Medicamentos - Responsabilidade dos entes - Temas 793 e 1234 de Repercussão Geral Flashcards
(10 cards)
Segundo entendimento da Primeira Seção do STJ (Tema Repetitivo 106), a determinação judicial de concessão, pelo Estado, de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa de quais três requisitos?
A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.
TEMA REPETITIVO 106. STJ. 1ª Seção. EDcl no REsp 1.657.156-RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 633).
Os medicamentos, para serem comercializados no Brasil, precisam ser aprovados e registrados na ANVISA.
Ocorre que esse processo de aprovação e registro demora alguns anos para ser realizado.
Assim, é comum que os médicos saibam, antes do registro pela ANVISA, que já existe, em outros países, determinado medicamento mais moderno e eficaz para uma certa doença.
Surge, então, um relevante questionamento jurídico: o doente poderia receber uma decisão judicial favorável obrigando que o Poder Público forneça esse medicamento a ele, mesmo sem que haja ainda o registro na ANVISA?
À luz da decisão da Primeira Seção do STJ em sede de Tema Repetitivo 106, a resposta seria não.
Esse foi também o entendimento do STF?
Em regra, o STF entende que:
(i) o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais; e
(ii) não pode haver decisão judicial obrigando o fornecimento de medicamento sem registro na ANVISA.
Excepcionalmente, o STF entende que pode haver a concessão judicial de medicamento sem registro da ANVISA.
Para que isso seja possível, devem estar presentes os seguintes requisitos cumulativos:
1) Existência de pedido de registro do medicamento e mora irrazoável da ANVISA em apreciá-lo (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016)
2) Existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e
3) Inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil
À luz do entendimento do STJ, o Judiciário só poderia obrigar que o Estado forneça medicamento não incorporado pelo SUS se tal medicamento estiver registrado na ANVISA (dentre outros requisitos).
Sobre esse aspecto específico da necessidade de registro na ANVISA, o que decidiu o STF em sede do Tema 793 de RG?
- O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais.
- A ausência de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial.
- É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido [de registro sanitário] (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos:
a) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);
b) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e
c) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.
STF. Plenário. RE 657718/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 22/5/2019 (repercussão geral) (Info 941).
Há alguma hipótese em que o Judiciário pode impor ao Estado a obrigação de fornecer medicamentos experimentais?
Não, nunca.
A regra é que apenas medicamentos registrados na ANVISA sejam concedidos a partir de decisão judicial.
Excepcionalmente, medicamentos sem registro poderão ser objeto de decisão judicial, mas eles não podem ser experimentais. Deve haver a sua aprovação por renomadas agências de regulação no exterior, como o FDA, por exemplo.
Medicamentos experimentais são aqueles sem comprovação científica de eficácia e segurança, e ainda em fase de pesquisas e testes. Um conhecido exemplo de medicamento experimental é a fosfoetanolamina sintética (a chamada “pílula do câncer”).
O STF afirmou que não há nenhuma hipótese em que o Poder Judiciário possa obrigar o Poder Executivo a fornecê-los.
Se a ANVISA negou o registro do medicamento, ainda assim o Poder Judiciário poderá concedê-lo?
O STF entende que não.
A ideia é que sempre se deve privilegiar a análise técnica da agência reguladora nacional.
Assim, se a ANVISA decidir, fundamentadamente, pela negativa de registro, em nenhuma hipótese pode o Poder Judiciário se sobrepor à manifestação da Agência para deferir pedidos individuais de fornecimento do medicamento.
Mesmo no caso em que a ANVISA não tenha concluído a análise do processo, mas já tenha emitido primeira manifestação no sentido de indeferir o pedido de registro, é preciso que as decisões judiciais sejam deferentes ao exame técnico realizado, à luz das suas capacidades institucionais. Isso, é claro, não impede a propositura de demandas judiciais que questionem a própria decisão da agência, comprovando-se técnica e cientificamente que foi equivocada.
Pedro sofre de hipertensão pulmonar primária e precisa de um remédio que não é fornecido pelo SUS, embora seja registrado pela ANVISA.
A ação pleiteando o fornecimento deste medicamento deverá ser proposta contra a União, Estado ou Município?
Os três entes federativos possuem responsabilidade (União, Estados/DF e Municípios).
Segundo a CF/88, a competência para prestar saúde à população é comum a todos os entes:
*Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(…)
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;*
O STF, ao interpretar esse dispositivo, entende que a prestação dos serviços de saúde e o fornecimento de medicamentos representam uma responsabilidade solidária dos três entes federativos (não se trata de responsabilidade subsidiária).
Sendo a responsabilidade solidária, o doente tem liberdade para ajuizar a ação somente contra a União, somente contra o Estado-membro/DF, somente contra o Município, contra dois deles (ex: União e Estado) ou contra os três entes em litisconsórcio.
Assim, a parte pode incluir no polo passivo qualquer um dos entes, isoladamente, ou conjuntamente.
A parte escolhe contra qual (ou quais) ente(s) irá propor a ação.
Em regra, o paciente tem liberdade para demandar a prestação do medicamento em face de qualquer um dos entes federativos (ou de todos eles, ou de dois deles).
Há alguma exceção?
Se o indivíduo estiver pleiteando o fornecimento de um medicamento que ainda não foi aprovado pela ANVISA, neste caso terá que ajuizar a ação necessariamente contra a União:
- “As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União”.
- STF. Plenário. RE 657718/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 22/5/2019 (repercussão geral) (Info 941).
Como a ANVISA integra a estrutura da Administração Pública Federal, não se pode permitir que Estados e Municípios (entes federativos que não são responsáveis pelo registro de medicamentos) sejam condenados a custear tais prestações de saúde quando eles não têm responsabilidade pela mora da Agência, nem têm a possibilidade de saná-la.
Quanto à competência, em razão da presença da União no polo passivo, a ação deverá ser proposta na Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da CF/88:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
A responsabilidade dos entes é solidária no âmbito do direito à saúde.
No entanto, dentro da estrutura do SUS, existe uma divisão das competências de cada ente.
Resuma essa divisão em linhas gerais.
- União: coordena os sistemas de saúde de alta complexidade e de laboratórios públicos.
- Estados: coordenam sua rede de laboratórios e hemocentros, definem os hospitais de referência e gerenciam os locais de atendimentos complexos da região.
- Municípios: prestam serviços de atenção básica à saúde.
- Distrito Federal: acumula as competências estaduais e municipais.
A responsabilidade pelo fornecimento de medicamentos é solidária entre os entes.
Porém, há uma divisão de responsabilidades no âmbito do SUS.
O que deverá o magistrado fazer se um município, por exemplo, for demandado isoladamente (e condenado) a prestar medicamento que estaria no âmbito da competência da União pela organização do SUS?
Os entes da Federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
STF. Plenário. RE 855178 ED/SE, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 23/5/2019 (Repercussão Geral – Tema 793) (Info 941).
- A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
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