Iter Criminis Flashcards
(93 cards)
O que é o iter criminis?
O caminho do crime
O iter criminis é uma palavra em latim que expressa a ideia de caminho do crime. Quando trabalhamos o iter criminis, trabalhamos, na verdade, a tentativa, a existência de tentativa ou crime consumado e outros institutos relacionados à tentativa. Vamos lá!
Quais são os estágios possíveis do cometimento de um crime?
Cogitação, preparação, execução e consumação
e em alguns crimes, o exaurimento
- o primeiro deles é a cogitação: você pensa em cometer o crime;
- o segundo são os atos preparatórios: você sai dessa esfera interna do pensamento e já realiza algumas condutas (portanto, você exterioriza esse plano), mas ainda não inicia a execução do crime. Exemplo: você obtém informações na internet sobre a vítima. Isso são atos preparatórios;
- depois dos atos preparatórios vêm os atos de execução: são, realmente, já considerados o início de execução do crime, são, portanto, puníveis a título de tentativa;
- depois dos atos de execução, temos a consumação. Exemplo: em um homicídio, a vítima morre;
- é possível, ainda, enxergar, em alguns crimes, o chamado exaurimento.
Quais atos do iter criminis não são puníveis?
Cogitação e atos preparatórios
A cogitação e os atos preparatórios são impuníveis, não se pode punir alguém por pensar em cometer um crime; não se pode punir alguém por, licitamente, comprar uma arma para cometer esse crime. Se essa compra é lícita, não há crime ainda de tentativa de homicídio. Então, as duas primeiras etapas são impuníveis, só haverá possibilidade de punição a partir da terceira etapa.
Mas atenção! A Lei Antiterrorismo (Lei n° 13.260/2016) prevê a punição de atos preparatórios de terrorismo quando realizado com o propósito inequívoco de consumar o delito.
Qual é a natureza e a definição jurídica da tentativa?
Defeito no tipo objetivo
com preenchimento do tipo subjetivo
A tentativa é um defeito no tipo objetivo (de alguma forma, o resultado previsto no tipo não foi atingido), mas com o preenchimento do tipo subjetivo (a intenção, o dolo estão presentes).
Seus elementos são:
- início de execução (não bastam os atos preparatórios)
- não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente
Quando há um início de execução, apto a caracterizar a tentativa?
Três teorias, uma delas não utilizada
TEORIA MATERIAL-OBJETIVA
Para a teoria material-objetiva, ato de execução é o que produz perigo para o bem jurídico. Não é adotada, pois é muito vaga e gera insegurança.
TEORIA FORMAL-OBJETIVA
Para a teoria formal-objetiva, haverá início de execução quando se inicia a realização do núcleo do tipo (início da execução típica). Em um homicídio, não basta apontar a arma para a cabeça da vítima, é preciso puxar o gatilho.
TEORIA SUBJETIVO-OBJETIVA
Para a teoria subjetivo-objetiva, haverá ato execução mesmo quando este não for típico, mas anteceder diretamente o ato típico e conduzir, segundo o plano do autor, ao exercício da ação típica. No mesmo exemplo, apontar a arma para a cabeça da vítima já é tentativa.
Por que se pune a tentativa?
Teorias objetiva, subjetiva e da imprecisão
- Teorias objetivas: o perigo próximo de consumação da realização típica. teoria adotada no Brasil.
- Teorias subjetivas: a vontade delituosa. crítica: por essa corrente, colocar agulhas num boneco-vodu do marido seria tentativa.
- Teorias da imprecisão: a afetação da confiança da comunidade na vigência do ordenamento, aferida segundo um juízo ex ante. não vai interessar aqui um real perigo ao bem jurídico constatado no caso concreto, o que vai ser importante vai ser a impressão de perigo gerada através daquela determinada conduta.
O estudo do tema é importante para compreender melhor as hipóteses de crime impossível.
Imagine alguém que chegue no trabalho, aponte uma arma para um colega, diga “eu vou te matar” e puxe o gatilho. A arma, contudo, estava descarregada, sem que ninguém (nem mesmo o agente) soubesse. Houve tentativa ou é hipótese de crime impossível?
Depende da teoria adotada.
A teoria subjetiva é pouco adotada (lembre-se do boneco de vodu).
Para a teoria objetiva, o crime é impossível, pois em nenhum momento houve perigo próximo de consumação da conduta (pois a arma estava descarregada).
Para a teoria da imprecisão, houve tentativa, pois houve a percepção de perigo para o bem jurídico por parte da comunidade.
Cabe tentativa em contravenções? Por que?
Não cabe tentativa
Porque existe um artigo expresso na Lei das Contravenções Penais (LCP) afastando a possibilidade de tentativa. A tentativa nas contravenções é atípica, não tem previsão legal.
Crimes de mera conduta admitem tentativa? Por que?
Sim, especialmente quando plurissubsistentes
Com certeza, sobretudo se eles forem plurissubsistentes. Se você tiver um crime de mera conduta que se realiza através de vários atos, e se você só tiver realizado uma parte deles, e for surpreendido, haverá tentativa de crime de mera conduta, não há problema nenhum quanto a isso.
Então, em uma violação de domicílio, se você for surpreendido entrando no domicilio, mas sem ainda ter entrado na casa - arrombando a porta, colocou o primeiro pé mas não entrou na casa ainda -, tentativa de violação de domicílio.
Crimes habituais admitem tentativa?
Depende do conceito de habitualidade criminal
Se você entende como a doutrina antiga, que o crime habitual exige reiteração de condutas, você vai dizer que não, ou as condutas são reiteradas, por exemplo, no mínimo três, e você tem crime consumado, ou você ainda tem atos preparatórios.
Essa visão está ultrapassada: habitualidade hoje, ela é vista como um elemento subjetivo especial que alguns crimes tem, é uma intenção de repetir. Então, se você realizar uma única conduta, patente a intenção de repetir, haverá crime habitual consumado; se você é surpreendido tentando realizar essa primeira conduta, patente a intenção de repetir, haverá crime habitual tentado.
EXEMPLO
Exercício irregular da medicina. Você monta um consultório em uma cidade pequena, faz propaganda, etc, você não é médico. Tem uma fila na porta para você atender, quando você incia o atendimento do primeiro paciente (mas ainda não atendeu), a polícia chega, você é preso. Tentativa do crime do art. 282. Se você já tivesse terminado o atendimento, você teria crime habitual consumado, a habitualidade é a intenção de repetir.
Crimes unissubsistentes admitem tentativa?
Se for material (conduta e resultado), sim
Crime unissubsistente é aquele que se realiza com um único ato: injúria oral, por exemplo. Esse crime unissubsistente, se ele for material (como o homicídio), de conduta e resultado, ele vai admitir tentativa.
Por quê? Porque eu aperto o botão, a bomba explode, a vítima não morre, então é possível. Então, nos crimes unissubsistentes materiais é possível a tentativa.
Mas se for um crime unissubsistente formal ou de mera conduta, ou seja, a conduta é composta de um único ato, e o crime se consuma com a conduta, fica muito difícil enxergar a tentativa nesse crime unissubsistente de mera conduta ou formal. EXEMPLO: injúria oral. Se você falou o palavrão, está consumado. Se você ainda não falou, não temos ainda ato de execução. Então fica difícil realmente identificar a tentativa nos crimes unissubsistentes.
O que são crimes de atentado? Eles admitem tentativa?
Não cabe tentativa de tentativa
Os crimes de atentado são aqueles que o próprio tipo penal equipara a tentativa e a consumação. Como exemplo, o artigo 352 do CP, que tipifica a conduta de “evadir-se ou tentar evadir-se o preso submetido a medida de segurança, mediante violência […]”. Em sua forma própria, portanto, é evidente que não cabe falar em tentativa de tentativa.
Os crimes omissivos admitem tentativa?
Os impróprios admitem tentativa
Os crimes omissivos próprios não admitem tentativa. Se você deixou de realizar a conduta que deveria, o crime já se consumou, não havendo espaço para tentativa.
Os crimes omissivos impróprios são aqueles praticados por um garante. Normalmente são crimes materiais, de conduta e resultado (como a mãe que não amamenta o filho e ele morre). Aqui, a tentativa é plenamente cabível. A dificuldade é estabelecer a partir de que momento há um ato de execução apto a caracterizar a tentativa, e não mais meros atos preparatórios.
- Para isso a doutrina faz uma distinção entre a espécie de perigo: se o perigo para o bem jurídico está próximo (exemplo, a criança está se afogando, vai morrer em um minuto e a mãe inerte), haverá tentativa quando o garantidor deixa perecer a primeira chance de salvamento. Então a mãe podia colocar a mão na água, levantar a criança, não fez: tentativa. Claro, sempre dolo né, só existe tentativa em crime doloso.*
- Se o perigo é remoto, por exemplo, a mãe deixa de amamentar o filho, a criança vai demorar uns dois dias para morrer. A partir de que momento há tentativa? Nos primeiros dez minutos em que ela resolveu fazer isso?*
- Não! Ou a gente tem que esperar que esse perigo fique próximo para dizer que há tentativa, então, a criança está sem comer há dois dias, está quase morrendo, a polícia chega lá, prende a mãe por tentativa de homicídio porque o perigo é próximo, ou, mesmo com esse perigo ainda distante, faltam dois dias para a criança morrer, haverá tentativa se o garantidor tira das suas mãos a possibilidade de exercer a ação salvadora (a mãe comprou uma passagem para o Japão e viajou, deixando a criança sozinha).*
Qual a pena para a tentativa?
Diminuição de um a dois terços
em relação ao crime consumado
Para escolher se vai ser um ou dois terços de redução, o juiz deve ponderar a proximidade da consumação.
Um grupo compra um imóvel ao lado de um banco, e começa a cavar um túnel, a partir do imóvel, até o cofre do banco. No meio das escavações, são pegas pela polícia. A ação é mero ato preparatório (e impunível, portanto), ou já é tentativa?
Segundo o STJ, tentativa.
Não houve violação do art. 14, II, do CP, pois os atos externados ultrapassaram meros atos e cogitação ou de preparação e expuseram perigo real para o bem jurídico protegido pela norma penal, inclusive com a execução qualificadora do furto. Os recorrentes, mediante complexa logística, escavaram por dois meses um túnel de 70,3 metros entre o prédio que adquiriram e o cofre da instituição bancária, cessando a empreitada, em decorrência de prisão em flagrante, quando estavam a 12,8 metros do ponto externo do banco, contexto que evidencia, de forma segura, a prática de atos executórios. (SRJ - REsp 125770/RS, julgado em 24.03.2015);
QUESTÃO DE CONCURSO
Verdadeiro ou falso?
Sobre o iter criminis, julgue o item:
A criminalização de atos preparatórios como crimes de perigo abstrato autônomos não é admita pela jurisprudência do STF, por violação do princípio da lesividade.
ERRADO.
O STF, ao contrário da assertiva contida neste item, admite a tipificação de conduta que, em tese, teria natureza de ato preparatório para a prática de outro crime. Não há ofensa à lesividade, desde que conte com previsão legal. A Lei Antiterrorismo, por exemplo, pune os atos preparatórios da figura típica do terrorismo (Lei n. 13.260/2016). Logo, por si só, não há lesividade.
QUESTÃO DE CONCURSO
Verdadeiro ou falso?
O acréscimo da pena em razão do crime continuado é fixado de acordo com o iter criminis percorrido pelo agente, porquanto na continuidade delitiva, os vários delitos que a integram são considerados como crime único.
A questão está errada.
O iter criminis é utilizado para a fixação do grau de redução do delito tentado. Para o crime continuado, utiliza-se a quantidade de infrações. No caso do crime continuado específico, além do número de crimes, o juiz também considera a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, conforme preconiza o parágrafo único do artigo 71 do Código Penal.
O que o Código Penal diz sobre a desistência voluntária?
“O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados”
Cite três diferentes correntes doutrinárias relativas à classificação do instituto da desistência voluntária.
Punibilidade, Tipicidade ou culpabilidade
A corrente doutrinária majoritária classifica a desistência voluntária como um problema relativo à punibilidade.
Há, contudo, outras duas correntes, minoritárias, que a situam como um problema relativo à atipicidade da conduta ou, ainda, à culpabilidade.
Situar a desistência voluntária como um problema de punibilidade significa inserí-la dentro ou fora da teoria do delito? E da teoria da pena? Quais as expressões mais comuns para se referir a ela, segundo tal teoria (que situa a desistência dentro da punibilidade)?
Fora da teoria do delito, dentro da teoria da pena
Essa é a teoria dominante. Colocar como um problema de punibilidade a situa fora da estrutura analítica do crime, que integra a teoria do delito (tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade), inserindo-a dentro da teoria da pena, da coerção penal. Em outras palavras, é um prblema de política criminal e de escolha legislativa sobre a incidência ou não da pena para um fato tipificado como delito.
São comuns as seguintes expressões para a desistência voluntária, quando situada no âmbito da punibilidade:
- causa pessoa de isenção de pena
- causa especial de ausência de punibilidade
- exclusão de pena
- exclusão de punibilidade
O que significa a expressão “ponte de ouro”, e por qual razão ela está associada à desistência voluntária?
Atravessar o caminho da prática ilícita para a licitude
As pontes de ouro seriam o caminho possível de ser percorrido pelo agente que iniciou a prática de um ilícito penal voltando a corrigir o seu percurso, retornando à seara da licitude. A ponte de ouro está presente, entre nós, no art. 15 do CPB, nos institutos do arrependimento eficaz e desistência voluntária. Segundo ele, o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução (DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA) ou impede que o resultado se produza (ARREPENDIMENTO EFICAZ), só responde pelos atos já praticados.
A tese da “ponte de ouro” remonta a juristas antigos, como Franz von Liszt (expoente teórico do sistema clássico de fato punível e da teoria causalista da conduta) e Anselm von Feuerbach (importante jurista do iluminismo penal, famoso pelas suas construções acerca da teoria da coação psicológica no âmbito da fundamentação preventiva geral negativa dos fins da pena).
Qual o argumento utilizado por Nelson Hungria para justificar que a desistência voluntária situa-se no âmbito da punibilidade, e não no da tipicidade?
Tipicidade não pode ser retroativamente suprimida
O próprio Nelson Hungria (1978, p. 193), filiando-se à primeira vertente desse entendimento (afirmando, portanto, que a impunibilidade que decorre do art. 15 do CP é um problema de ausência pessoal de punibilidade), já afirmava que “a tentativa, uma vez acontecida, não pode ser suprimida retroativamente”. Em outras palavras, significa dizer que, uma vez que uma tentativa se mostrou perfeitamente típica (com a tipicidade estabelecida, portanto), uma circunstância posterior não é capaz de suprimir essa adequação do fato praticado com a norma penal. A desistência voluntária, portanto, deve ser situada fora do âmbito da tipicidade.
Qual o argumento utilizado por Claus Roxin para justificar que a desistência voluntária situa-se no âmbito da punibilidade, e não no da tipicidade?
A desnecessidade da pena
Uma outra variante da corrente de pensamento que situa o problema no âmbito da teoria da pena e não na teoria do delito é capitaneada por Claus Roxin e pelos discípulos do funcionalismo teleológico/racional/dualista/de política criminal, variante segundo a qual não há que se extrair o fundamento da impunibilidade da desistência voluntária (e mesmo do arrependimento eficaz) de qualquer espécie de “prêmio” outorgado ao agente que impede a consumação do fato, mas, em verdade, da inexistência de necessidade da pena.
Lembremos, nesse ponto, que, no contexto de suas formulações pós-finalistas, Roxin funcionaliza todas as categorias do fato punível por sua teoria preventiva da pena, estatuindo, por exemplo, que ao direito cabe somente a tutela subsidiária de bens jurídicos e que, portanto, toda imposição de pena a um sujeito concreto deve se mostrar absolutamente necessária, sob pena de ilegitimidade da criminalização, o que se mostra coerente com sua postura. Essa posição pode ser levada para as provas discursivas e/ou orais, nas quais o candidato tenha espaço para aprofundar o tema, demonstrar conhecimento e, assim, se destacar de outros concorrentes.
ATENÇÃO!
É preciso lembrar que Roxin situa a necessidade da pena ao lado da culpabilidade, como um dos integrantes da categoria que ele criou, da responsabilidade (ao lado da tipicidade e da antijuridicidade, ele não coloca a culpabilidade, mas a responsabilidade, conceito mais amplo integrado pela culpabilidade e pela necessidade da pena). Alguns autores dizem, assim, que como a culpabilidade permanece intocada, ao situar a desistência voluntária no âmbito da desnecessidade da pena, a teoria de Roxin a situaria como um problema de punibilidade. Outros dizem que, como está dentro da responsabilidade, que é uma espécie de “substituto” roxiniano para a culpabilidade, que tal teoria acaba por inserir a desistência como um problema de culpabilidade, mesmo.
Quais são as duas principais repercussões de situar o problema da desistência voluntária dentro da punibilidade?
Partícipes não se beneficiam
e não há desistência em casos de inimputabilidade
A PARTICIPAÇÃO, pela doutrina majoritária, rege-se pela teoria da acessoriedade limitada. Assim, a conduta acessória (participação) depende de uma conduta principal (autoria) que seja, no mínimo, típica e antijurídica (mas não necessariamente culpável). Assim, se você situa a desistência como excludente da tipicidade, isso irá excluir qualquer possibilidade de punir partícipes. Agora, situando como um problema de punibilidade, a conduta continua sendo típica e antijurídica, de forma que os partícipes não se beneficiam da desistência voluntária do autor.
O caso do INIMPUTÁVEL. Se é causa de exclusão da punibilidade, somente se aplica em casos nos quais há uma conduta típica, antijurídica e culpável. A desistência voluntária, portanto, não se aplica à conduta do inimputável, pois aqui inexiste culpabilidade. Isso não ocorreria caso a desistência se inserisse na tipicidade, pois o exame da tipicidade antecede o da culpabilidade.

