado de necessidade, sendo um deles a existência de perigo atual. Qual a problematização que se faz acerca dele?
O perigo iminente
Parcela da literatura tende a realizar uma interpretação expansiva do dispositivo, mencionando também os casos de perigo iminente, desde que objetivamente e imediatamente observável e com certeza ou alta probabilidade da ocorrência do dano.
A doutrina elenca seis requisitos para a configuração do estado de necessidade, sendo um deles a involuntariedade na geração do perigo. Qual a problematização que se faz acerca dele?
E o perigo culposo?
Involuntariedade na geração do perigo é a impossibilidade que se tem de se alegar o estado de necessidade àquele que deu causa ao seu pressuposto, o perigo. Dessa maneira, a geração do perigo precisa vir de um terceiro ou de um fato não provocado pelo defendente.
Um problema de difícil solução estará contido nos casos de valoração da vontade e no debate sobre se ela poderá dar origem a um perigo de maneira dolosa e culposa ou somente a título doloso. Sobre isso, ensina Magalhães Noronha (1967, p. 191):
A nós nos parece que também o perigo culposo impede ou obsta o estado de necessidade. A ordem jurídica não pode homologar o sacrifício de um direito, favorecendo ou beneficiando quem já atuou contra ela, praticando um ilícito, que até pode ser crime ou contravenção. Reconhecemos, entretanto, que na prática é difícil aceitar solução unitária para todos os casos. Será justo punir quem, por imprudência, pôs sua vida em perigo e não pôde salvar-se senão lesando a propriedade alheia?
Guilherme Nucci, de seu turno, defende que a ponderação deve ser feita no caso concreto.
A doutrina elenca seis requisitos para a configuração do estado de necessidade, sendo um deles a ausência de dever legal de enfrentar o perigo. Qual a problematização que se faz acerca dele?
Dever legal ou normativo?
Caso do segurança covarde
São os termos do art. 24, § 1º, do CP: “Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.” Discute-se, entretanto, se “dever legal” é somente o advindo da lei em sentido estrito (posição de Nélson Hungria (1958, p. 279-280)) ou o advindo de outras fontes de dever jurídico, como um contrato, um regulamento ou a assunção de um dever de garantidor (posição de Antônio Bento de Faria (1961, p. 197)).
Pense no caso do segurança, cujo dever de proteção é contratual, e não legal. Ele pode alegar estado de necessidade se deixar o seu cliente exposto a perigo quando foi contratado para enfrentá-lo?
Como o Código Penal define a descriminante da legítima defesa?
Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
Quais os dois prismas da legítima defesa, segundo Jescheck?
a) Prisma jurídico-individual: trata-se do direito estabelecido em favor de todo cidadão de defender os seus bens jurídicos de agressões injustas.
b) Prisma jurídico-social: trata-se do preceito segundo o qual o jurídico não deve ceder ao injusto, entretanto, a reação do ordenamento face à sua violação deve se dar de maneira limitada à graduação do próprio injusto.
Quais são os requisitos da legítima defesa em relação à agressão? E em relação à repulsa da agressão?
RELATIVOS À AGRESSÃO
- Injustiça.
- Atualidade ou iminência.
- Contra direito próprio ou de terceiro.
RELATIVOS À REPULSA DA AGRESSÃO
- Utilização de meios necessários.
- Moderação no uso desses meios.
O que é a agressão, no contexto da legítima defesa? Ela a distingue de que outra figura justificante?
É a conduta humana, ativa (comissiva) ou negativa (omissiva) que põe em perigo ou efetivamente causa dano a um interesse juridicamente protegido. Cuida-se, inclusive, do critério distintivo nodal entre a legítima defesa e o estado de necessidade: este não provém de uma conduta humana, enquanto aquela, necessariamente.
A defesa contra um ataque sofrido por animal é legítima defesa ou estado de necessidade?
Animal agiu como instrumento de uma pessoa?
Causa discussão na doutrinária o problema dos ataques sofridos por animal, que tende a ser solucionado pelo seguinte critério:
Defesa contra animal que agiu independentemente de conduta humana prévia: é caso de estado de necessidade, se presentes todos os seus outros pressupostos.
Defesa contra animal que agiu como um instrumento de uma pessoa: é caso de legítima defesa, se presentes todos os seus outros pressupostos.
Um dos requisitos da legítima defesa, relativos à agressão, é a sua injustiça. Qual a problematização que a doutrina faz sobre o tema?
Injustiça do ponto de vista de quem?
Há duas posições doutrinárias:
DO PONTO DE VISTA DO AGRESSOR, “injustiça” se confunde com antijuridicidade. Significa que haverá uma agressão injusta toda vez que a conduta do agressor for típica e não estiver abarcada por uma causa justificante. De outro ponto de vista, somente haverá legítima defesa contra uma conduta humana que seja formal e materialmente típica e que, além disso, não tenha sido perpetrada sob a égide de um tipo permissivo. É a opinião de autores como Aníbal Bruno, Assis Toledo e Marcello Jardim Linhares.
DO PONTO DE VISTA DO AGREDIDO, “injusta” é a agressão que simplesmente não precisa ser suportada, independentemente de eventual tipificação ou ausência de antijuridicidade penal. Tende a ser a postura minoritária na doutrina.
Um dos requisitos da legítima defesa, relativos à agressão, é a sua atualidade ou iminência. Nesse contexto, pergunta-se: é possível a legítima defesa contra agressão futura?
Não é possível haver legítima defesa contra agressão futura (evitável ou não). A iminência da agressão é outra coisa. Os casos de defesa contra agressão futura inevitável não serão abarcados pela legítima defesa, mas pelas CAUSAS EXCULPANTES, notadamente a do estado de necessidade eximido de culpabilidade ou pela inexigibilidade de conduta diversa.
O que é a agressão iminente? E a agressão futura? (dentro do contexto da legítima defesa).
A doutrina tende a divergir na conceituação de uma agressão iminente, e não raras vezes limita-se a explicar com o seguinte critério:
_Atual_ é o que está acontecendo (presente), enquanto iminência é o que está em vias de acontecer (futuro imediato). Diferentemente do estado de necessidade, na legítima defesa admitem-se as duas formas de agressão: atual ou iminente. Tal postura legislativa está correta, uma vez que a agressão iminente é um perigo atual, portanto passível de proteção pela defesa necessária do art. 25. Não é possível haver legítima defesa contra agressão futura ou passada, que configura autêntica vingança, tampouco contra meras provocações, pois justificaria o retorno ao tempo do famigerado duelo (NUCCI, 2017, p. 459).
O critério, entretanto, muitas vezes, pode se mostrar reducionista. Parcela da doutrina, então, se vale das teorias próprias do iter criminis, notadamente as de diferenciação entre fim dos atos preparatórios (impuníveis como regra) e começo de execução punível (nos moldes, ao menos do art. 14, II, do CP; no contexto do delito tentado). Sob essa perspectiva, então, agressão atual será aquela que, do ponto de vista do “caminho do crime” percorrido pelo autor, já ingressou no início de execução punível, ou seja, já está, no mínimo, atingido pela norma do art. 14, II, CP; agressão iminente, a seu turno, será aquela que, também do ponto de vista do “caminho do crime”, encontra-se nos atos imediatamente anteriores, de acordo com o plano individual do autor, ao início da execução punível.
Um dos requisitos da legítima defesa, relativos à agressão, é que a agressão seja contra direito próprio ou de terceiro (exclui-se, assim, a defesa contra um interesse juridicamente desprotegido). Nesse contexto, pergunta-se: e se o terceiro não der seu consentimento para a defesa?
O direito é indisponível?
Um problema polêmico se encontrará nos casos de legítima defesa de terceiro e ausência de consentimento do defendido. A literatura tende, majoritariamente, a trabalhar com o direito em conflito. Em havendo um direito indisponível, como a vida, será natural que não se exija consentimento do defendido para que o defendente atue; em hipóteses de direito disponível, uma opção do terceiro agredido por suportar a injusta agressão manejada em seu desfavor tenderá a ser válida.
Um sujeito em desfavor de quem se dirige uma injusta agressão deve fugir ao conflito, se possível fazê-lo, ou está autorizado a defender-se, segundo o critério da legítima defesa?
Tipo permissivo
Um possível problema que se mostra, no caso, é o chamado commodus discessus (“a saída mais cômoda”). Indaga-se em doutrina se um sujeito em desfavor de quem se dirige uma injusta agressão deve fugir ao conflito, se possível fazê-lo, ou se estará autorizado a defender-se.
A resposta majoritária da doutrina tende a ser no sentido negativo, eis que, como já mencionado, as causas justificantes são autênticos tipos permissivos, autorizações de ação. Em outras palavras, defender-se legitimamente é um direito albergado pelo ordenamento, e a ninguém se dirige uma suposta obrigação de suportar o injusto.
Parcela da literatura, entretanto, costuma apontar certos limites ético-sociais à legítima defesa, estabelecendo que, embora não precise fugir ao conflito, em situações peculiares e muito específicas, essa saída será conforme ao direito, em vez da repulsa à agressão. São os casos, por exemplo, de defesa contra agressão mínima de deficiente mental e outros de mesmo gênero, nos quais a repulsa à agressão expandirá grosseiramente os limites do conflito, causando muito mais danos do que a mera e simples evitação.
O que são os ofendículos e como eles se relacionam com a ideia de legítima defesa?
Cercas elétricas
Ofendículos são dispositivos de defesa de acionamento automático predispostos para a proteção de certos bens jurídicos (em geral, materiais), tais como as cercas elétricas ou os cacos de vidro no muro. Parte da doutrina os vê como um exercício regular do direito de defesa da propriedade (o enfoque é a análise quando do momento de instalação dos dispositivos); outra parte, como uma legítima defesa pré-ordenada (aqui, o enfoque da análise se dá no instante de funcionamento do obstáculo).
Há ainda quem veja uma natureza dúplice, juntando as duas ideias anteriores. sob o enfoque da predisposição dos ofendículos eficazes para a produção de efeitos, ter-se-á o exercício regular do direito; sob o enfoque do acionamento futuro e eventual dos mecanismos, legítima defesa pré-ordenada. É nesse sentido, por exemplo, a construção de Damásio de Jesus (1999, p. 396).