Direitos e Deveres Individuais e Coletivos I Flashcards
(78 cards)
O que são Direitos e Garantias Fundamentais e onde estão localizados na Constituição Federal de 1988?
Os Direitos e Garantias Fundamentais estão tratados no Título II da Constituição Federal de 1988, abrangendo cinco capítulos. O primeiro capítulo, que contém o Art. 5º, refere-se especificamente aos direitos e deveres individuais e coletivos.
Como a Constituição de 1988 ampliou o catálogo de direitos individuais em comparação com documentos anteriores?
A Constituição de 1988 ampliou significativamente o catálogo de direitos individuais. Enquanto o documento anterior possuía um artigo com trinta e seis parágrafos, a Constituição atual conta com um rol (Art. 5º) de setenta e nove incisos, mais quatro parágrafos.
O rol de direitos individuais no Art. 5º da Constituição Federal é taxativo ou exemplificativo? Dê exemplos.
O rol de direitos individuais no Art. 5º da Constituição Federal é exemplificativo (e não taxativo). Isso significa que direitos dessa espécie podem ser encontrados em outras partes da Constituição. Por exemplo, o Art. 16 (princípio da anterioridade eleitoral) é considerado uma garantia individual do eleitor pelo STF, e o Art. 150, III, “b” (princípio da anterioridade tributária) é uma garantia individual do contribuinte, também segundo o STF.
Qual a diferença doutrinária entre direitos individuais, direitos individuais de expressão coletiva e direitos coletivos?
- Direitos individuais: São aqueles titularizados pelo sujeito individualmente considerado, garantindo autonomia aos particulares e independência diante da sociedade política e do Estado.
- Direitos individuais de expressão coletiva: São direitos que cada pessoa, individualmente considerada, possui, mas que somente podem ser exercidos de forma coletiva. Exemplos incluem o direito de reunião (Art. 5º, XVI) e o de associação (Art. 5º, XVII).
- Direitos coletivos: São titularizados por uma categoria de pessoas, mesmo que não possam ser individualizadas de modo preciso. Exemplos incluem o direito de representação dado às associações (Art. 5º, XXI) e o direito à obtenção de informações de interesse coletivo (Art. 5º, XXXIII).
Qual a relevância do direito à vida na Constituição Federal e em quantas perspectivas ele é doutrinariamente apresentado?
A vida humana é o bem jurídico mais importante entre todos os direitos constitucionalmente tutelados, sendo um pressuposto elementar para o usufruto dos demais direitos e liberdades. Doutrinariamente, o direito à vida é apresentado em duas perspectivas:
1. O direito de continuar vivo, ou seja, de não ser morto.
2. O direito a ter uma vida digna.
O direito à vida é hierarquicamente superior ou absoluto? Dê um exemplo para ilustrar sua relatividade.
Embora seja uma premissa básica, o direito à vida não é hierarquicamente superior aos outros direitos nem é um direito absoluto. Ele pode ter seu âmbito de incidência reduzido em ocorrências fáticas específicas em prol de outros direitos. Um exemplo é a pena de morte, que pode ser aplicada em caso de guerra formalmente declarada (Art. 5º, XLVII, ‘a’, CF/88).
Como a Constituição Federal protege o “direito de continuar vivo”?
Na perspectiva do direito de continuar vivo, a Constituição Federal garante que a existência física da pessoa não será violada pelo Estado nem por outros particulares. O poder constituinte originário vedou a aplicação da pena de morte (Art. 5°, XLVII, ‘a’, CF/88), ressalvado o caso de guerra declarada (Art. 84, XIX, CF/88). Nem mesmo uma emenda constitucional ou lei pode estabelecer a pena de morte para outros casos, pois é uma cláusula pétrea (Art. 60, § 4º, IV, CF/88).
O que significa “direito a ter uma vida digna” e qual sua conexão com o princípio da dignidade da pessoa humana?
O “direito a ter uma vida digna” expande o conceito de viver para além da simples sobrevivência física. Exige que o Estado assegure ao indivíduo acesso a bens e utilidades necessárias, forneça serviços essenciais (educação, saúde), crie planos de governo que propiciem o pleno exercício de liberdades e direitos (trabalho, moradia), e proíba tratamentos desumanos, como tortura (Art. 5°, III, CF/88) e penas cruéis ou perpétuas (Art. 5º, XLVII, “b”, “c” e “e”, CF/88). Há uma nítida conexão com o princípio da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (Art. 1º, III, CF/88).
Qual a decisão do STF na ADO 5465 sobre empresas envolvidas com trabalho escravo?
Em abril de 2025, o STF, na ADO 5465, decidiu que estados-membros podem cancelar a inscrição estadual no ICMS de empresas envolvidas na comercialização de produtos fabricados com trabalho escravo. Esta é uma medida administrativa legítima, dentro do poder dos Estados de fiscalizar tributos. A lei estadual que trata do tema não invade a competência da União, pois permite a aplicação de punições após a confirmação da prática por órgão federal competente. Além disso, é permitido divulgar publicamente a lista das empresas punidas e proibir a atuação dos sócios no mesmo ramo. Para aplicar as punições, é necessário provar, em processo administrativo com direito de defesa, que a empresa ou sócios sabiam ou tinham motivos para desconfiar da origem ilícita dos produtos.
A Constituição Federal de 1988 fixou o marco temporal para o início da proteção jurídica da vida humana? Quais são as teorias doutrinárias sobre o início da vida?
Não, a Constituição Federal de 1988 não fixou o marco temporal para o início da proteção jurídica da vida humana. As teorias doutrinárias sobre o início da vida incluem:
* Concepção: Início na fecundação do óvulo pelo espermatozoide (zigoto). O Pacto de São José da Costa Rica (Decreto 678/1992) adota essa teoria.
* Nidação: Início quando o zigoto se fixa no útero materno.
* Formação do sistema nervoso central: Início por volta do 14º dia após a concepção.
* Capacidade de existir fora do ventre materno: Início entre a 24ª e 26ª semana de gestação (critério adotado pelo Comitê de Ética da França).
Qual o entendimento do STF na ADI 3.510 sobre o início da vida humana e a proteção constitucional ao embrião?
Na ADI 3.510, o STF concluiu que, no ordenamento jurídico brasileiro, a vida não se inicia com a fecundação do óvulo (concepção), mas em determinada fase de desenvolvimento do embrião humano, após a formação da placa neural. Além disso, o STF entende que a inviolabilidade constitucional do direito à vida se refere, exclusivamente, a indivíduos que sobreviveram ao parto, ou seja, a proteção constitucional não alcança embriões e fetos, mas somente aqueles que nasceram vivos.
Como o Código Penal e o Direito Civil protegem o feto e o nascituro, mesmo com o entendimento do STF sobre o início da vida após o parto?
Apesar do entendimento do STF sobre o início da proteção constitucional à vida após o parto, o Código Penal criminaliza o aborto (vedando a interrupção prematura da gravidez, exceto em duas hipóteses) e o Direito Civil resguarda os direitos do nascituro, que, embora não possua personalidade civil antes do nascimento com vida, tem expectativa de direito. Por exemplo, um feto pode ser herdeiro se nascer com vida.
Quais são as duas hipóteses em que o aborto não é considerado crime na legislação brasileira?
O aborto não é tipificado como crime na legislação brasileira em duas hipóteses, conforme o Código Penal:
1. Aborto necessário (ou terapêutico): Quando não há outro meio de salvar a vida da gestante (Art. 128, I, CP).
2. Aborto sentimental: Quando a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal (Art. 128, II, CP).
Qual a terceira hipótese de aborto não criminalizada reconhecida pelo STF?
Em 2012, no julgamento da ADPF nº 54, o STF identificou uma terceira hipótese de aborto não criminalizada: a interrupção da gravidez de feto anencefálico. A Corte declarou a inconstitucionalidade da interpretação do Código Penal que criminalizava essa antecipação terapêutica do parto, com base nos preceitos de laicidade do Estado, dignidade da pessoa humana, direito à vida, e proteção da autonomia, liberdade, privacidade e saúde da mulher.
Qual a decisão da 1ª Turma do STF (HC 124.306) sobre a interrupção voluntária da gestação nos três primeiros meses? Quais os seus efeitos?
Em novembro de 2016, no julgamento do HC 124.306, a 1ª Turma do STF, por maioria, entendeu que a interrupção voluntária da gestação realizada nos três primeiros meses não representa crime. Segundo o Ministro Luís Roberto Barroso, a criminalização do aborto é incompatível com direitos fundamentais como os direitos sexuais e reprodutivos, a autonomia da mulher, e a integridade física e psíquica da gestante.
Efeitos: Como a decisão foi proferida em um Habeas Corpus, aplica-se unicamente ao caso concreto examinado, não possuindo efeitos erga omnes (contra todos). No entanto, a manifestação de três ministros indica uma significativa possibilidade de reavaliação das normas que criminalizam o aborto em ações com ampla eficácia (como a ADPF 442).
Quais são as duas perspectivas da igualdade e qual a diferença entre elas?
A igualdade pode ser compreendida em duas perspectivas principais:
1. Igualdade Formal (“igualdade perante a lei”): Significa que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (Art. 5º, caput). Pressupõe um diploma normativo já elaborado e se dirige aos Poderes Públicos no momento de sua aplicação, vedando critérios seletivos ou discriminatórios que não decorram da própria lei.
2. Igualdade Material (ou “igualdade na lei” / substancial): Considera as desigualdades reais existentes na vida fática, permitindo que as situações desiguais sejam destinatárias de soluções diferentes. Recupera a lógica aristotélica de que os desiguais devem ser tratados desigualmente, na medida de sua desigualdade. Busca evitar que certos grupos sejam deixados em estado de indignidade e desalento social/jurídico/fático.
O que são ações afirmativas e qual o seu objetivo?
Ações afirmativas (affirmatives actions) são práticas ou políticas estatais de tratamento diferenciado a certos grupos historicamente vulneráveis, periféricos ou hipossuficientes. Seu objetivo é corrigir e minimizar os efeitos atuais das discriminações passadas, buscando redimensionar e redistribuir bens e oportunidades para que os menos favorecidos (por critérios sociais, econômicos, culturais, biológicos) tenham acesso a meios que reduzam ou compensem as dificuldades enfrentadas.
Cite exemplos de ações afirmativas na Constituição Federal.
A Constituição Federal prevê alguns artigos que traduzem o ideal de realização positiva do princípio da igualdade por meio de ações afirmativas:
* Art. 37, VIII: Determina a reserva de certo percentual de cargos e empregos públicos para pessoas portadoras de deficiência física.
* Art. 7º, XX: Enuncia tratamento especial de proteção ao mercado de trabalho feminino.
* Art. 3º, III: Prevê como objetivo fundamental erradicar as desigualdades regionais.
* O STF afirma que “toda a axiologia constitucional é tutelar de segmentos sociais brasileiros historicamente desfavorecidos, culturalmente sacrificados e até perseguidos, como, verbi gratia, o segmento dos negros e dos índios”.
Quais os requisitos para que as ações afirmativas sejam constitucionalmente legítimas?
As ações afirmativas devem ser instituídas em estrita observância à razoabilidade e à proporcionalidade. Elas serão constitucionalmente legítimas apenas se não se basearem em critérios arbitrários e não promoverem favoritismos desproporcionais, evitando a “discriminação inversa (ou reversa)”. A motivação da ação afirmativa deve ser:
* Razoável: Amparada por um motivo coerente e plausível.
* Racional: Objetiva e suficiente ao delimitar o segmento social atingido.
* Proporcional: Reajustar com equilíbrio as situações desiguais.
Qual o entendimento do STF (ADPF 186) sobre a política de cotas étnico-raciais em universidades?
Na ADPF 186, o STF entendeu, por unanimidade, que a reserva de 20% das vagas para estudantes autodeclarados afrodescendentes na Universidade de Brasília é constitucional. Considerou a medida “providência adequada e proporcional ao atingimento dos mencionados desideratos”, e que a política de ação afirmativa adotada pela universidade não se mostra desproporcional ou irrazoável, sendo compatível com os valores e princípios da Constituição.
Qual a decisão do STF sobre a constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014 (cotas em concursos públicos federais)? Quais os fundamentos?
O STF, em decisão unânime (junho de 2017), reputou válida a Lei nº 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas em concursos públicos federais. Além da autodeclaração, é legítima a utilização de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa.
Os fundamentos são:
1. Princípio da isonomia: A medida supera o racismo estrutural e institucional, garantindo igualdade material e reconhecimento à população afrodescendente.
2. Princípio do concurso público e eficiência: A reserva de vagas não isenta da aprovação e contribui para uma “burocracia representativa”.
3. Princípio da proporcionalidade: A política é necessária e não desproporcional, considerando que nem todos os cargos exigem curso superior, nem todos os beneficiários de cotas universitárias terão acesso a cotas em concursos, e há outros fatores que impedem a igualdade de competição.
Qual a aplicabilidade da Lei nº 12.990/2014 (cotas em concursos públicos federais) e a decisão do STF sobre sua vigência?
A Lei nº 12.990/2014 se aplica a todos os três poderes da União (Legislativo, Executivo e Judiciário), além do MPU e da DPU. Ela não se aplica a Estados, Distrito Federal e Municípios, mas leis semelhantes editadas por esses entes também serão constitucionais.
Em junho de 2024, o STF, na ADI 7.654, deu interpretação conforme a Constituição ao art. 6º da Lei, entendendo que o prazo de 10 anos de vigência (expirado em 10 de junho de 2024) é um marco temporal para avaliação da eficácia da ação afirmativa, permitindo prorrogação e/ou realinhamento, afastando a extinção abrupta das cotas raciais. As cotas continuarão a ser observadas até a conclusão do processo legislativo do Congresso Nacional e do Poder Executivo.
Qual a decisão do STF (RE 614.873/AM) sobre leis estaduais que reservam vagas em universidades públicas para candidatos de escolas locais?
Em dezembro de 2023, o STF, no RE 614.873/AM, declarou inconstitucional lei estadual do Amazonas (Lei nº 2.894/2004) que reservava 80% das vagas de vestibulares da Universidade do Estado do Amazonas para candidatos egressos de escolas públicas ou privadas daquele estado. A Corte entendeu que leis desse tipo rompem com o ideal de igualdade (Art. 5º, CF/88) e violam a garantia de tratamento igualitário a todos os cidadãos brasileiros, vedando a criação de distinções ou preferências entre si (Art. 19, III, CF/88), por restringir a política inclusiva somente aos alunos do Distrito Federal, em detrimento dos estudantes de outros Estados da Federação.
O que é o Programa Universidade para Todos (PROUNI) e qual o entendimento do STF sobre sua constitucionalidade?
O PROUNI, instituído pela Lei nº 11.096/2005 (convertida da Medida Provisória nº 213/2004), é um programa do Ministério da Educação que concede bolsas de estudo (integrais e parciais) para estudantes de cursos de graduação e sequenciais de formação específica em instituições privadas de ensino superior. As bolsas são destinadas a:
1. Estudantes que cursaram o ensino médio completo em escola pública ou como bolsistas integrais em instituições privadas.
2. Estudantes portadores de deficiência.
3. Professores da rede pública de ensino, para cursos de licenciatura, normal superior e pedagogia.
O STF, na ADI 3330, declarou a constitucionalidade do programa, afirmando que a desigualdade em favor desses estudantes não ofende a Constituição, pois compensa uma “anterior e factual inferioridade” (“ciclos cumulativos de desvantagens competitivas”), honrando a máxima aristotélica de tratar desigualmente os desiguais.